São Paulo – Do Cerrado brasileiro para o Museu do Futuro, em Dubai, viajou o fruto da macaúba, palmeira nativa brasileira. O óleo da semente de macaúba será a base do projeto pioneiro de produção de combustíveis renováveis da Acelen Renováveis (se lê Acélen), braço de energia renovável da empresa brasileira Acelen, lançado no último dia 07, no museu árabe, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP28).
A Acelen Renováveis foi recém-criada para participar ativamente da transição energética mundial e contará com investimentos de mais de US$ 2,5 bilhões (cerca de R$ 14 bilhões), com foco na produção de combustíveis renováveis, como combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês) e o diesel renovável, tudo a partir da macaúba, no projeto Seed to Fuel (Da Semente à Energia), que deve reduzir em 80% as emissões de carbono em comparação à energia fóssil.
Em entrevista à ANBA, o vice-presidente de Relações Institucionais, ESG e Comunicação da Acelen, Marcelo Lyra (foto acima), falou sobre o projeto de combustíveis renováveis à base do óleo de macaúba e como ele pode se destacar no processo de transição energética global.
Lyra explicou a diferença entre o biodiesel e o diesel renovável. “Biodiesel é um aditivo, enquanto o diesel renovável substitui integralmente o diesel fóssil, e a mesma coisa acontece com o SAF”, disse o VP.
O projeto deve sair do papel no final do primeiro semestre de 2024, e então serão plantados 200 mil hectares de palmeiras de macaúba em áreas degradadas entre o Norte de Minas Gerais e o Sul da Bahia, que equivalem a 280 mil campos de futebol.
A macaúba leva de três a cinco anos para dar os primeiros frutos. Enquanto isso, a partir de 2026, uma biorrefinaria, que será capaz de processar 20 mil barris por dia – 1 bilhão de litros de diesel renovável ou SAF por ano, irá trabalhar com óleo de soja e de milho e então, por volta de 2028, serão colhidos os primeiros frutos da macaúba. A partir daí, vai se mesclando a matriz de outros óleos vegetais com a macaúba, e até 2033 deve acontecer a transição completa, do diesel renovável e SAF 100% com óleo de macaúba.
A Acelen atua na refinaria de Mataripe, na Bahia, e com o projeto Seed to Fuel fará também o biorrefino na planta baiana. Um centro de tecnologia faz parte do projeto e deve ser construído no Norte de Minas Gerais para produzir mudas selecionadas de macaúba.
Segundo Lyra, o projeto tem potencial de captura de até 60 milhões de toneladas de CO2 da atmosfera e deverá criar 90 mil novos empregos diretos e indiretos no Brasil.
Por que a macaúba?
“Por que não continuar com a soja? Porque além de ambientalmente ser muito melhor, a produtividade da macaúba por hectare é cinco a sete vezes maior na quantidade de óleo do que no plantio da soja, além do que, vamos fazer isso em áreas 100% degradadas, e uma das coisas importantes do projeto é acessarmos o crédito de carbono relativo à recuperação dessas áreas degradadas. Vamos transformar pasto degradado em floresta cultivada com produção do diesel renovável e o SAF”, explicou Lyra.
O objetivo do projeto é transformar o óleo de macaúba em uma commodity agrícola, segundo Lyra. “O que vimos na COP28 foi a determinação da diminuição permanente da utilização de combustíveis fósseis pela humanidade, então essa conversão vai ocorrer. Um dos problemas dessa conversão é o fornecimento e a garantia de matéria-prima, e a macaúba é uma promessa muito interessante nessa direção, exatamente pela produtividade por hectare, e no Brasil temos terras degradadas suficientes para produzir muito diesel renovável, muito SAF. Então o Brasil pode ser a Arábia Saudita do biocombustível, do ponto de vista de custo e de capacidade produtiva, temos a oportunidade de ser os mais competitivos do mundo e uma chance boa de ser muito relevantes na transição energética”, declarou.
O VP lembrou que, hoje, 80% da matriz energética mundial ainda é fóssil, e que existe uma curva temporal que não deve acontecer tão rapidamente. “Com o tempo, essa matriz vai se equilibrando. No longo prazo, a tendência da sociedade é fazer essa transição. É preciso fazer a transição energética com segurança energética”, disse.
Da lenha para o carvão, do carvão para o petróleo, foram transições energéticas que ocorreram na sociedade. “Agora teremos várias fontes de energia que vão conviver, eólica, solar, vão conviver com biometano, gás, fóssil, diesel, e a transição vai ocorrer com mais alternativas, a depender da vocação natural de cada região”, disse.
O que deve acontecer, segundo Lyra, a depender da regulação de cada país, é um percentual do diesel renovável que será adicionado ao diesel fóssil, e esse percentual vai aumentando. “Na Califórnia, nos Estados Unidos, você já tem a opção de diesel renovável 100% na bomba, mas é mais demonstrativo do que de mercado. Os volumes vão crescer com o tempo, deve começar com 1%, 2%, 5%, 10% e vai assumindo um volume maior [de renovável]”, disse.
O VP contou que na macaúba encontraram a combinação ideal de uso de solo, produtividade, preservação e adequação, por ser uma árvore nativa brasileira. “A solução macaúba é fruto de estudo da nossa equipe, mas o conceito de encontrar alternativas de produção de biocombustíveis e de ser relevante na transição energética nasceu com a Acelen”, disse.
“É um projeto que nos estimula muito, estamos muito empolgados, tivemos uma super visibilidade na COP28, e fomos muito felizes em escolher esse momento, muito simbólico para a gente. Lançamos o projeto em abril com o governo brasileiro e dos Emirados, temos investidor dos Emirados e tivemos a felicidade de ter a COP lá, uma COP que foi bem relevante nessa questão de aceleração da transição energética, e tivemos a felicidade de lançar isso no Museu do Futuro que é um lugar emblemático que representa esse momento. Estamos confiantes de que esse projeto nos coloca num patamar de competitividade fantástico e mais do que isso, agora ele é global, se transformou em um projeto de dimensão global, que tem capacidade de ajudar o mundo nessa transformação energética”, declarou Lyra.
Refinaria
A Acelen surgiu da privatização da Refinaria de Mataripe, na Bahia, adquirida pelo fundo Mubadala Capital, dos Emirados Árabes Unidos, em 2021. Hoje, os principais produtos são combustíveis fósseis.
A empresa de energia investiu na modernização e na eficiência da produção e em pouco tempo reduziu as emissões de CO2 ao equivalente a mais de 22 mil hectares de árvores plantadas; diminuiu em 41% as emissões de enxofre, em 10% o consumo de água nas operações e em 6% o consumo de energia.
“A Acelen nasceu com esse propósito de ser parte da transição energética brasileira e na refinaria o trabalho é produzir gasolina, diesel, com a menor pegada de carbono possível, reduzindo o consumo de energia, de água”, disse Lyra.