Alexandre Rocha
São Paulo – O economista Armando Castelar Pinheiro, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), acredita que em 2003 foram criados “bons fundamentos” para garantir uma recuperação mais forte da economia em 2004. No entanto, ele ressaltou que é preciso ter calma, pois apesar da previsão de crescimento entre 3% e 4% do Produto Interno Bruto (PIB) para o próximo ano, isso não significa que todos os problemas de desemprego e de queda na renda da população serão resolvidos rapidamente.
“Haverá uma melhora na taxa de crescimento, mas o impacto no nível de bem estar ainda vai demorar um pouco mais”, avaliou Castelar. Ele lembrou que 2003 foi “um ano de ajustes”, pois havia, no início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “muita desconfiança” dos mercados financeiros nacional e internacional em relação a qual seria a política econômica do novo governo.
A febre de incertezas começou até antes disso, ainda durante as eleições, quando as chances de Lula ser eleito tornaram-se reais. Houve uma forte desvalorização do real, o que puxou a inflação para cima, e o risco país subiu exponencialmente. “Isso reduziu muito os financiamentos estrangeiros”, lembrou Castelar.
Dentro desse quadro, lembra Castelar, o governo teve que apertar a política fiscal, aumentar meta de superávit primário e a taxa básica de juros num primeiro momento. “Com isso o governo conseguiu afastar os temores sobre as condições do país conseguir pagar suas dívidas e controlar a inflação, além de diminuir a necessidade de financiamento externo”, declarou.
No entanto, apesar do equilíbrio macroeconômico ter sido garantido, o aperto no cinto deprimiu a atividade econômica, gerando desemprego e depreciação da renda da população por causa das taxas de inflação mais elevadas registradas no início do ano. O próprio governo já admitiu que o crescimento do PIB não deverá ultrapassar 0,5% este ano. “O Brasil terminou o ano praticamente no zero a zero”, disse Castelar.
Por isso ele ressalva que é preciso calma. “Com a desaceleração de 2003 houve uma queda muito forte na renda real da população, o que gerou uma incerteza sobre quando ela vai voltar a crescer. Mas que vai, vai”, garantiu.
Desemprego
Na avaliação do economista, apesar do provável crescimento na oferta de empregos em 2004, o nível desemprego deverá continuar no patamar de dois dígitos. “A situação vai melhorar aos poucos”, declarou. “Não vai dar para conseguir acabar com todo o desemprego e recuperar toda a renda em um ano. Isso vai demorar alguns anos”, disse Castelar.
Ele lembrou que o processo de aumento do desemprego começou há seis anos e que a recuperação deve demorar no mínimo de dois a três anos. Castelar ressaltou ainda que nesse período houve também uma “precarização” do emprego, com as pessoas recorrendo cada vez mais a atividades informais.
“O fundamental é ter calma. Não adianta querer acelerar muito no começo e ser obrigado a dar uma brecada forte logo no primeiro semáforo”, destacou, referindo-se ao fato que um afrouxamento muito forte das rédeas da economia num primeiro momento pode levar novamente ao aumento da inflação e, conseqüentemente, a uma nova alta na taxa de juros.
Ele advertiu também para o perigo de baixas muito bruscas na taxa selic – que chegou a 26,5% no início do ano, mas depois começou a ser diminuída pelo Comitê de Política Monetária (Copom) e hoje está em 16,5% – o que poderia gerar uma volatilidade muito grande da economia brasileira. “Ganha-se pouco na pressa e perde-se muito na volatilidade”, disse.
No entanto, o economista ressaltou que alguns sinais já indicam a provável melhoria do cenário econômico em 2004, como os números mais positivos da indústria registrado no final do ano. “De maneira geral, a ansiedade das pessoas, criada pelo medo de perder o emprego, vai acabar passando”, acredita.
Exportações
Apesar de um ano de estagnação econômica, as exportações brasileiras bateram um recorde histórico em 2003. Até a segunda semana de dezembro, as vendas externas do país já haviam atingido quase US$ 70 bilhões, um crescimento de mais de 20% em relação a 2003 e que resultou num saldo positivo para o Brasil de US$ 23,3 bilhões.
Castelar acredita que os principais fatores para esse desempenho foram o aumento dos preços dos produtos exportados pelo Brasil no mercado internacional, principalmente das commodities; o aumento nas vendas para dois dos principais parceiros comerciais do país, a Argentina, que começou a se recuperar de sua recente crise econômica, e a China; o câmbio favorável que predominou ainda durante a primeira metade do ano; a retração do mercado interno; e o aumento da cultura exportadora entre os empresários.
“Os empresários tiraram disso uma lição importante, de que o mercado externo dá uma estabilidade aos negócios da empresa”, afirmou o economista.
Para o ano que vem a expectativa do economista é de que as exportações continuem a crescer, porém, não nos mesmo patamares deste ano. O próprio crescimento da economia brasileira, na visão dele, vai “jogar contra” as exportações. Isso porque, de acordo com Castelar, as empresas preferem centrar fogo no mercado interno, pois podem trabalhar com margens de lucro maiores, ao passo que no exterior têm que pegar leve no preço para fazer frente aos competidores.
No entanto, ele disse que os preços das commodities principalmente deverão “continuar bons” no mercado internacional, o que joga a favor das exportações brasileiras.