São Paulo – O Brasil pode ser definido como uma democracia instável ou de baixo consenso, segundo o cientista político Fernando Schüler (foto acima), que fez a palestra “Eleições, democracia e os desafios do País para 2019” nesta quarta-feira (15) no Auditório Walid Yazigi, na Câmara de Comércio Árabe Brasileira, na capital paulista.
Fernando Schüler deu um panorama sobre a campanha eleitoral para a Presidência do Brasil, apresentando possíveis cenários para um segundo turno, e explicou o contexto em que as eleições se desenrolam no País, em uma situação de instabilidade política nacional e com muito mais pessoas participando do debate eleitoral.
Segundo o palestrante, o mundo inteiro vive um momento diferente da democracia. “A democracia está polarizada, em grande medida isso está acontecendo por causa da tecnologia. Há 30 anos, há 20 anos você tinha dez mil pessoas participando do debate, economistas, articulistas, jornalistas, políticos. Hoje você tem algumas dezenas de milhões de pessoas”, falou Schüler.
Essa democracia é mais barulhenta, mais crítica e nela o cidadão tem mais poder, segundo o cientista político. “Os partidos políticos perderam boa parte da sua função, eles representavam os indivíduos e hoje os indivíduos têm meios de se auto representar, se auto organizar diretamente”, falou, citando as convocações via internet para passeatas na Avenida Paulista, em São Paulo.
De acordo com o palestrante, a nova fase veio para ficar. “A democracia não será mais o que foi no passado, vai ser mais barulhenta, mais instável, consensos serão mais difíceis”, disse. Schüler disse que a dificuldade de conseguir consenso nas reformas no Brasil é o tom da democracia. Ele fez a ressalva que o quadro é agravado pela situação brasileira, de tensão política em função do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e de crise econômica.
Schüler citou uma reportagem da revista britânica The Economist, publicada antes do impeachment e que dizia que a derrubada da presidente “envenenaria” a política brasileira. O cientista político descreveu o processo de impeachment como um exercício da democracia e das instituições brasileiras, mas disse que ele de fato envenenou a política brasileira mais do que já estava envenenada.
“O impeachment não baixou aqui no Brasil por acaso, o Brasil já vinha num processo de ingovernabilidade, de fragmentação partidária, já havia uma crise brutal, a economia brasileira havia caído 3,8% em 2015, se encaminhava para um queda que acabou sendo de 7% em dois anos, não caiu do céu aquele processo, mas acrescentou ainda mais toxina à vida brasileira, e nós vivemos num país de baixo consenso, o que eu chamo de democracia instável”, disse.
De acordo com Schüler, o Brasil tem baixo consenso em questões que ele acreditava que estavam resolvidas, que são as regras do jogo democrático. Dizendo isso, o cientista citou artigo escrito pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no The New York Times no qual ele afirma a existência de um golpe de estado no País. “Democracia de baixo consenso é isso, é ter lideranças expressivas do sistema político e partidário que questionam e tensionam a regra do jogo o tempo inteiro. Isso você tem na esquerda e em setores da direita também”, disse. Lula está preso.
Ele citou outras áreas de baixo consenso no Brasil, como a necessidade da responsabilidade fiscal e disse que há baixíssimo consenso sobre o processo de modernização no País. Mas segundo Fernando Schüler, a democracia brasileira não está em risco. “Nós temos um momento de mal-estar, de instabilidade, de desacordo, de baixo consenso e nós temos que superar, e o Brasil tem instituições para superar”, disse o cientista político.
Eleições
Depois de falar sobre democracia e dar uma ideia da atual pulverização partidária no Brasil, o cientista político apresentou uma pesquisa eleitoral, do instituto RealTime Big Data. Nela, o candidato Jair Bolsonaro (PSL) aparece em primeiro lugar na pesquisa com indicação de candidatos à Presidência da República, com 21%, seguido por Marina Silva (Rede), com 11%, e por Geraldo Alckmin (PSDB), com 9%. Esta pesquisa não inclui o nome do ex-presidente Lula que, de outra forma, aparece bem à frente de todos os outros candidatos em qualquer sondagem estimulada.
Na pesquisa espontânea, em que o eleitor fala o nome do seu candidato, Lula está em primeiro, com 17%, seguido por Bolsonaro, com 14%, e por Ciro Gomes (PDT), com 2%. De acordo com Schüler, o fato de Bolsonaro ter proporção parecida nas duas pesquisas significa votos consolidados.
O cientista político falou que a eleição ainda não começou no Brasil e que o debate pré-eleitoral está apenas entre os eleitores de nível superior, que são 9,5% do total e são as pessoas que já vivem a eleição nas redes sociais. “O povão ainda não entrou na campanha”, disse ele. Segundo Schüler, na pré-campanha só Lula e Bolsonaro existem.
Schüler afirma que o restante da população deve entrar na campanha quando começar a propaganda eleitoral em rádio e televisão, na qual Alckmin terá 44% do tempo. “Ele vai ter Alckmin de manhã, Alckmin no almoço, Alckmin de tarde, Alckmin de noite, Alckmin falando que baixou a criminalidade de São Paulo, que fez o rodoanel”, brincou.
Segundo o cientista político, o candidato Ciro Gomes ficou emparedado, isolado pela esquerda de um lado e sem fazer movimento ao centro do outro. “O Lula, lá de Curitiba, continua sendo um grande operador da política brasileira”, disse Schüler. O cientista citou Bolsonaro como o fato novo na política brasileira, esclarecendo que não fazia juízo se se tratava de um fato bom ou um ruim, e o citando como opção da fatia conservadora no Brasil.
Schüler falou que os conservadorismo brasileiro tendia a votar de “cara amarrada” no PSDB. “Sempre teve uma parcela importante da sociedade brasileira que é conservadora de costumes, temos 30% de população evangélica, com todo o direito, que não gosta de discussão sobre aborto, que tem restrições à questão de comportamento de maneira geral, que não gosta de ideologia de gênero na escola, e é legítimo, não estou dizendo que é certo ou errado. Esse segmento não estava representado politicamente”, disse, sobre os eleitores do Bolsonaro.
Para o cientista político, a eleição brasileira tem três possibilidades: Fernando Haddad (PT) – atualmente pré-candidato a vice na chapa de Lula -, Bolsonaro e Alckmin. Ele acredita que o PT manterá Lula como candidato até a última possibilidade, em 17 de setembro, com uma estratégia clara de fazer dele um “tucano de imagem”. Depois, deve entrar com Haddad como candidato. Haddad carregaria os votos de Lula, segundo Schüler. “Pode funcionar”, disse.
Em um segundo turno entre Alckmin e Haddad, os votos do candidato Bolsonaro iriam para o PSDB e em um segundo turno entre Bolsonaro e Haddad, os de Alckmin iriam para Bolsonaro. A dúvida de para onde iriam os votos da esquerda seria em uma disputa entre Alckmin e Bolsonaro, segundo o cientista político.
Fernando Schüler terminou sua palestra afirmando que o Brasil tem hoje uma sociedade civil mais forte, com grupos à esquerda e outros mais conservadores, e que isso talvez seja a esperança de uma renovação no Congresso Nacional.
O encontro foi aberto pelo presidente da Câmara Árabe, Rubens Hannun, que ressaltou que a palestra acontecia em um momento especial, último dia de prazo para inscrição das candidaturas para a Presidência da República no Brasil. Participaram da palestra membros da diretoria da Câmara Árabe e estudantes de Administração da Universidade Estadual do Maranhão, além do público em geral.