Isaura Daniel
São Paulo – O Brasil está começando a reverter o saldo negativo da balança comercial do setor de produtos lácteos. O déficit registrado entre janeiro e abril deste ano caiu 10 vezes em relação ao mesmo período do ano passado. Foram vendidas no mercado externo 12,6 mil toneladas e importadas 15 mil. Ainda entraram 2,4 mil toneladas a mais de produtos lácteos pelas fronteiras brasileiras do que saíram. O rombo, no entanto, é bem menor do que o registrado em 2003: 25 mil toneladas.
Além de exportar mais, os brasileiros estão importando menos leite, queijos e manteigas. Enquanto as vendas externas aumentaram 46,6% entre janeiro e abril, as compras caíram 55,5%. O faturamento com exportações ficou em US$ 16,4 milhões no período, US$ 7,4 milhões a mais do que no primeiro quadrimestre de 2003. "Nos últimos seis meses já tivemos dois superávits na balança comercial", diz o presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Leite (CNPL) e da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rodrigo Alvim.
Parte do desempenho se deve ao mercado árabe, responsável por 35% da receita obtida pelo Brasil com exportações de lácteos. A região adquiriu 3,3 mil toneladas ou US$ 5,84 milhões em laticínios no primeiro quadrimestre, seis vezes mais que nos primeiros quatro meses do ano passado. Entre janeiro e abril de 2003, as compras da região árabe foram de apenas US$ 824 mil.
Na conta deste ano entraram também as vendas de leite em pó feitas para o Iraque via Organização das Nações Unidas (ONU), com uma receita de cerca de US$ 3,4 milhões. Mesmo assim, se forem levados em conta apenas os US$ 2,4 milhões obtidos com os demais países, o aumento em relação a 2003 é de 300%. A Argélia, por exemplo, consta na lista dos cinco maiores compradores externos de lácteos brasileiros entre janeiro e abril. A Mauritânia importou US$ 251 mil e o Sudão US$ 42 mil.
Os embarques para o Iraque, por mais que sejam ocasionais, também devem ajudar o país a entrar no mercado árabe. "Os produtos nacionais estão ganhando visibilidade na região", diz Alvim.
Só a Serlac Trading, exportadora de laticínios, vai sair de US$ 8 milhões vendidos no ano passado para US$ 40 milhões este ano. A Serlac comercializa seus produtos na Argélia, Marrocos, Tunísia, Angola, Congo, América Central e Iraque. Os países árabes, excluindo o Iraque, são responsáveis por 15% das exportações de leite em pó e condensado da empresa.
Setor persegue superávit
A expectativa dos pecuaristas nacionais é que a balança comercial do setor fique positiva até o final do ano. A CNA projeta exportações de 400 milhões de litros (quantidade utilizada na fabricação dos produtos vendidos) e importações de 350 milhões.
Os países árabes serão importantes para o cumprimento do objetivo. A Argélia é hoje o país que mais importa leite integral em pó do mundo, com mais de 100 mil toneladas ao ano, e por isso tem chance de crescer como cliente brasileiro. A Arábia Saudita é o maior importador mundial de leite condensado.
Para melhorar as exportações, porém, o segmento precisa também aumentar a produção interna de leite, hoje em 23 bilhões de litros por ano. Parte dos pecuaristas estão desestimulados a trabalhar com leite em função dos baixos preços pagos pelo produto. "O preço médio pago ao produtor em abril por litro foi R$ 0,44, enquanto o custo de produção é R$ 0,45", diz a técnica de Planejamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Maria Helena Fagundes.
O que ocorre é que os subsídios dados por países como Nova Zelândia, Austrália e União Européia aos seus pecuaristas achatam os preços da commodity no mercado internacional. Os produtores nacionais acabam tendo que baixar os preços para competir com os importados.
Mais leite no Brasil
Uma das medidas adotadas pelo setor para estimular a produção nacional de leite é a formação de cooperativas por parte dos pequenos e médios pecuaristas. "A idéia é que os produtores sejam donos dos laticínios regionais e vendam seus produtos transformados", explica. Ou seja, em vez de vender leite "in natura", os produtores fabricariam queijos, leite em pó integral e manteigas. De acordo com Maria Helena, esse movimento já começou e vem se refletindo nos números do setor. Tanto que as vendas externas de queijos alcançaram US$ 1,8 milhão em abril.
A saída quase que total da Parmalat do mercado nacional, em concordata, deve abrir espaço para a criação de cooperativas e novas empresas na área. Hoje, a companhia recebe apenas 200 mil litros de leite por dia, contra os três milhões anteriores. Em algumas partes do país, os produtores já estão assumindo as estruturas da empresa. "Em 2003 aumentaram em 8% a 10% as compras de leite por parte das cooperativas", diz Alvim.
De acordo com Alvim, o país também tem condições de aumentar a sua produção leiteira com a evolução do rebanho. As nove milhões de vacas leiteiras que existem nos Estados Unidos, por exemplo, produzem 80 bilhões de litros ao ano, enquanto no Brasil, há 19 milhões de vacas para uma produção de 23 bilhões. "Elas estão subalimentadas", diz.

