São Paulo – O desejo de registrar as histórias dos imigrantes árabes para as crianças a partir da sua própria memória levaram o professor de Direito Internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV) Salem Nasser a escrever “O Mascate”, livro de sua estreia na literatura infantojuvenil. A obra conta com as ilustrações de Roberta Asse e deverá ser publicada em outubro pela editora Tabla.
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Pai de um menino de 10 anos, um de oito e de uma menina de seis anos, Nasser, de 56 anos, pensou em escrever um livro infantojuvenil quando contava histórias da sua família para as crianças.
“São sempre muito interessantes como aventuras as histórias dos mascates de exploração, descobertas, do desconhecido. Imagino também que de muita apreensão”, diz Nasser, sobre os árabes que se mudavam para o Brasil e percorriam as ruas das cidades oferecendo produtos nas casas e comércios antes de, em muitos casos, estabelecerem suas próprias lojas. Para seu “O Mascate”, Nasser se valeu de praticamente toda a história do próprio pai, que veio para o Brasil em 1954 e hoje tem 95 anos, e da mãe, com 79 anos. Ele veio primeiro e só em 1961 ela desembarcou aqui.
“São sempre muito interessantes como aventuras as histórias dos mascates.”
Salem Nasser, autor de “O Mascate”PUBLICIDADE
“Pensei em contar as histórias dos familiares, de como viemos parar no Brasil, mas também enquanto aventura para as crianças, porque elas desejam aprender, sentir o ‘medo’ do herói, conhecer a novidade que ele [o herói] descobriu’”, diz o autor. É justamente na “aventura”, adianta Nasser, que reside o diferencial deste para outros livros que também retratam as histórias de mascates.
“Minha impressão é de que, na maioria dos casos, os outros livros que são escritos pela segunda ou terceira geração de descendentes exploram a sua própria relação com o pai, o avô. Não é tanto a aventura do imigrante, seus medos, descobertas, aqueles desencontros. Achei que isso seria diferente”, afirma.
Ilustrações para crianças, um capítulo à parte
Um capítulo especial nesta obra serão as ilustrações de Roberta Asse, também ela descendente de árabes e especialista tanto em imagens como em histórias para crianças. Foi ela uma das primeiras pessoas a ler “O Mascate”, além da esposa de Salem, Maria. E foi por intermédio de Maria que ele conheceu Roberta.
“A Roberta testou duas ilustrações que poderiam ter a forma definitiva. Aí falamos com as editoras. O retorno delas era sempre positivo, mas alguma coisa travava [a publicação do livro]. Aí conversamos com a editora Tabla, com a qual eu já falava. Era uma das escolhas óbvias”, relembra Salem em razão de a Tabla se dedicar a temas relacionados ao mundo árabe em suas obras.
“Eu queria que o livro fosse super bem-acabado, que estivesse à altura do tipo de aventura que iríamos contar. O ideal seria um apoio institucional e a Câmara Árabe era a escolha óbvia, por mais de uma razão: sim, tinha a possibilidade de um patrocínio, mas também porque poderia alavancar o livro, dar credibilidade ao trabalho, o alcance da Câmara poderia dar um alcance maior para o livro”, afirma, sobre o apoio que a Câmara de Comércio Árabe Brasileira concede para a produção de “O Mascate”.
Um novo desafio
Conhecido pelos trabalhos, artigos e comentários na televisão sobre diversos assuntos do mundo árabe, Salem conta que se aventurar no universo da literatura foi um desafio que ele queria enfrentar. Antes mesmo da pandemia, os primeiros rascunhos de “O Mascate” surgiram.
“Sempre namorei a ideia de escrever ficção, mas de tudo o que eu faço, é onde tenho menos segurança [para escrever]. Deixei alguns ensaios na gaveta. Em algum momento pensei que essa história infantil precisava da linguagem para criança. Também ficou lá parado esperando a possibilidade de submetê-lo a alguém. Conheci Roberta na pandemia. Tinha o texto pronto e o refinei a partir das conversas com ela”, diz.
Além de Roberta e Maria, um ícone da literatura brasileira teve a oportunidade de ler o texto prévio de “O Mascate”. “Uma das pessoas que leram e recomendaram a publicação foi o Milton Hatoum. Ele é um amigo e sempre generoso. Ele propôs uma pequena mudança. Vou seguir o conselho dele”, afirma Salem em seus primeiros passos na aventura da literatura para crianças.