Doha – O Catar quer cooperação com o Brasil nas áreas de segurança alimentar e vigilância sanitária, pode abrir seu mercado para a importação de gado brasileiro e ainda tem interesse em fazer investimentos no País. Estes foram alguns dos temas tratados pelo ministro da Agricultura, Blairo Maggi, numa série de reuniões realizadas com representantes do governo catariano, em Doha, nesta segunda-feira (22), último dia da missão promovida pelo Ministério da Agricultura a quatro países do Golfo.
“O senhor viu que há falta de segurança alimentar aqui, e de água, então há muitas oportunidades de cooperação”, disse o ministro das Municipalidades e do Meio Ambiente do Catar, responsável pela área agrícola, Mohammed Bin Abdullah Al Rumehi, ao seu colega brasileiro.
O país é muito seco e a produção agrícola não é suficiente para abastecer o mercado interno. Segundo Rumehi, apenas 4% do território é utilizado para atividades rurais. “É difícil atender a segurança alimentar”, destacou. A população do Catar é de 2,5 milhões de pessoas, mas pode chegar a três milhões em pouco tempo. “Nosso interesse é ampliar os negócios e fornecer alimentos aos países que têm necessidade”, respondeu Maggi.
Um dos objetivos da viagem de Maggi foi dar explicações às autoridades das nações visitadas sobre a Operação Carne Fraca da Polícia Federal, que investiga irregularidades em frigoríficos e na atuação de fiscais do Ministério da Agricultura. Em vista do noticiário negativo gerado em torno da operação, o Catar não chegou a barrar as importações de carnes brasileiras, mas aumentou sua própria fiscalização.
“Dou todas as garantias de que os produtos que o Brasil exporta são de ótima qualidade”, disse Maggi a Rumehi. “Nossas relações com o Brasil são de alto nível”, observou o ministro catariano. “Somos muito próximos a vocês”, acrescentou.
Na mesma linha, em encontro com Maggi, o diretor de Saúde Pública do Ministério da Saúde Pública da nação árabe, Mohammed Bin Hamad Al Thani, afirmou que o governo brasileiro agiu de maneira a evitar que os problemas gerados pela Carne Fraca se tornassem maiores. Maggi agradeceu o apoio recebido das autoridades catarianas na compreensão da questão.
“Esta visita representa muito a dedicação do governo brasileiro. Temos um histórico de poucos problemas com o Brasil”, comentou Thani. Ele e a gerente de Sanidade dos Alimentos e Saúde Ambiental do ministério, Wasan Abdullah Al-Baker, sugeriram a facilitação das trocas de informação entre os dois governos para que em casos semelhantes as informações cheguem ao Catar o mais rápido possível.
O secretário de Relações Internacionais do Agronegócio, Odilson Luiz Ribeiro e Silva, ainda convidou os catarianos a enviarem técnicos ao Brasil para conhecer os laboratórios que fazem análises sanitárias, e Maggi acrescentou que em breve será designado um adido agrícola para a embaixada brasileira na Arábia Saudita, que cuidará dos demais países da região também, o que contribuirá para uma melhor comunicação entre os dois governos nesta área.
Como o Catar vai sediar a Copa do Mundo de futebol em 2022, Wasan Al-Baker perguntou quais instrumentos foram utilizados pelo Brasil para rápida liberação de alimentos importados em grandes eventos como a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. “Nós podemos compartilhar isso com vocês”, garantiu Silva.
Ao ministro Rumehi, o presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Maurício Antônio Lopes, que integrou a delegação, destacou que a instituição tem interesse em cooperar com o Catar na área de agricultura em regiões secas. “Temos vontade de buscar opções de cooperação e estamos muito abertos para negociar a visita de missões técnicas”, disse.
Compra de gado
Outro tema levantado pela delegação brasileira foi a liberação das exportações de gado vivo ao Catar. O Brasil já enviou proposta de acordo sanitário neste sentido. “Nós importamos gado da Austrália, mas nunca pensamos nisso (em importar do Brasil) por causa da distância, mas vamos trabalhar para dar seguimento [ao acordo]”, declarou Rumehi.
Silva lembrou que a Organização Internacional de Saúde Animal (OIE) dá ao Brasil o status de risco “negligenciável” para a ocorrência da encefalopatia espongiforme bovina, o mal da vaca louca. Nesse sentido, o subsecretário de Assuntos Agrícolas e Recursos Pesqueiros do ministério catariano, Faleh Bin Naser Al Thani, ressaltou: “Se para a OIE está OK, eu não vejo nenhum problema, é só uma questão de dar encaminhamento aos documentos”.
Para ampliar os negócios, Rumehi ainda sugeriu a participação de empresas brasileiras numa feira agrícola no Catar. O presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Rubens Hannun, que participou das reuniões em Doha, afirmou que a entidade tem interesse em trazer companhias do Brasil para expor em eventos do gênero. Ele acrescentou que o estande organizado pela instituição na feira da Associação Paulista de Supermercados (Apas), em maio, teve participação do Catar.
“Há um setor muito grande [no Catar] para as empresas brasileiras entrarem”, comentou Faleh Al Thani.
Os brasileiros se encontraram também com o chefe adjunto do Departamento de Desenvolvimento de Negócios da Qatar Investment Authority (QIA), o fundo soberano do país, Mohammed Yaser Al-Mosallam. “Eles têm investimentos no Brasil e estão propensos a fazer mais investimentos, mas querem projetos”, disse Maggi à ANBA.
Maggi teve ainda uma reunião com o ministro da Economia do Catar, Ahmad Bin Jassim Al Thani.
Balanço
Doha foi a última etapa de uma viagem de dez dias que teve escalas também no Kuwait, na Arábia Saudita e nos Emirados Árabes Unidos. Na avaliação do presidente da Câmara Árabe, a missão mostrou a importância que o Brasil dá aos países árabes. “Eles (os árabes) queriam isso mesmo, transparência, rapidez (na troca de informações) e contato direto, vir pessoalmente é de grande importância”, disse Hannun.
O ministro viajou acompanhado de um grupo de empresários que apresentou para potenciais investidores da região projetos no setor agropecuário no Brasil. “Para os empresários, várias portas foram abertas, eles fizeram contatos importantes, mas investimentos não ocorrem de uma hora para outra, é necessário amadurecer as conversas”, observou Hannun.
Nesse sentido, ele destacou a importância de se dar continuidade às negociações iniciadas durante a missão entre os agentes públicos e privados. “Nós temos a missão de promover as relações entre árabes e brasileiros. Nós conhecemos as duas partes e temos o papel também de incentivar a continuidade das negociações tanto na área administrativa como comercial”, destacou.
A própria Câmara Árabe se comprometeu com ações futuras, como receber missões dos países visitados, organizar uma semana de produtos brasileiros na rede de supermercados Panda, na Arábia Saudita, e fomentar a participação de empresas brasileiras em feiras na região.
Hannun ressaltou que os contatos feitos com câmaras de comércio do Golfo, agências de notícias como a Kuwait News Agency (Kuna), parceira da ANBA, e outras instituições foi feito também pensando nesta continuidade, em ações futuras.
“É papel nosso também fazer esta mediação [entre os diversos agentes públicos e privados], o comércio não é feito só de compra e venda. Quando o ministro e sua equipe vêm aqui conhecer os países pessoalmente, criam um outro tipo de relação que alimenta a compra e venda”, concluiu.