São Paulo – O ensino da língua árabe no Brasil e os caminhos que essa área do conhecimento seguiu até chegar aos dias de hoje estão agora documentados em forma de filme. Abdurrahman Abu Hasna é o diretor do filme “Dâd in São Paulo”, lançado no final de maio, com professores e alunos da Universidade de São Paulo (USP).
‘Dâd’ é uma das letras no idioma árabe. “Não é usada por outros idiomas, por isso é uma característica especial na língua árabe”, explica o diretor palestino, que vive no Brasil há um ano e meio e decidiu contar como a presença da comunidade árabe resultou no ensino do idioma em uma das maiores universidades do País.
A produção é toda em árabe e estreou no dia 28 de maio na rede de televisão árabe AlAraby Tv, sediada em Londres, que financiou a produção do filme e sua exibição. O filme gravado no Brasil é o primeiro documentário da carreira do palestino. “Quando cheguei ao Brasil, sabia da ligação histórica entre os árabes e este maravilhoso país, pois tinha lido muita literatura da diáspora, dos grandes poetas árabes que viviam nas Américas e que escreviam muita poesia considerada uma das mais importantes da literatura árabe”.
Formado na Universidade de Arte em Teerã, onde se especializou em Direção Cinematográfica, Hasna já dirigiu curtas-metragens como “Uma onda roubou minha mão” (Beirute, 2018). No Brasil, o diretor quis descobrir e retratar a realidade atual do país apontando a ligação cultural entre o mundo árabe e sua presença aqui. “Foi o início de uma visita à Universidade de São Paulo, onde ouvi falar da existência de um curso para ensinar árabe, que causou um grande impacto em mim e fez-me sentir muito otimista. Encontrei uma grande ligação entre mim, como um árabe e sua língua, e o Brasil e o povo brasileiro”, declarou.
Se a primeira descoberta foi ver alunos brasileiros aprendendo árabe, o verdadeiro ponto de virada veio ao conhecer a trajetória da professora Safa Jubran, que era chefe de Departamento de Letras Orientais na USP. “Soube que a chamavam de ‘Senhora do Dâd'”, conta o diretor, acrescentando que a partir daí, ela se tornou a protagonista do filme e foi quem impulsionou a produção. “É notável que ela fale árabe fluentemente e num tom familiar para mim”, destacou Hasna.
A iniciativa encontrou na vida de Jubran uma história original sobre o ensino de árabe em São Paulo. A professora é libanesa e veio para o Brasil aos 20 anos de idade. Ela trabalha na divulgação da cultura e no ensino da língua e literatura árabe no Brasil desde que se formou na USP. A produção retratou cenas nos ambientes onde ela vive e trabalha. Para Jubran, participar da produção foi uma experiência interessante do “registro fiel à vida normal e comum de uma professora, sobre sua trajetória”.
O diretor decidiu, então, que a essência do filme viria a partir da história de Jubran, que faz uma ponte entre as culturas árabe e brasileira. Para completar o conteúdo, outros entrevistados foram alunos do idioma na USP. “Eles, que amavam o árabe e a literatura, e que estavam na vanguarda dos defensores e amantes da cultura e da língua árabes, foram os outros coprotagonistas deste filme”, explicou o diretor.
Foram 10 dias de filmagens e outros 40 para edição do material captado. “Foi uma bela experiência em que prevaleceu o espírito de aventura, especialmente porque eu não falava português fluentemente, mas com a presença de uma boa equipe facilitou muito o trabalho”, contou Hasna sobre o trabalho com a AH Produções e Traduções. “A aventura de produzir este filme acrescentou-nos uma nova experiência em lidar com um novo país que é vasto e profundo e cheio de histórias que desconhecíamos. Além de nos permitir ver e conhecer outros aspectos da imigração árabe para o Brasil”, disse ele.
Graças a exibição da rede de tv e ao alcance que as redes sociais proporcionam, o público alvo da produção não se limitou ao mundo árabe, mas sim a todos os falantes do idioma no mundo. “Recebi várias manifestações felizes de vários cantos do mundo, que expressaram também sua surpresa, exatamente porque as pessoas não conheciam o nosso trabalho e conquistas e agora há um registro disso. Também porque além de falar sobre o curso de árabe e sua história e atualidade, abordou também, como forma de contextualização, a imigração árabe no Brasil”, afirmou a professora Safa Jubran.
“A importância desta produção é mostrar o que esse grupo de professores que atua numa universidade faz em termos de ensino, de formação, de pesquisa e de preparação de pesquisadores, sem que receba ajuda de qualquer governo ou instituição do mundo árabe, como, por exemplo, ocorre com outros cursos. E que apesar disso, eles e seus alunos conseguiram e conseguem produzir e difundir um conhecimento de qualidade que o mundo árabe deveria conhecer”, afirmou Jubran, acrescentando que o curso aguarda iniciativas de países árabes que possibilitem a difusão da língua e as culturas árabes com ainda mais eficiência.
O documentário ainda não tem legenda em português, mas o diretor espera incluir a tradução em breve. Assista, abaixo, o documentário, em árabe.