Débora Rubin
debora.rubin@anba.com.br
São Paulo – Quando a ex-mulher, Yasmin, se mudou para Dubai com o pequeno Jeremy em 2005, Marcelo ficou um pouco sem chão. Os Emirados Árabes Unidos pareciam um destino dos mais improváveis. Mas a distância do filho, hoje com sete anos, foi o suficiente para Marcelo Cunha, um gaúcho de Porto Alegre, deixar a vida consolidada em São Paulo e um trabalho numa agência de publicidade para trás. Primeiro ele fez um teste. Foi passar férias em Dubai para sentir o território. Gostou, voltou, pediu demissão, fez a mala e se mudou para o país em janeiro de 2007.
Foi sem emprego, sem falar inglês fluente – "que é a língua mais falada por aqui" – e sem um projeto. Simplesmente foi. "O gaúcho vai embora mesmo. Essa coisa de viver perto de fronteira dá essa dimensão de amplitude, essa vontade de sair e conquistar o mundo", explica. Chegou lá com seu computador debaixo do braço, 5 kg de feijão, 5 kg de erva-mate para chimarrão e um pouco de carne-seca. Levou também seu cachorro e três gatos. Poucos meses depois começou a detectar a quantidade de coisas que poderia fazer por ali. Os 20 e tantos anos trabalhando em Recursos Humanos de grandes empresas ficaram para trás. Agora ele quer mergulhar no comércio exterior, tamanhas as possibilidades da cidade árabe sempre em obras.
"Aqui em Dubai a velocidade é outra, as coisas acontecem, os árabes sabem o que fazem. Em uma semana, a paisagem muda. Um amigo meu, engenheiro, diz que 25% das gruas do mundo estão em Dubai", contextualiza. Lá ele percebeu que existe uma enorme demanda por produtos que o Brasil pode exportar. Marcelo busca a fluência no inglês para poder ser representante de alguma empresa brasileira no país árabe. Enquanto isso não acontece, ele se comunica com muitos empresários brasileiros interessados nos Emirados. Já falou com exportadores de fruta do Nordeste, com empresas de tecnologia do Rio Grande do Sul e até com produtores de pão de queijo.
"Para você ter uma idéia de como tem espaço para crescer aqui, a Sadia, que é muito forte, volta e meia deixa de abastecer o mercado com alguns produtos. Já faz dois meses que estamos sem pão de queijo nas prateleiras dos supermercados. Ou seja, tem espaço para outras empresas também", conclui. "E nos mercadinhos pequenos, a demanda é ainda maior. Você vai ao mercado da esquina e pergunta: tem maracujá? Goiaba vermelha? E o dono do comércio, normalmente um asiático que veio tentar a vida aqui, responde: não, mas se você conseguir para mim, eu compro de você."
Entusiasmado com o universo que descobriu – e ainda está descobrindo – Marcelo resolveu criar um blog. A idéia era comunicar aos brasileiros que existe um lugar no mundo chamado Emirados Árabes Unidos, que também pode ser alcunhado como terra das oportunidades. "Pensei em fazer o blog para aproximar os brasileiros de informações sobre Dubai. Não queria falar sobre minha vida aqui, mas sobre as coisas que acontecem por aqui, ajudar a tirar um pouco o preconceito que os brasileiros no geral têm em relação aos árabes – que eu mesmo tinha", conta.
O blog "Brasileiro em Dubai, apaixonado por churrasco e chimarrão" foi criado em maio e, de lá para cá, já teve 8.880 acessos. Rastreando a origem dos visitantes, Marcelo descobriu que tem gente da África, Estados Unidos, Ásia. A grande maioria, claro, é de brasileiros – já que a maior parte do conteúdo é em português. E dos brasileiros, a maioria é de São Paulo.
"Muitos empresários já entraram em contato comigo por causa do blog. Alguns até me convidaram para ir na Big Five para conhecê-los", diz. A feira, do setor de construção, ocorreu em novembro de 2007 em Dubai. E jornalistas também contactam Marcelo via blog. "Desde que foi inaugurado o vôo da Emirates, o Brasil se voltou para cá. Senti isso até no blog, aumentou o número de visitas". No começo eram 15 acessos diários. Hoje varia entre 70 e 90.
Projeto chimarrão
Entre as muitas idéias de projeto na vida nova em Dubai, Marcelo quer levar uma de suas grandes paixões para lá: o chimarrão. Mais que importar erva-mate, a cuia e outros apetrechos, o brasileiro quer introduzir essa cultura tão gaúcha, a arte de beber chimarrão, no país – mesmo sendo um lugar quente (a bebida normalmente é servida quente). "Para alguns até refresca", garante. "Vou montar kits com as peças e com a história do chimarrão para dar para os xeques daqui", diz.
Saudades do Brasil
Marcelo sente falta do verde, de ver o filho subindo em árvores. "A cidade é linda, há flores, plantas ornamentais, tudo constantemente irrigado – mas falta verde. É deserto né?" E sente falta também da liberdade que o Brasil oferece. "E claro, da família, dos amigos…eles me acharam maluco de ter vindo."
Já a razão principal de sua mudança, o filho Jeremy, se adaptou bem à nova vida. O menino estuda numa escola internacional. Uma das razões que fez com que Yasmin – que é filha de libaneses – se mudasse para Dubai era justamente a chance de dar uma boa educação ao filho. Na escola, ele estuda com crianças da Austrália, Nova Zelândia, Estados Unidos, Índia, China, do próprio Emirados, etc, aprendendo desde cedo como é diverso o mundo em que vive. "Lidar com diferentes culturas na infância é o que te dá paz no futuro", resume o paizão coruja.