Dubai – O que fazer em Dubai que ainda seja inusitado, em uma cidade tão globalizada? “Corridas de camelo”, “googlei”. Encontrei o Al Marmoum Heritage Festival Finale 2019. Um festival com música, comida e… corrida! Aí vem aquela velha “expectativa x realidade”. Já em Dubai, eu tinha pedido informação para umas dez pessoas sobre o festival e o clube de corridas de camelos. Ninguém parecia ter ouvido falar. “Corrida de camelos não é exatamente um esporte nacional”, pensei.
Na primeira tentativa, choveu. Não acreditei. Não era aqui que não chovia quase nunca? Chamei o taxista. “Oi, tudo bem? É normal chover assim aqui?”. Ele sorriu. “Não muito.” E olhou para o céu, ainda rindo. Como eu ia ficar irritada? Ok, fiquei irritada, mas vida segue. Estava chovendo fininho. O motorista disse que não há corrida de camelos quando chove. Pelo menos ele sabia do que eu estava falando, né? Trovejou. Deixei os camelos para depois.
Dia da segunda tentativa, pego o táxi em frente ao hotel. “Dubai Camel Racing Club, por favor.” Ouço de volta: “Onde é isso?”. Me pergunto se esse lugar existe mesmo. “É pegando a estrada que vai para Al Ain”, digo. Quem diria, ein, mãe? Eu, dando o caminho para o taxista em Dubai. Agradeço a invenção do Google Maps, porque meus conhecimentos geográficos acabam por aí. Mostro o mapa para ele, que diz: “Aaaaah, ok”. E liga o Google Maps no seu próprio celular.
Muito sol! Hoje vai! Lá para o meio do caminho, olhei para fora. A areia do deserto invadia a estrada, e o céu à frente ficava cada vez mais cinza. O taxista me olhou pelo retrovisor. “Incrível, né?”. Eu comecei a rir (de nervosa). “Inacreditável, né? (risos)”. Começou a chover. O taxista rindo. Começou a chover muito forte. Chegamos no clube. E a chuva também. Camelos! Dezenas deles esperando sentados em uma área perto da pista de corrida. O taxista perguntou em árabe a um dos cuidadores sobre o tal festival, mas como as atividades só começariam em uma hora, pedi para ficar em frente às arquibancadas da corrida. Não havia nenhum sinal de táxi por perto lá, então anotei o número dele e disse que ligaria na volta se precisasse. Ele se despediu, simpático, mas com cara de que não me entendia. Meia dúzia de turistas. Chuva. Camelos. Eu. Por que no meio daquela chuva eu ia ficar ali? E por que eu não ia? Fiquei.
Um segurança me arrumou um folheto informando sobre as corridas do dia, quantos quilômetros e em que horários iriam correr, e apontou duas maneiras de ver a corrida: “Na arquibancada vai ver só a chegada. É melhor ir no ônibus para turistas, que acompanha a corrida toda.” Sim, o ônibus vai correndo atrás dos camelos. Enquanto esperava, fui ver a arquibancada. Havia alguns turistas e uma TV, que transmitia a corrida. De repente, os camelos correndo! Os vencedores. Os retardatários… O ônibus com camelos desenhados (só podia ser turístico). E carros. Muitos deles!
Meninos e homens com as cabeças para fora das janelas, gritando em árabe. Isso, eles gritavam para os camelos! Eu não falo árabe, mas acho que os camelos entendiam, porque corriam sem cavaleiros (existe ‘cameleiros?’) em direção à linha de chegada.
Subi no ônibus com os outros turistas para a próxima corrida. Já estava quase saindo o sol. A pista dos carros contornava a pista principal. Os camelos começaram a correr, os carros saíram junto e o ônibus na dianteira. Quem estava do lado direito se levantou e foi para as janelas opostas ver de perto. E… chuva! Eu só pensava em duas coisas: 1) por que escolhi o lado errado do ônibus? 2) eu não acredito que está chovendo de novo.
A corrida que vi era de oito quilômetros. Os camelos apressados da frente foram cansando, e dava para ver aqueles que a gente não dava nada tomando a frente. Parecia uma nova modalidade: corrida de camelos debaixo d’água. Na reta final, o ônibus saiu da pista e deu a volta por trás da arquibancada, sem ver a linha de chegada, e voltou ao ponto de saída. Ok, eu não acho que iria lembrar para qual camelo estava torcendo no começo mesmo. O legal é que eles gravam vídeos das corridas e colocam no canal no YouTube (veja no final do texto).
As pessoas desceram do ônibus e eu fiquei conversando como uma moça muçulmana que trabalhava ali. O motorista avisou que iria dar a volta no estacionamento e que podíamos ficar ali mesmo. Ficamos. Ele foi se afastando dos turistas quando a chuva voltou a cair com mais força e vento. Muito vento! Aquele vento que joga a chuva de lado, sabe? Olhei para os turistas lá fora, ensopados! O ônibus voltou e eles entraram para esperar passar o temporal. Inclusive, as corridas foram encerradas ali mesmo, a pista dos camelos estava mais para lagoa do que pista.
Uma das turistas olhou para mim: “Você está seca. Que sortuda!”. Olha, sortuda não é o termo que eu usaria para uma pessoa que atrai chuva no lugar-onde-quase-nunca-chove a ponto de cancelarem as corridas. Mas, pensando em tudo, para onde eu fui, o que eu pude ver, conversar, rir, viver por dias, e ouvir aquelas pessoas. É, acho que tenho sorte sim!
Ah! Quando a chuva passou, descobri que o resto do Al Marmoum Heritage Festival Finale 2019 existe sim! As outras atividades ficam numa vila ao lado do Dubai Camel Racing Club, montada para receber os turistas. Cheia de banquinhas que vendem comida, roupas, perfumes. Também estava meio alagada (desculpe, pessoal), mas deu para ver uma apresentação de música típica árabe. E voltar feliz e com os pés ensopados e cheios de areia para casa.