Alexandre Rocha
São Paulo – O 1.º secretário de promoção comercial do Itamaraty, Evaldo Freire, confirmou ontem que o governo argelino manifestou grande interesse na compra de produtos das indústrias brasileiras de aviação civil e de defesa. Ele participou da missão do governo brasileiro à Argélia realizada no início de setembro, sob o comando da ministra de Minas e Energia Dilma Rousseff. “Os argelinos manifestaram um interesse muito forte pelos produtos dessas empresas brasileiras”, disse Freire.
Entre estas empresas estão a Embraer, fabricante de aviões, a Avibrás, indústria bélica, e a Condor, que fabrica produtos de defesa não letais, como balas de borracha. Representantes das três empresas participaram da viagem.
Freire disse que, no caso da aviação civil, os argelinos têm interesse em comprar aviões de pequeno porte, com capacidade entre 50 e 70 passageiros, para subsidiárias da Air Algerie, a companhia aérea local.
A Embraer fabrica pelo menos dois jatos que se enquadram nesse perfil, o ERJ 145, para 50 passageiros, e o Embraer 170, que tem capacidade entre 70 e 78 assentos. “Eles manifestaram interesse em nossa aviação. Agora isso envolve outros contatos entre a empresa e os argelinos”, afirmou ele. “É uma oportunidade para a Embraer, que nesse ponto (aviões de pequeno porte) tem meio caminho andado”, disse.
Freire não detalhou o número de aviões que a Argélia teria interesse em comprar, disse que em um primeiro momento poderiam ser em torno de três, mas trata-se de uma quantidade “que tanto pode aumentar, como diminuir”.
O diplomata não quis dar maiores detalhes, com receio de atrapalhar alguma negociação. “No segmento da defesa, o segredo é alma do negócio”, disse Freire, afirmando que neste ramo a concorrência européia e norte-americana é enorme e, sem que as empresas tenham contratos assinados em mãos, qualquer informação a mais pode atrapalhar um negócio.
Para exemplificar, Freire contou que durante a visita brasileira também estavam na Argélia representantes do primeiro escalão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), além de uma missão francesa. De acordo com ele, os norte-americanos e europeus têm nas mãos um trunfo em relação aos brasileiros, que é a facilidade de obter financiamentos. “É um mercado muito cortejado”, declarou.
Por outro lado, Freire disse que os brasileiros gozam de maior simpatia entre os árabes. O futebol, por exemplo, é sempre um “abridor de portas”. “Nossas empresas podem chegar nestes mercados usando o Brasil para isso”, afirmou ele, que também é o encarregado do mercado árabe no Itamaraty.
Dentista
Além da área de defesa, Freire ressaltou que o representante da Associação Brasileira da Indústria Médico-Hospitalar (Abimo), que participou da viagem, também saiu muito satisfeito. Ele disse que o produto brasileiro é muito competitivo, pois enquanto uma cadeira de dentista nacional, por exemplo, sai por cerca de US$ 3 mil, uma equivalente finlandesa é vendida por US$ 21 mil.
Da missão também participaram representantes da construção civil, da indústria petroquímica, dos exportadores da carne, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da Sadia, entre outras empresas e entidades.
A Argélia tem, por exemplo, uma grande demanda por obras de infra-estrutura, como barragens para melhorar o abastecimento de água e rodovias, e manifestou interesse no setor da construção brasileiro. Freire citou ainda projetos de construção de um metrô e de ferrovias.
Por outro lado, após a missão, já foi exportado o primeiro lote de carnes do Brasil para o país norte-africano, graças a um acordo sanitário finalizado durante a viagem.
“A viagem foi muito positiva, houve uma grande receptividade por parte do governo argelino”, disse Freire. Segundo ele, a visita da ministra Dilma foi a primeira de uma alta autoridade brasileira à Argélia em cerca de 15 anos. “Isso tem um significado político especial, no sentido de retomar o intercâmbio com a Argélia e com os países árabes em geral.”
Déficit
Segundo ele, uma das motivações da missão foi o grande desequilíbrio que há na balança comercial entre os dois países. O déficit do lado brasileiro é enorme, o maior déficit comercial individual do Brasil no mundo inteiro, de acordo com Freire.
Sob este ponto de vista, a presença de Dilma teve um significado especial, já que o principal produto importado pelo Brasil é o petróleo, por intermédio da Petrobras, que está sob o comando do Ministério de Minas e Energia.
De janeiro a agosto deste ano, o Brasil exportou US$ 97,4 milhões para a Argélia, ao passo que importou US$ 727,9 milhões. A diferença vem, porém, diminuindo um pouco ao longo dos anos. Enquanto o Brasil importou em 2000 mais de US$ 1,5 bilhão da Argélia, no ano passado o valor ficou em US$ 999,1 milhões.
Ao mesmo tempo, as exportações cresceram de US$ 41,4 milhões em 2000 para US$ 86,8 milhões no ano passado. Este ano, as vendas brasileiras para a Argélia já ultrapassaram o total de 2002.
Além do petróleo, o Brasil importa bastante nafta, para a indústria petroquímica, e gás liquefeito de petróleo (GLP). Os principais produtos vendidos são açúcar, barras de ferro, papel Kraft, café e minério de ferro.
“É preciso cair essa ‘cortina de fumaça’, de que é difícil negociar com os árabes. Eles são bons pagadores, têm interesse em todas as áreas da produção e em países como o Brasil”, concluiu Freire.