Isaura Daniel
São Paulo – Eles saíram dos países árabes, passaram pela Europa e acabaram parando nas mãos das rendeiras da Paraíba. Os arabescos, conjunto de traços curvos e arredondados característicos da arte árabe, são uma das principais influências da renda renascença feita no Nordeste do Brasil. "No período que antecedeu as Cruzadas os árabes entraram em contato com outros países e levaram os arabescos", diz o designer Christus Nóbrega, que lançou no início deste mês o livro "Renda Renascença – uma memória de ofício paraibana", que fala sobre as rendeiras da Paraíba.
No período anterior às Cruzadas, entre 622 e 1089, o exército árabe muçulmano lançou-se na conquista de várias regiões do mundo, inclusive da França, um dos países que colonizou a Paraíba e levou a arte de fazer renda para o estado. De acordo com o escritor, as invasões ocorridas antes e durante as Cruzadas acabaram propiciando também as trocas culturais. Os árabes, segundo Nóbrega, se tornaram fortes em arte abstrata em função da religião islâmica, que proíbe a reprodução de figuras humanas e de animais. "Isso influenciou a Europa", diz ele.
As rendas do tipo renascença são feitas à mão e têm como principal característica os traços e pontos entrelaçados, o que também é encontrado nos arabescos. Atualmente os arabescos são largamente usados na arquitetura e na tapeçaria árabe. Na Paraíba, a renda renascença se disseminou na década de 30 por meio de um colégio de religiosas francesas. "Neste colégio, as mulheres aprendiam a bordar, cuidar dos serviços de casa", afirma. O privilégio, porém, era apenas de meninas da alta sociedade, que freqüentavam o colégio da congregação Filhas da Caridade.
Tudo mudou quando uma servente da escola, chamada Maria Pastora, começou a ensinar o ofício de fazer renda para mulheres de classes mais baixas. O trabalho se apresentou como uma alternativa à região, que enfrentava dificuldades econômicas em períodos de seca. Hoje duas mil mulheres trabalham com renda na Paraíba, principalmente nas cidades de Monteiro, Zabelê, São João do Tigre, São Sebastião do Umbuzeiro e Camalaú em uma região bem próxima a Pernambuco. Cada uma destas cidades tem uma cooperativa que organiza a produção e ajuda as rendeiras a venderem seu produto e inclusive, a exportá-lo.
Livro e autor
O livro sobre as rendas da Paraíba foi feito por Nóbrega a convite do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que desenvolve um trabalho de capacitação junto às rendeiras do estado. A pesquisa foi realizada durante seis meses, entre a metade e o final de 2004 por Nóbrega e a historiadora Emmanuela Lins. A redação do livro, cujas fotos são de Odinaldo Costa, além de Nóbrega e Emmanuela, foi feita no ano passado. Segundo o autor, as fontes da obra foram os relatos das rendeiras e também bibliografia.
Christus Nóbrega é formado em Design pela Universidade Federal da Paraíba e já trabalhou como professor no curso de Design da Universidade Federal de Campina Grande. Na academia, além de dar aulas, o autor também desenvolvia pesquisas a respeito do artesanato. O livro é vendido nas agências do Sebrae e terá a receita com vendas revertida a projetos sociais para rendeiras paraibanas.

