São Paulo – Pesquisadores da unidade Instrumentação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) se uniram a cientistas do instituto alemão Forschungszentrum Jülich para desenvolver um novo tipo de fertilizante fosfatado. O produto foi testado em lavouras de soja do Brasil e é capaz de aumentar em até 10 vezes a biomassa da soja quando comparado a sistemas convencionais de adubação.
A fórmula para chegar ao produto inclui enxofre, rejeito da indústria do petróleo, para liberar uma fonte natural de fósforo denominada estruvita, oriunda de resíduos urbanos. O composto, denominado estruvita-polissulfeto (St/PS), foi testado na cultura da soja, por sua importância agronômica e alta dependência de fertilizantes.
Segundo Caue Ribeiro (foto acima), líder da Rede de Nanotecnologia para o Agronegócio (Rede AgroNano) da Embrapa Instrumentação, o uso dos materiais separadamente já era conhecido, mas com uma eficiência muito menor do que tem ao serem unidos. A expectativa é que o novo fertilizante ganhe escala dentro da próxima década.
Em entrevista à ANBA, o pesquisador explicou que o novo produto é uma alternativa que, além do melhor desempenho no campo, traz sustentabilidade. “O enxofre pode vir do petróleo brasileiro, do qual já se retira volume alto do componente químico. No refino do petróleo, o enxofre já precisa ser retirado. A estruvita pode ser produzida a partir da recuperação do fósforo presente no esgoto doméstico, com maior eficiência agrícola do que os fertilizantes convencionais. Então essa produção do fertilizante recupera os compostos que iriam para a água e ainda é uma fonte de fósforo que se perderia”, afirmou ele.
O novo produto também ganha em absorção, segundo a pesquisa. Isso porque a liberação do fertilizante é controlada, o que permite a entrega gradual de nutrientes de acordo com os ciclos da planta.
A busca por um fertilizante do tipo vem de longa data, explica Ribeiro. “O estudo que desembocou no novo produto começou com uma pesquisa de doutorado da minha orientanda Stella Fortuna do Valle. Mas já tem cerca de sete a oito anos que estamos buscando formas de suprir essa demanda”, afirmou ele.
Maior independência em fertilizantes
Um dos pontos altos da inovação é que o produto mostra potencial para reduzir a dependência brasileira de fertilizantes importados. Apesar de ter sido testado em plantações de soja, o insumo serve para qualquer cultura que demande fosfato e enxofre, o que, de acordo com a Embrapa, ocorre na grande maioria das lavouras.
O Brasil é um dos maiores consumidores de fertilizantes do mundo, e o maior importador do produto. Essa dependência do mercado externo torna o País suscetível a preços altos ou a conflitos que possam impactar a exportação de fertilizante, como vem ocorrendo desde o início da guerra na Ucrânia.
O Fosfato Monoamônico, o MAP, um derivado de rocha fosfática, é um dos três fertilizantes mais importados pelo Brasil, de países como Arábia Saudita e Marrocos, além da Rússia.
Apesar disso, a Embrapa lembra que a solução desenvolvida agora ainda precisa de um trabalho conjunto, envolvendo inclusive os órgãos que fazem tratamento de água e esgoto no Brasil. Apesar de existir em abundância, a estruvita precisa ser separada do esgoto doméstico, o que exige um esforço mais amplo em torno do saneamento básico. “Eu costumo insistir que confundimos emergência com urgência. Em momento como o atual, há uma emergência, então precisamos divulgar o que está na mão para atitudes rápidas. Mas a questão dos fertilizantes no Brasil vai além disso, no próprio Plano Nacional de Fertilizantes já está previsto reduzir a dependência do de importação desse produto para 60% em 2030, para se ter ideia da urgência”, apontou Ribeiro.
Por fim, o pesquisador conclui lembrando a importância do investimento para a continuidade do trabalho. “A Embrapa não vai produzir em escala. Hoje, nosso maior interesse é captar empresas que trabalham com produção de fertilizantes, ou que tenham interesse na produção de estruvita. É a integração entre saneamento urbano e fertilizantes que vai gerar esse desenvolvimento”, concluiu.