São Paulo – A tunisiana Hajer Aounallah, de 27 anos, está desenvolvendo pesquisas do Instituto Butantan. No Programa de Pós-Graduação em Ciências – Toxinologia da entidade brasileira, ela fez parte de seu doutorado. O estudo se tornou possível a partir de um acordo acadêmico com a Universidade de Tunis El Manar – Instituto Pasteur, na Tunísia, o que lhe permitirá receber o título de doutora em ambas as instituições.
Aounallah se apaixonou pela ciência ainda na infância, quando observava o dia a dia dos pais, ambos cientistas dedicados ao estudo da microbiologia. “Sempre fui fascinada por coisas como DNA, coisas que só são possíveis de serem vistas com microscópio. Nós pensamos que a vida é aquilo que vemos, mas não. A vida é aquilo que não se pode ver”, contou ela à reportagem da ANBA.
Em 2018, quando veio pela primeira vez ao Brasil, a ideia inicial era passar dois meses no País. “Eu nunca tinha ido para fora do país sozinha. Nesse primeiro [voo para o Brasil] eu me lembro de ficar acordada. Eu não conseguia dormir”, relembra.
Na ocasião, a pesquisadora acabou ficando em solo brasileiro por mais tempo do que o esperado e se adaptou aos poucos ao cotidiano. “Na primeira vez em que estive aqui eu me sentia representando a Tunísia, meu país, minha religião. Isso na minha cabeça. Mas infelizmente o problema é que quando você faz algo [em outro país], ninguém vai se lembrar do seu nome. As pessoas vão lembrar sua nacionalidade. E era isso que eu tinha em mente”, disse.
Mas com o tempo de convivência com os brasileiros, a tunisiana passou a se sentir mais à vontade. “Eu nunca tive que mudar nada em mim mesma. Honestamente, os brasileiros me ajudaram muito porque eles me aceitaram como sou. Não apenas no laboratório, mas também fora [do trabalho]. Eles, inclusive, se adaptam mais a mim do que eu a eles. Se vão para onde eu não posso ir, eles dizem que podem mudar o local. E eu também nunca tento mudar nada na cultura deles, eu tento respeitar”, disse ela.
Aprendizados do intercâmbio
A tunisiana revela que quando chegou ao Brasil precisou aprender do zero a língua local. “Agora, eu entendo quase 90% do contexto, em qualquer conversa. Eu já falava francês – além do inglês e árabe – e isso me ajudou. O francês ajuda muito porque é próximo ao português. Especialmente na escrita. Não foi fácil no início, quando eu só falava palavras básicas para sobreviver, incluindo ‘obrigada’”, diverte-se ela.
Por outro lado, a cientista também pôde apresentar seu país a muitos brasileiros. “Muita gente não sabia onde fica a Tunísia”, revelou.
Descobertas do intercâmbio
Para a pesquisadora, viajar é uma das melhores experiências que se pode ter na vida e é esse valor que ela leva também para o estudo no exterior. “Enquanto estudante, em algum ponto descobrimos que ciência é ciência [na Tunísia ou no Brasil]. Mas nós nos completamos. Voltando para a Tunísia, eu vou tentar ensinar aos estudantes sobre o que aprendi no Brasil”, disse.
Aounallah frisou, ainda, seu desejo de que ambos os países deem a devida importância para a ciência, incluindo mais apoio governamental para os pesquisadores. A cientista está, agora, retornando à Tunísia, de onde fará a defesa de seu doutorado, com transmissão por videoconferência, e participação de tunisianos e brasileiros.
Até o momento, a pesquisadora tem planos de ir a novos países. “Estou satisfeita com o que aprendi aqui. A vida é curta, então penso que é melhor ir para outra oportunidade ao redor do mundo. Talvez eu volte ao Brasil. Quem sabe? Depende da oportunidade”, concluiu ela.