São Paulo – As exportações do Brasil para a África são fortemente influenciadas pelas obras tocadas por construtoras brasileiras no continente. No rastro das empreiteiras vão máquinas, equipamentos, veículos, material de construção e outros produtos que não são diretamente ligados ao setor, mas acabam encontrando as portas abertas.
De acordo com o secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Welber Barral, as obras são as principais motivadoras dos embarques de produtos industriais ao continente. “A exportação de serviços alavanca a venda de produtos como máquinas e material de construção”, disse ele à ANBA.
E os itens industrializados são maioria na pauta de exportações. No primeiro semestre deste ano, segundo informações do MDIC, as exportações do Brasil para a África renderam US$ 3,8 bilhões, uma redução de 8,7% em comparação com o mesmo período do ano passado.
Segundo Barral, esse impacto ocorreu justamente pela queda das vendas de mercadorias ligadas ao setor, como veículos pesados e peças, e também de aviões. Por outro lado, houve forte crescimento nos embarques de produtos agropecuários, como açúcar, frangos e carne bovina.
De 2003 a 2008, as exportações para África cresceram de forma constante, saindo de US$ 2,9 bilhões para US$ 10,2 bilhões, com redução para US$ 8,7 bilhões no ano passado, em função da crise financeira internacional.
"A África cresceu muito na exportação de commodities e, naturalmente, isso fez aumentar o poder de compra, então [o continente] passou a comprar mais”, afirmou o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Alguns dos países africanos, como Argélia e Nigéria, são grandes fornecedores de petróleo ao Brasil.
Ele acrescentou que o continente tem um nível de industrialização menor, em comparação com outras regiões, o que explica a diversificação das vendas brasileiras para lá. Como Barral, Castro destacou que o trabalho das construtoras abriu caminho para a comercialização de diferentes produtos.
O executivo citou o exemplo da Guiné Equatorial, país visitado na semana passada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lá, a construtora ARG, de Minas Gerais, é responsável pela construção de rodovias, o que acabou abrindo um mercado até recentemente desconhecido para os empresários brasileiros.
Só para dar uma ideia, as vendas para a Guiné saíram de US$ 3,6 milhões em 2004 para US$ 45,4 milhões no ano passado. Entre os itens embarcados estão carne de frango, lácteos, fumo e açúcar, além de máquinas, veículos, equipamentos e material de construção. “Mudou tudo só com a ida de uma empresa”, destacou Castro.
E este não é o único caso. Várias construtoras brasileiras estão presentes em território africano, como Andrade Gutierrez, Odebrecht, Queiroz Galvão e Camargo Corrêa. Esta última, por exemplo, tem, além de obras, investimentos na indústria de cimento do continente, e pretende ampliá-los, segundo reportagem publicada na quinta-feira (08) pelo jornal Folha e S. Paulo.
Política
Nos últimos anos, o governo tem se empenhado em ampliar a presença brasileira na África, sendo que o principal incentivador dessa política é o próprio Lula. Apesar do crescimento do comércio, a investida brasileira em direção às nações africanas e outros países em desenvolvimento geram críticas de alguns setores.
Castro, por exemplo, diz que o país abandonou as ações de promoção com seu principal parceiro comercial, os Estados Unidos. Para ele, a busca pela chamada “cooperação Sul-Sul” fez com que o governo colocasse os interesses políticos acima dos comerciais.
O governo nega e diz que atua em duas frentes, uma na direção das nações em desenvolvimento e outra direcionada para os países ricos, tendo como meta a diversificação dos mercados do Brasil.
Crédito
Opiniões à parte, o fato é que a ampliação dos negócios com países em desenvolvimento fez surgir novos desafios. Para quem exporta para a África, a principal dificuldade é o crédito, não pela falta de dinheiro, mas pela resistência dos bancos em aceitar garantias oferecidas pelos importadores. A exceção são as operações lastreadas em commodities.
“Em geral, o problema é o crédito. Só agora o Brasil está tendo a experiência de fazer negócios com outros países em desenvolvimento. Isso cria a necessidade de inovações, de usar a criatividade”, destacou o secretário-geral da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Michel Alaby, que há décadas trabalha na área.
Ele contou o caso de uma indústria brasileira que recentemente perdeu um grande contrato no Sudão por falta de financiamento. O negócio acabou ficando com uma empresa da Índia.
O problema do crédito acaba dando mais gás aos principais concorrentes do Brasil no mercado africano, especialmente a China. Ávidos pelas matérias-primas, os chineses têm, em seu país, crédito fácil para os negócios com a África. Alaby citou também forte concorrência da Índia e da Turquia.
Os profissionais do comércio exterior esperam que a criação do Exim Brasil, agência de crédito às exportações, subsidiária do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), vá diminuir a desvantagem brasileira nessa seara. O governo promete que a concessão de crédito terá um processo simplificado em comparação com outras operações do BNDES. Como ela ainda não está em operação, o setor exportador espera para ver se a promessa será cumprida. (Leia mais uma reportagem sobre negócios com a África amanhã (13) cedo na ANBA)

