Alexandre Rocha
São Paulo – O comércio entre o Brasil e Argélia pode continuar a dobrar todos os anos. Esta foi uma das conclusões do seminário sobre as relações econômicas entre o Brasil e a Argélia realizado ontem (26), na abertura dos trabalhos da missão de empresários e membros do governo da Argélia que está em São Paulo.
"O comércio poderá dobrar se boa parte dos setores que estão presentes aqui fizerem negócios", disse Dani Benchaa, diretor-geral para as Américas do Ministério das Relações Exteriores da Argélia e chefe da delegação, que conta com representantes de 13 empresas de vários segmentos.
Um dos fatores que pode contribuir para o aumento do comércio, de acordo com o diretor de relações exteriores da Câmara de Comércio e Indústria da Argélia (CACI), Kadri Saadane, é um plano de desenvolvimento lançado pelo governo argelino que prevê investimentos de US$ 50 bilhões, em vários setores da economia local, até 2009. "Este programa certamente vai afetar o comércio exterior da Argélia", afirmou Saadane.
Na avaliação dos empresários e autoridades argelinas que estão em São Paulo, as relações econômicas (investimentos, parcerias e comércio) podem se dar em diversos setores. "As economias do Brasil e da Argélia são complementares. O mercado da Argélia está aberto para o exterior e precisa de tudo. Todos os setores precisam de produtos, desde agroalimentares, como açúcar, café e carne, até industrializados como veículos", disse o vice-presidente da CACI, Hadjan Hussein.
As exportações do Brasil para a Argélia já vêm praticamente dobrando todos os anos. Em 2001, os embarques brasileiros para o país árabe renderam US$ 44,7 milhões, passaram para US$ 86,8 milhões em 2002 e para US$ 153,7 milhões em 2003. No período de janeiro a julho deste ano, as exportações já chegaram a US$ 169,1 milhões, mais do que no ano passado inteiro. Na opinião do presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira (CCAB), Paulo Sérgio Atallah, o valor deve chegar a US$ 300 milhões até o final de 2004.
Um dos desafios é superar o grande déficit do Brasil na balança comercial. A Argélia é um dos principais fornecedores de petróleo para o mercado brasileiro e exportou mais de US$ 1 bilhão nos primeiros sete meses do ano. "Mas a defasagem é cada vez menor", disse Atallah.
O presidente da CCAB ressaltou ainda que o Brasil está diversificando sua pauta de exportações para a Argélia. Ele lembrou, por exemplo, que o Brasil exportou biscoitos tipo wafer para o país árabe este ano, produto que não fazia parte da pauta até recentemente.
"Se um contêiner foi exportado, isso significa que o produto está sendo testado por lá. No ano que vem exporta mais um e no seguinte duplica. Este é o segredo. Quando a dona de casa compra alguma coisa para servir para sua família, ela demonstra que tem confiança no produto. E isso é muito importante, especialmente para o setor de alimentos", afirmou.
Vendas diretas
Um dos objetivos da missão, segundo Benchaa, é fomentar o comércio direto entre os países da América Latina e a Argélia. Antes de chegar ao Brasil, a delegação esteve na Argentina e no Chile. Os três países devem ser visitados em breve também pelo presidente argelino Abdelaziz Bouteflika, pois o governo local elegeu 2004 como o "Ano da América Latina".
"Observamos no passado que muitos produtos latino-americanos entraram no mercado argelino, mas por meio de países europeus. Queremos lutar contra esta triangulação", afirmou Benchaa.
De acordo com ele, faz parte da política de seu governo promover a chamada "cooperação sul-sul" entre os países em desenvolvimento. "As relações entre a América Latina e a Argélia são históricas, existe uma sólida amizade, solidariedade e as economias são complementares. Mas um dos objetivos desta missão é colocar uma base econômica nestas relações", declarou. "Uma forte relação econômica vai fortalecer a cooperação sul-sul, dará mais credibilidade a ela e fortalecerá a base política", acrescentou.
Plataforma para outros mercados
Na pauta de importações da Argélia, de acordo com Kadri Saadane, aparecem em primeiro lugar os bens de capital industriais e agrícolas, o que mostra o foco no desenvolvimento da indústria local, seguidos de matérias primas e produtos semimanufaturados, depois dos alimentos e, por último, dos "bens de consumo não alimentares".
Nesse sentido, na avaliação dos integrantes da missão, podem surgir parcerias entre empresas brasileiras e argelinas, não só para abastecer o mercado local, mas também os demais países do Mediterrâneo e da África. "A Argélia tem uma posição geográfica estratégica. Ela pode ser uma porta para a o Mediterrâneo e para a África", disse Hadjan Hussein.
Um dos segmentos em que pode ocorrer parcerias, em sua avaliação, é o agroalimentar. "O Brasil tem uma forte experiência nessa área, então companhias brasileiras e argelinas podem fazer parcerias para instalar uma unidade de produção na Argélia e exportar para a África e para a Europa", acrescentou Hussein. Segundo ele, a Argélia também pode fornecer produtos do gênero para o Brasil, como tâmaras, figos secos, derivados de trigo, entre outros. "Com certeza estes produtos ainda serão apreciados por aqui", disse.
"Podemos ter uma plataforma nossa lá e vice-versa", disse o assessor de assuntos internacionais do governo de São Paulo, Flávio Musa. "Seria inteligente intensificar o comércio de ambos os lados", acrescentou.
Investimentos
Na seara dos investimentos, os recursos, segundo o plano do governo local, devem vir de fontes locais e externas, privadas e públicas. Alguns dos setores de maior interesse são os de energia, infra-estrutura e construção civil. "São livres os investimentos em todos os setores e em todo o território nacional. Além disso, não há discriminação entre os investimentos nacionais e internacionais", disse Zeriguine Djamel, da Agência Nacional de Desenvolvimento dos Investimentos da Argélia.
Ele ressaltou que os investimentos estrangeiros diretos em seu país somaram US$ 1,1 bilhão em 2003, patamar que vem se mantendo relativamente estável desde 2001. O principal investidor no momento é o Egito, que aplica principalmente no segmento de telefonia móvel. Em segundo lugar aparecem os Estados Unidos, seguidos dos países europeus.
Djamel ressaltou que a economia argelina é estável, a taxa de inflação é de 2% ao ano, as reservas internacionais estão na ordem de US$ 33 bilhões e podem chegar a US$ 40 bilhões até o final do ano, por causa do aumento do preço do petróleo. O Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com ele, cresceu 6,8% em 2003, chegando ao patamar de US$ 60,3 bilhões.
"Nós estamos comemorando alguns números do comércio. Mas espero que daqui a dois ou três anos possamos comemorar os investimentos bilaterais", concluiu Paulo Atallah.

