São Paulo – À frente do documentário ‘Gaza’, que abriu a Mostra Mundo Árabe de Cinema em Casa 2020, o diretor Garry Keane revelou como a experiência na Palestina mudou sua vida. O longa lança um olhar rico sobre o cotidiano do povo que resistente e vive na Faixa de Gaza, território palestino que sofre com conflitos e bloqueios por parte de Israel. “Não tem como sair de lá e não se sentir humilde e agradecer o que você tem na vida. Isso me deu um foco que nunca vou perder na vida. Falo com as pessoas de Gaza, estou em contato com as associações beneficentes”, afirmou o irlandês durante bate-papo online do evento, nesta sexta-feira (11). A mostra ocorre em plataforma virtual própria até 13 de setembro e de 31 de agosto a 27 de setembro no site Sesc Digital.
O filme Gaza (foto acima) foi indicado ao Sundance Film Festival de 2019. A produção estreou em 2019, mas as gravações aconteceram anos antes, e desde então, o diretor explica que estabeleceu laços com os palestinos. “As pequenas coisas que fazemos fazem a diferença. Desde arrecadar dinheiro, levar comida, ou, com a covid, mandar máscaras, todos podem fazer algo. E agora nós temos uma missão que vai até a morte. Que é lutar. E esse filme foi só o início”, revelou ele.
Também participaram do bate-papo virtual a professora Arlene Clemesha, que leciona história árabe contemporânea na Universidade de São Paulo (USP), foi representante da sociedade civil brasileira nas Nações Unidas através da Rede Internacional pela Palestina (UN-ICNP). A mediação foi feita por Diogo Bercito, jornalista da Folha de São Paulo, especializado em assuntos ligados ao Mundo Árabe e autor do blog Orientalíssimo.
Para Clemesha, o filme ganha relevância por trazer uma imagem da região que vai além daquela de uma zona de conflito perene. “Essa caracterização como zona de conflito é algo construído de fora para dentro. Não é a realidade vivida pelas pessoas, como eles se veem ou como a História mostra a região. De fato, tem muito mais do que isso. Isso desumaniza as pessoas de lá, e isso faz parte de um processo de dominação. É processo complexo, coisa que o filme do Garry consegue desconstruir”, pontuou a professora.
Neste sentido, Bercito lembra a imagem do mar retratada no filme. “Essa ideia de que a Faixa é ligada ao mar, à pesca, mas também ao lazer. Essa ideia de que o mar é o único horizonte para muita gente de lá”, destacou o jornalista. O diretor irlandês lembra que o mar que banha a região faz parte da vida cotidiana dos moradores de Gaza. “Como a faixa fica na costa do Mar Mediterrâneo, trabalhamos muito com as pessoas dentro do mar, fora e à frente dele. Por isso, percebemos que isso era tão forte. Como observadores, filmamos em 2015 muitas imagens da praia porque todo mundo parecia que estava ali. Eles rezam, dançam, fazem festa. É um lugar muito feliz”, disse.
“Mas a parte triste é que em 218, por conta da falta de energia e de água, além dos [problemas com] encanamentos de esgoto, as pessoas precisaram parar de nadar no mar. Foi uma tragédia. E a situação está piorando pouco a pouco. É um local com dois milhões de pessoas. Eles não podem sustentar esse bloqueio [de Israel] por mais tempo. Quando eles [palestinos] estão no mar, eles veem o horizonte, podem sentir a sensação de liberdade, mas sabem que tem uma guerra e estão presos ali”, alertou Garry Keane.
A Mostra em Casa é uma realização do Instituto da Cultura Árabe (Icarabe) com correalização do Sesc-SP e patrocínio da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, com apoio do Instituto do Sono e da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (Fambras).
Assista o bate-papo completo abaixo: