São Paulo – Anna Luísa Beserra tem 21 anos e uma trajetória de sonhos que se tornaram conquistas. A mais recente foi o Prêmio Jovens Campeões da Terra da ONU Meio Ambiente. O anúncio foi feito pelas Nações Unidas na terça-feira (17) e a baiana se sagrou campeã na América Latina. A premiação é pela invenção à qual Anna se dedicou nos últimos seis anos, o Aqualuz. O dispositivo criado por ela purifica a água da chuva armazenada em cisternas da região do Semiárido brasileiro. E o “combustível”? A luz do sol.
A ideia veio em 2013, anos depois das primeiras lembranças relacionadas às Ciências. “Costumava brincar como cientista. Qualquer tipo de líquido que eu tinha contato, xampu, material de limpeza, eu queria pegar para analisar. Meu presente de aniversário de 15 anos foi um microscópio. Um profissional. Quando eu ganhei ainda não tinha tido a oportunidade de ver um na prática. Eu só conhecia por filme”, lembra.
No Ensino Médio, o interesse resultou em feitos como uma Menção Honrosa na Olimpíada Baiana de Física, bronze na Olimpíada Brasileira De Astronomia e ouro na Olimpíada Brasileira de Biologia. Até que Anna encontrou um desafio diferente. “Apesar de ser de Salvador (no litoral), a gente tinha ouvido falar das questões do Semiárido, mas eu nunca tinha ido lá. O Aqualuz foi [desenvolvido por causa de] um cartaz que eu vi na escola e comecei a pesquisar algo que podia fazer que fosse ajudar realmente as pessoas no Semiárido”, lembra.
O cartaz era do Prêmio Jovem Cientista e Anna decidiu participar. Não venceu. Também não desistiu da invenção. “A gente fez o primeiro protótipo. Não ganhamos, mas fiquei apaixonada pelo projeto. Continuei como hobby, e fazendo novas versões dele”, revela.
Durante a graduação em Biotecnologia, na Universidade Federal da Bahia, Anna se debruçou ainda mais sobre o projeto. “Quando ingressei na universidade, conheci o empreendedorismo. Vi o potencial do projeto para se transformar e ser uma startup.” E foi o que ela concretizou. Hoje o Aqualuz é um dos projetos da empresa dela, a Safe Drinking Water For All (SDW).
Com o desenvolvimento da startup, mais pessoas entraram na equipe, que hoje reúne 10 pessoas, a maior parte voluntários. “Uma das acelerações que participamos trouxe uma proposta de transformar em startup de base tecnológica. Fomos a única startup do Nordeste. Foi bem intenso. Deram recursos para implantar algumas unidades do Aqualuz. Então, começamos e hoje temos em Alagoas, Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte”, contou.
O processo do Prêmio Jovens Campeões da Terra durou em torno de cinco meses. Agora a ONU vai continuar acompanhando os projetos dos campeões, fornecendo apoio e divulgando os resultados. “Vamos passar uma temporada na Alemanha, fazendo mentorias”, contou Anna.
A meta é instalar pelo menos mais 200 unidades do Aqualuz. “Temos algumas propostas em aberto, nada certo ainda. A forma de modelo de negócio que a gente encontrou é de as empresas investirem. Trabalhamos com proposta de, de forma gratuita, fazermos acompanhamento para ter um relatório e indicadores. Conseguimos medir o impacto do produto na saúde, o quanto de índice [de problemas por água contaminada] foi resolvido. Isso é muito importante para mostrar o que melhorou na vida das pessoas, e para as empresas como está sendo trabalhado o investimento delas”, ponderou.
O próximo passo do projeto é lançar o Aqualuz APP, aplicativo que utiliza Big Data para recolhimento de dados de impacto do purificador para os beneficiados e geração de relatórios de impacto.
Água de beber
O Aqualuz limpa a água da chuva armazenada nas cisternas. Para isso, a invenção usa a própria bomba da cisterna para jogar água no recipiente que vai purificá-la através de radiação ultravioleta. O equipamento tem também uma espécie de botão que muda de cor e indica quando a água já está própria para consumo.
O trunfo da invenção está no fato de utilizar apenas a luz solar na purificação. “É a única tecnologia no mundo voltada para isso. As outras opções, em geral, utilizam cloro – e até água sanitária –, o que tem alguns problemas associados. Entre eles, tem a questão do mau uso. Se você jogar de menos não funciona, se jogar demais vai ser tóxico. E as pessoas não gostam porque fica gosto na água. No Aqualuz a pessoa só precisa do sol”, diz Anna.
Para limpar, é necessário apenas água e sabão, e a duração do equipamento é de até 20 anos. “Desde que eu comecei a criar o Aqualuz a questão da criatividade sempre falou mais alto para mim. E o próprio legado de deixar o mundo melhor. Eu tento trabalhar com propósito. É minha missão, tudo que eu faço tem um propósito, é como eu quero ser lembrada”, concluiu a jovem cientista.
No vídeo abaixo, Anna conta como criou o Aqualuz e quais seus propósitos com o purificador.