São Paulo – Há pelo menos 20 anos o Brasil vem produzindo e utilizando bioplástico como um substituto de produtos de origem fóssil. Passadas duas décadas, uma das principais associações do setor, a Associação Brasileira de Biopolímeros Compostáveis e Compostagem (Abicom), avalia que o ambiente está propício para o País ter uma taxa de crescimento acima da global. A estimativa mundial é que a indústria de bioplásticos mais do que triplique sua capacidade de produção nos próximos cinco anos. O dado é da European Bioplastic, e foi divulgado no relatório mais recente, de dezembro de 2021.
Para Karina Daruich, diretora executiva da Abicom, a produção agrícola nacional é o que torna o cenário brasileiro mais fértil para essa indústria, que utiliza materiais agrícolas como matéria-prima mais abundante e de baixo custo por aqui. “No Brasil, acreditamos que o percentual de crescimento pode ser até maior [do que a expectativa global], considerando investimentos já anunciados. O País deve se tornar uma plataforma mundial para os biopolímeros”, explicou Daruich, em entrevista por telefone.
Entre os diferentes tipos desses biopolímeros, um dos principais é o produzido com fonte renovável, porém que não são compostáveis, ou seja, demoram o mesmo tempo de um plástico comum para se decompor no meio ambiente. No Brasil, uma das principais indústrias de biopolímeros deste tipo é a Braskem, que atua com a marca ‘I’m green bio-based’. O produto da empresa é feito a partir do etanol da cana-de-açúcar, e é produzido em escala industrial e comercial desde 2010.
Outros dois tipos, que estão sob o guarda-chuva da Abicom, são os biopolímeros compostáveis. Esses podem ser de fonte renovável, ou de fonte fóssil, mas ambos se decompõem rapidamente quando descartados no local apropriado. Apesar dessas opções sustentáveis estarem no mercado há décadas, Daruich lembra que a migração do plástico comum para o bioplástico ocorreu a passos lentos. Um dos pontos que freou esse crescimento foi a falta de locais para destinar a compostagem. “O cenário melhorou após a implementação da logística reversa e de uma política nacional para resíduos sólidos para destinar corretamente as embalagens após o uso”, explicou a diretora.
Destino correto para compostagem
Em 2014, a Abicom incluiu entre seus associados a indústria de compostagem. “Foi necessário criar essa indústria [da compostagem], que vem crescendo muito, para dar destino aos plásticos. Não faz sentido fazer um produto biodegradável para ir parar em um aterro. Lá não tem as condições controladas, como na compostagem”, explicou Daruich.
Para a associação, é preciso fechar o ciclo, principalmente no caso dos polímeros produzidos a partir de matéria-prima agrícola. “A maioria dos bioplásticos de fonte renovável vem de amido como milho, batata, beterraba. Tem também cana-de-açúcar e até de açaí. E depois [de decomposto] ele pode adubar uma plantação de milho, por exemplo”, afirmou a executiva.
É o caso da americana Earth Renewable Technologies (ERT). A empresa produz bioplástico à base de cana-de-açúcar. No Brasil, a indústria abriu uma planta em Curitiba, no Paraná.
O brasileiro Kim Gurtensten Fabri, presidente da ERT, explica que a marca ainda importa matéria-prima e produz hoje o chamado biocomposto. O produto é o resultado de uma mistura de matérias, tendo um biopolímero como base e somando a ele outras ‘cargas’. “Adicionamos materiais, e nossa tecnologia sempre mantém a compostabilidade”, explicou Fabri.
O plano da empresa é de iniciar em 2023 um projeto de polimerização, justamente o processo inicial que gera a base do biopolímero. Do volume do biocomposto produzido pela ERT, um terço fica no Brasil e o restante é exportado.
A marca não faz ‘produtos finais’, mas são eles que ditam o ritmo da indústria. O principal destino ainda é a cadeia de produtos descartáveis. Nessa lista estão pratos, copos e talheres utilizados em delivery. Mas há, também, embalagens mais robustas e até itens como vestuário e calçados. “A demanda dos descartáveis cresce bastante e vai ser fortemente regulável. Nisso estão sacolas, copos, canudos. Também tem aumentado o mercado para as embalagens rígidas em mercados que tem regulamentação, como o Chile, a Europa. No Brasil, tem crescido em São Paulo e Brasília, por exemplo”, explicou ele.
Futuro promissor
Para a diretora da Abicom, o principal impulsionador do setor será a demanda do público. “Nos últimos dois anos, com avanço da procura do consumidor por produtos sustentáveis, saímos da economia linear, que é de extrair o recurso, produzir, usar e jogar fora. E estamos indo para uma economia circular, onde desde o design do produto já se pensa em todo o ciclo de vida da embalagem, se vai ser reutilizável ou reciclada ao final”. explicou Daruich.
Com a movimentação, o setor brasileiro também se tornou mais atrativo para o investimento internacional. “Existem muitas startups anunciadas com tecnologia brasileira que os investidores estão de olho. Não só para produzir aqui, mas levar para fora a tecnologia. Mas o ideal é produzir aqui. O Brasil tem potencial de crescimento muito grande”, afirmou a diretora da Abicom.
Fabri tem a mesma visão e explica que foi essa expectativa que trouxe a ERT para o País. “A empresa foi fundada em 2009. Ficamos 10 anos incubados para desenvolver as tecnologias em uma universidade americana. Aqui, há essa proximidade com a matéria-prima. Eu acredito bastante no Brasil”, concluiu ele.