Por Alessandro Candeas*
O Brasil depositou o instrumento de ratificação do Acordo de Livre Comércio entre o Mercosul e o Estado da Palestina no último dia 5 de julho, em Assunção. Segundo nota do Itamaraty, a vigência do acordo, assinado em 2011, constitui gesto de confiança na viabilidade econômica do Estado palestino, e desejo de fortalecimento da relação. Este artigo apresenta breves informações sobre o comércio bilateral e seu potencial de crescimento e diversificação, com base nos dados no sistema “Comexstat” do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) do Brasil.
Em 2023, as exportações do Brasil para a Palestina totalizaram US$ 32.214.955, o segundo melhor resultado da série histórica. As importações, contudo, limitaram-se a apenas US$ 194.885. O superávit de mais de US$ 32 milhões e a presença absoluta de 99,4% de exportações brasileiras denotam o desequilíbrio estrutural de uma relação de via única. Caberia, ainda que minimamente, corrigir esse hiato, por meio do aumento das compras de produtos palestinos.
No ano passado, a pauta concentrou-se em pouquíssimos produtos. Os principais itens de exportação do Brasil foram carne bovina fresca, refrigerada ou congelada (US$ 29 milhões) e comestíveis de carnes, preparados ou preservados (US$ 1,4 milhão), que representaram 95% do volume total. Do lado palestino, frutas, preservados e preparações (exceto sucos de frutas) foram, praticamente, o único item (99,2%) de exportação em 2023.
A Palestina é um mercado de cerca de 6 milhões de consumidores (somando-se Cisjordânia e Gaza). O Estado de Mato Grosso foi, em 2023, o principal exportador para a Palestina, seguido de São Paulo, Goiás, Rondônia, Minas Gerais, Tocantins, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul – todos com forte setor exportador de carnes. Por seu turno, Rondônia é, de longe, o principal importador de produtos palestinos.
A Palestina tem buscado diversificar suas parcerias de comércio internacional, e o Brasil é uma de suas prioridades. Com esse objetivo, foram realizadas duas missões empresariais multissetoriais a São Paulo, em 2023 e 2024.
Importante notar que as estatísticas de comércio bilateral em 2024 revelam interessante evolução em sua pauta. Entre janeiro e junho deste ano, o volume de trocas alcançou US$ 17,1 milhões (Brasil exportou US$ 16,9 milhões e importou US$ 0,2 milhões), o que permite vislumbrar resultado ligeiramente superior, em dezembro, ao registrado em 2023, com pequena redução do altíssimo superávit brasileiro.
Trata-se de um resultado surpreendente, pois mostra que as trocas comerciais não foram afetadas pela crise econômica que assola a Palestina, no contexto da guerra de Gaza e suas repercussões na Cisjordânia, e têm potencial de crescimento.
Igualmente surpreendente, e mesmo contraintuitiva, é mudança do perfil exportador palestino. Em 2024, 61% das exportações palestinas são manufaturados e bens de capital: centrífugas, compressores de ar, ventiladores, bombas, exaustores, aparelhos de filtrar ou depurar e suas partes. O item “frutas”, que dominava a pauta em 2023, representa este ano 37% do volume total.
Portanto, há grande potencial de expansão do comércio Brasil-Palestina, independentemente da crise política e econômica que infelizmente afeta aquela região. As trocas bilaterais alcançaram a marca recorde de US$ 47 milhões no ano de 2015. Em 2021, em plena depressão econômica global causada pela COVID, e de outro conflito em Gaza, o comércio chegou a US$ 26,1 milhões. O presente ano, como visto, poderá registrar o segundo maior volume de comércio da série histórica – apesar da guerra.
Há boas perspectivas exportadoras da Palestina para cerâmicas, têxteis, artesanatos, azeite e pedras para construção e decoração, além de manufaturados e bens de capital. Do lado brasileiro, há, também, possibilidade para maior venda de alimentos (café, açúcar, frutas), máquinas, calçados e confecções, além de serviços diversos. Poderão, ainda, ser considerados investimentos brasileiros para fabricação de produtos palestinos a preços competitivos a serem exportados para Israel e países árabes vizinhos.
*Alessandro Candeas é embaixador do Brasil na Palestina
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