São Paulo – A escritora egípcia Andrée Chedid, falecida em 2011, teve seu primeiro livro traduzido oficialmente para o português. Lançado este mês pela editora Martin Claret, “O Menino Múltiplo” (L’Enfant multiple), escrito na década de 1980, está à venda nas principais livrarias brasileiras, traduzido do francês pela brasileira Carla de Mojana di Cologna Renard.
A tradução do livro foi parte da tese de mestrado de Renard, no programa Estudos Linguísticos, Literários e Tradutológicos em Francês da Universidade de São Paulo (USP). “Conheci a Andrée Chedid por meio da obra do seu neto, Matthieu Chedid, um músico conhecido do público francês. Acabei me identificando porque também tenho origens egípcias: minha mãe e meus avós nasceram no país e se mudaram para o Brasil”, contou a tradutora à reportagem da ANBA.
Rapidamente, a jornalista formada pela Fundação Cásper Líbero que abandonou a carreira para se dedicar à tradução, mergulhou nos livros da escritora, que aborda temas sociais em um estilo literário bem ligado à poesia – até seus romances têm influência poética, segundo Renard. Ao mesmo tempo, acompanhava a obra de Matthieu Chedid, que acabou encontrando, por coincidência, durante um show que o músico francês fez em São Paulo.
“O Matthieu é muito ligado à avó. Eu estava querendo começar a fazer traduções literárias e ele me estimulou a traduzir um livro da Andrée, que ainda não tinha nenhuma obra disponível em português”, conta a tradutora.
Renard conta que, além de prazerosa, a tradução de “O Menino Múltiplo” foi um desafio, uma vez que o estilo da escritora, poético e com certa musicalidade, precisava ser mantido. “A Andrée escrevia com um dicionário ao lado, procurando palavras que dessem um ritmo ao seu texto. Procurei fazer o mesmo na versão em português, buscando a palavra certa para manter a musicalidade. Traduzir não é apenas manter o sentido, é também um ato de criação”, diz a tradutora, que aconselha ler o livro em voz alta.
A história
Segundo Renard, a escolha de “O Menino Múltiplo”, entre toda a obra da autora, se deve pelo fato de o livro ter um pouco a ver com o Brasil. O romance conta a história de Omar-Jo, filho de um pai muçulmano egípcio e uma mãe católica libanesa, falecidos durante a guerra no Líbano, em 1987, após a explosão de um carro-bomba – que também deixa o menino de doze anos sem um dos braços. A tragédia fez com que seu avô, um trovador, o levasse a Paris, onde o encontro do Oriente com o Ocidente mexe com a vida do garoto.
“Embora escrito na década de 80, o texto de Chedid se revelou bem atual. A dura realidade de muitos refugiados no atual cenário que vivemos”, conta Mayara Zucheli, assistente editorial na Editora Martin Claret.
Ela diz que o pessoal da editora ficou atônito com o fato de não existir nenhuma tradução da obra da autora, contemplada com mais de vinte prêmios literários, no Brasil. “A tradutora que entrou em contato conosco e ofereceu a sua tradução”, explica.
Poeta, romancista, novelista e dramaturga, Andrée Chedid tem origem libanesa, mas nasceu no Cairo em 1920. Aos 26 anos se mudou para a capital francesa, onde produziu mais de 40 obras no francês – idioma que aprendeu desde pequena, pois sempre estudou em escola francesa. Dois de seus romances foram adaptados ao cinema: Le sixième jour e L’autre.
A tradução de L’Enfant multiple tem 265 páginas e tiragem inicial de três mil exemplares. Está disponível em livrarias físicas e online a preço de capa de R$ 49,90.