São Paulo – O secretário de Promoção Comercial, Ciência e Tecnologia, Inovação e Cultura do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, Laudemar Gonçalves de Aguiar Neto, assumiu o posto há quatro meses após dois anos como embaixador do Brasil no Irã. Ele foi recebido na sede da Câmara de Comércio Árabe Brasileira na tarde desta terça-feira (15), em São Paulo.
A secretaria, que existia desde os anos 1970, foi recriada após um hiato de quatro anos do último governo e busca trabalhar sempre em parcerias ou redes com outras partes interessadas, como a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), as embaixadas, o setor privado e a academia.
“São três áreas de atuação: comércio e investimentos; ciência, tecnologia e inovação; e cultura, educação, e esportes, que eu estou agregando. A ideia é que todas as áreas conversem cada vez mais e acho que inovação perpassa tudo, não só a secretaria, mas todas as áreas, inovação em esporte, meio ambiente, comércio, tudo passa pela inovação”, disse Laudemar à ANBA.
O objetivo da secretaria é que os departamentos trabalhem de forma mais coordenada, e do lado de fora, nas embaixadas e em alguns consulados que tenham os setores de promoção comercial, também passem a tratar de ciência, tecnologia e inovação. “E onde tiver setor de ciência, tecnologia e inovação, que tenha uma junção para incorporar inovação a tudo. Estamos nesse processo”, contou.
Até o início de abril, Laudemar Neto estava no Irã. Ele assumiu a secretaria a convite do chanceler – e seu amigo há trinta anos – Mauro Vieira. “A ideia é que a secretaria tenha maior coordenação dentro do próprio ministério. Por exemplo, se tenho alguma iniciativa em um país árabe, me coordenar sempre com a secretaria política que cuida do Oriente Médio; se tiver algo ligado ao meio ambiente, vou tratar com a Seclima, que cuida de meio ambiente, mudanças climáticas e energia [outra secretaria recriada neste governo]”, explicou.
O secretário afirmou que é muito difícil fazer promoção comercial sozinho e que a coordenação entre as partes é primordial para se obter melhores e mais longevos resultados. Políticas de estado, e não de governo.
“Quando as embaixadas propõem alguma iniciativa, normalmente agregamos outros atores. Nossa preocupação é evitar que sejam iniciativas só de governo. Tentar unir o executivo, o legislativo, a iniciativa privada, a academia, porque na minha visão, quanto mais grupos de interesse diferentes se juntarem, mais você consegue ter políticas mais estáveis, mais permanentes, o que chamamos de política de estado”, disse.
Segundo ele, dessa forma, fica mais difícil desfazer esse trabalho em um novo governo, porque as partes interessadas vão defender que a iniciativa é importante para elas, e que se mantenha.
“Essa é a ideia, de transformar cada vez mais essa atuação diplomática brasileira em uma atuação diplomática de estado, não só de governo. Obviamente haverá prioridades e haverá ajustes”, disse.
Prioridades
A prioridade para a secretaria, segundo o diplomata, é retomar as relações com os países africanos e da América Latina. “Sobretudo com os africanos, que nós já tivemos presença maior, dobramos o número de embaixadas no continente africano na primeira década dos anos 2000. Algumas foram fechadas ultimamente, nós vamos retomar”, disse.
Ele contou ainda que a secretaria está fazendo um esforço conjunto com a ApexBrasil, Ministério da Agricultura e Pecuária e iniciativa privada para fortalecer a área comercial e de inovação em alguns países africanos.
“Com todas as dificuldades que existem, com os desafios, mas também com as oportunidades que a gente vê, [é importante a presença] em um continente que vai ser o que mais vai crescer nas próximas décadas, e que vai abrir um monte de oportunidades”, declarou.
Mas é preciso voltar de uma forma diferente do que foi feito há vinte anos, segundo Laudemar Neto. “Porque vários países já usaram o espaço que já tivemos, não só a China mas a Índia, a Turquia”, declarou.
Em relação aos países árabes, essa foi a primeira câmara de comércio que o secretário visitou em sua gestão (a Câmara Árabe). Ele contou que pretende visitar outras e já tem agenda na Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Irã.
“Comecei por essa câmara [árabe] não só por conhecer o embaixador Osmar Chohfi, mas também pela importância que damos ao comércio com os países árabes e o potencial que vemos no aumento e na diversificação desse comércio e dessa cooperação em geral, que não é só em relação a comércio, mas em relação a investimentos, inovação e mesmo em relação a atividades culturais”, disse.
Ele afirmou que existe pouco conhecimento sobre o que e como são os países árabes, em relação ao que é ser muçulmano e o que é o halal. “[O halal] significa muito mais do que a carne [o abate]. Existe uma filosofia halal, que vai em relação ao vestuário, a comportamentos, ao turismo”, disse.
“Existem diferenças culturais, histórico-culturais, ou religiosas, que você tem que aprender, saber lidar com e trocar informações para conhecer melhor. Eu parto do princípio de que quanto mais você conhece o outro, mais você pode se colocar no papel do outro e melhor você conversará e cooperará com o outro. Se você já começa com preconceitos em relação ao outro sem nem saber a razão da diferença, fica muito mais difícil. É o primeiro passo, aceitar as diferenças”, declarou.
Outra prioridade, para o diplomata, é fazer com que o Brasil volte a ser um trader global. “Hoje, muito do nosso comércio está concentrado em poucos países – China, Estados Unidos, (os países da) União Europeia, Argentina-Mercosul. Isso parece dizer que é bem distribuído. É distribuído por continente, mas não por países, então queremos aumentar o comércio bilateral com os países da América Latina”, disse.
O secretário lembrou que os países da América do Norte concentram cerca de metade de seu comércio entre eles; na União Europeia, em média, 60% do comércio é entre os países do bloco. Asean [Associação de Nações do Sudeste Asiático], cerca de 70% do comércio é entre os dez países.
“E na América Latina, e mais ainda, na América do Sul, é 26%. Então temos pouco comércio e pouca cooperação, podemos ter muito mais cooperação com América Latina e Caribe, com a África, temos muito pouco, com países árabes, pode ser muito mais, praticamente nada com a Índia, um país superimportante, o nível de cooperação é muito pequeno”, declarou.
A pasta também pretende aumentar o que o secretário chamou de processo de neoindustrialização. “Estamos levando a cabo agora nesse governo, com o PAC 3 [Programa de Aceleração do Crescimento], de exportar produtos de maior valor agregado”, disse.
A diferença que a secretaria recém-recriada vai fazer, de acordo com Laudemar Neto, é estar em sintonia com todos os setores. “Há uma convergência do que a gente quer fazer. Há uma convergência na iniciativa privada, no governo e até no parlamento, de que precisamos desenvolver mais nossas relações exteriores e nosso comércio exterior, que já foi desenvolvido muito na primeira década e meia dos anos 2000 e agora precisamos retomar isso”, disse.
A retomada envolve também missões oficiais que vêm agregando o setor empresarial, segundo o diplomata. “Como foi o caso da visita do presidente Lula a China, a Portugal, e agora a Angola [final de agosto]. Estarmos mais presentes e atuando sempre em coordenação, sabendo sempre quais são as prioridades da Câmara Árabe, da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e de outros atores para trabalhar em conjunto”.
“Dentro das prioridades do governo, temos que encontrar pontos convergentes entre os diferentes atores que atuam no comércio exterior”, concluiu.
O encontro na Câmara Árabe contou com a presença do presidente Osmar Chohfi, do secretário-geral Tamer Mansour, do vice-presidente de Relações Internacionais, Mohamad Orra Mourad, e da analista de Relações Institucionais da entidade, Elaine Prates.
Laudemar Neto estava acompanhado pelo assessor de gabinete da secretaria, Ricardo Fleury, e pela responsável pelo setor de Promoção Comercial e Ciência e Tecnologia do Escritório de Representação em São Paulo (ERESP) do Ministério das Relações Exteriores, Mariana Thiele.