Geovana Pagel
São Paulo – O consumo de produtos orgânicos é uma tendência mundial. Desde 1980, o setor tem crescido, em média, 15% ao ano. No Brasil, em 2003, o segmento movimentou mais de US$ 300 milhões. Em breve, o país pode triplicar a área de produção dos alimentos, hoje estimada em 275 mil hectares.
Dados do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar) mostram que da safra 1999/2000 para a de 2001/2002 o número de propriedades orgânicas e em transição, que era de aproximadamente 4,5 mil, passou para cerca de 15 mil. “Estima-se que a área cultivada sob manejo orgânico no Brasil seja de aproximadamente 275 mil hectares, que agora poderá ser triplicada”, explica Moacir Darolt, engenheiro agrônomo e pesquisador do Iapar.
Segundo ele, infelizmente não existe uma estatística oficial. “O que existe é uma estimativa de crescimento, sobretudo com a possibilidade de certificação de uma área de pastagens do Mato Grosso do Sul, que abrange mais de 500 mil hectares”, explica o pesquisador, autor do livro “Agricultura Orgânica: inventando o futuro”.
O volume de produção orgânica no Brasil é de aproximadamente 300 mil toneladas/ano, porém “vale lembrar que estes valores de produção devem crescer expressivamente nos próximos anos, visto que grande número de propriedades ainda passa pelo processo de conversão e não pode comercializar seus produtos como orgânicos”, afirma Darolt.
A maior parte (80%) da produção orgânica brasileira encontra-se nos estados do Sul e Sudeste. Em torno de 85% da produção orgânica brasileira é exportada, sobretudo para a Europa, Estados Unidos e Japão. O restante, 15%, é distribuído no mercado interno.
De acordo com Darolt, é interessante ressaltar que o aumento do mercado orgânico brasileiro em volume de produtos comercializados, que era de cerca de 10% ao ano no início da década de 1990, passou a ser de 40 a 50% na virada do milênio.
De forma geral, as cifras ainda são modestas, se considerarmos que o número total de agricultores orgânicos não chega a 1% do número total de agricultores do país. “Por outro lado, mostra o potencial de expansão deste mercado. Para se ter uma idéia, um estudo recente que realizamos na Região Metropolitana de Curitiba mostrou que a demanda por alimentos orgânicos foi 35% superior à oferta”, afirma o pesquisador.
Produtores e produtos
O estudo de Darolt, publicado em 2002, mostra que os produtores orgânicos brasileiros estão divididos basicamente em dois grupos: pequenos produtores familiares ligados a associações e grupos de movimentos sociais, que representam 90% do total de agricultores, e grandes produtores empresariais (10%) ligados a empresas privadas.
A agricultura familiar é responsável por cerca de 70% da produção orgânica brasileira e responde por boa parte da renda gerada com estes produtos. “Enquanto na região Sul cresce o número de pequenas propriedades familiares que aderem ao sistema, no Sudeste a adesão é prioritariamente de grandes propriedades”, explica Darolt.
Em relação ao tipo de produto, os grandes produtores (com mais de 100 hectares) se destacam na produção de frutas, sobretudo citrus e frutas tropicais (manga, uva, etc.), além de cana-de-açúcar, café e cereais orgânicos (soja e milho, basicamente). Atualmente, começa a despontar a pecuária orgânica em áreas extensivas, com destaque para o Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.
Pelo menos 30 tipos de produtos orgânicos vêm sendo produzidos no país, sendo que os principais itens exportados são café (Minas Gerais); cacau (Bahia); soja, açúcar mascavo, erva-mate, café (Paraná); suco de laranja, açúcar mascavo e frutas secas (São Paulo); castanha de caju, óleo dendê e frutas tropicais (Nordeste); óleo de palma e palmito (Pará); guaraná (Amazônia); arroz, soja e frutas cítricas (Rio Grande do Sul) e arroz (Santa Catarina).
O agrônomo constatou que o mercado de produtos orgânicos processados cresce lentamente e que o número de empresas certificadas para a produção industrial no Brasil ainda é muito pequeno. “Para se ter uma idéia dos 350 certificados emitidos até o momento pela Associação de Agricultura Orgânica (AAO), apenas 12 correspondem a processos de beneficiamento”, exemplifica.
Entre os produtos orgânicos processados, aparecem o mel (MG, AM); compotas de frutas, café solúvel, torrado e moído (MG, SP); castanha de caju e acerola (CE); hortaliças processadas (RJ, SP, PR, SC, RS); arroz (RS, SC); óleos essenciais (SP); suco de laranja concentrado (SP); extratos vegetais secos (SP); barra de cereais (PR); açúcar mascavo (PR) e guaraná em pó (AM).
Os produtos de origem animal ainda estão sendo pouco explorados por problemas de falta de matéria-prima orgânica e legislação inadequada.
Os dados mostram que existe um potencial latente, sobretudo para pequenas empresas. "O mercado ainda permanece pequeno em função da falta de matéria-prima orgânica e um trabalho de marketing que diferencie o produto orgânico", avalia.
Certificadoras
A certificação da produção orgânica nacional é realizada por cerca de 19 agências certificadoras, 11 nacionais e 8 internacionais que atestam que a produção do alimento obedeceu as normas de qualidade orgânicas. A maioria das certificadoras nacionais encontra-se no estado de São Paulo, enquanto as internacionais são provenientes, sobretudo, de países da União Européia.
A entrada de muitas certificadoras internacionais mostra que o Brasil tem potencial para ser um grande produtor de commodities orgânicas de exportação. "Sem contar que existem muitas facilidades para instalação de certificadoras estrangeiras no país", aposta o agrônomo.
Segundo ele, apesar de haver um crescimento exagerado de certificadoras no país, a tendência é que nos próximos anos haja uma diminuição deste número com a fusão de grandes certificadoras preocupadas com o mercado externo e o surgimento de certificadoras regionais para o mercado interno.
Darolt afirma que uma das finalidades da certificação é a capacidade de rastrear a origem do produto orgânico. Normalmente as certificadoras nacionais fornecem um certificado com um ano de validade e paga-se uma taxa para utilizar o selo das certificadoras
Perspectivas orgânicas
As estatísticas mostram que existe um grande potencial de expansão da produção orgânica no Brasil. Alguns setores, ainda pouco explorados como a fruticultura, cereais, derivados de leite e carne devem ser incrementados nos próximos anos.
Darolt afirma que apesar de a maioria da produção orgânica ainda ser destinada ao mercado externo, está havendo um aumento rápido da demanda interna, impulsionada pelo crescente número de consumidores que tem procurado alimentos mais saudáveis, de melhor sabor e que preservem o meio ambiente.
“Vale lembrar que ainda existe uma vantagem comparativa para o Brasil, que pode explorar com maior facilidade esse mercado em expansão, já que a concorrência ainda não é tão intensa”, explica.
Ao mesmo tempo em que o pesquisador afirma que as perspectivas de expansão são promissoras, lembra alguns fatores que necessitam ser equacionados. “Em primeiro lugar, o país precisa de uma legislação eficiente que dê garantias ao consumidor da procedência do produto orgânico”, avalia.
Além disso, segundo Darolt, será necessário baixar os custos de certificação para os produtores, o que deve ocorrer com a entrada de novas certificadoras e com o desenvolvimento de processos de certificação participativa, em que são priorizados não só aspectos tecnológicos mas também sociais.
“O apoio governamental, concretizado por meio de políticas que apóiem e incentivem a conversão dos agricultores convencionais em orgânicos, também deve ser priorizado”, diz o pesquisador. Segundo ele, não podemos esquecer que é preciso maior investimento em centros de pesquisa, ensino e extensão, pois até o momento foram os produtores que arcaram com esses custos.
Contato
www.pr.gov.br/iapar

