São Paulo – Izete Costa, conhecida como Dona Nena, é uma empresária que produz chocolates na Ilha do Combu, em Belém, no Pará. Diferente da maioria dos empreendedores do Brasil, Dona Nena não quer construir um império comercial, tampouco virar uma grande exportadora. Os sonhos da empresária são manter a floresta em que vive em pé e gerar renda para a comunidade que a rodeia.
“Eu quero trazer as pessoas para cá, para gastarem aqui e gerar renda dentro da comunidade”, explica ela, ao falar para um grupo de jornalistas em instalações construídas para receber visitantes, em meio à paisagem verde da ilha. “Eu dependo da floresta para crescer, então, se eu for crescer, eu vou ter que derrubar a floresta para plantar cacau, e não é esse o objetivo, o objetivo é continuar com a floresta.”

A empresa de chocolates se chama Filha do Combu Chocolates e Doces Regionais e manipula cerca de quatro toneladas de cacau por ano para produzir vários derivados, entre eles barras de chocolates que vão de 55% a 100% de cacau, brigadeiros, nibs e licores. O empreendimento conta com uma loja na ilha e outra na área urbana de Belém, e envia os produtos via postagem para todo o território brasileiro.
Na ilha, o empreendimento tem uma estrutura simples e agradável, contando com choupana para receber visitantes, loja, cafeteria, área de processamento e de fabricação dos chocolates, entre outros espaços, tudo rodeado por rio e floresta. “Hoje eu me sinto muito feliz que eu sou protagonista do meu próprio negócio e tudo aquilo que a floresta me oferece, eu consigo transformar e agregar valor”, afirma .

Mas a trajetória de Izete Costa para chegar até esse patamar foi longa e é formada por vários capítulos de insistência na floresta. Nascida na ilha, a família da paraense vivia do extrativismo, do cacau, das frutas, do peixe, do camarão e outros alimentos que o habitat natural oferecia. No período da entressafra, no entanto, era preciso buscar renda na cidade. “Precisava sair para gerar essa renda. Isso foi por muito tempo”, relata.
Já adulta, Dona Nena começou sua própria jornada para tirar o seu sustento e dos seus próximos da floresta. Uma das primeiras tentativas foi produzir biojoias, como parte de uma iniciativa coletiva local. Mas as tais biojoias não encontraram mercado. Foi participando de feiras para vender as peças na cidade, no entanto, que a paraense lembrou do hábito de fazer o próprio chocolate em casa e embalá-lo em uma folha verde.
“Nós macerávamos cacau no pilão de madeira e colocávamos açúcar, virava uma pasta e era colocada na folha fechada”, relata. Esse chocolate era ralado e consumido em datas festivas ou por visitas. “E eu resolvi levar para a feira. Na família, disseram: está ficando doida, quem vai comprar um produto na folha?”, conta, rindo. Mas o chocolate na folha despertou a memória afetiva dos consumidores e fez sucesso. E assim ela seguiu com esse chocolate até trocar o pilão por moinho manual para atender critérios sanitários.

Um contato com o chef Thiago Castanho veio com o conselho de que ela não deveria mudar seu produto, por ser de qualidade e diferente. Ele também a ensinou a fazer brigadeiro de pote. “E em cima do produto dele eu fiz o meu brigadeiro, que é o melhor brigadeiro do mundo hoje”, diz, sorrindo. E assim Nena forneceu para o chef e outros cozinheiros famosos o tal brigadeiro, o que se tornou uma vitrine para os produtos da ilha. Isso ajudou a atrair visitantes para o Combu, que presenciou o aumento do número de restaurantes locais e a formação de cooperativas de transporte para turismo.
Mas Nena ainda queria refinar seu chocolate, foi atrás disso e conseguiu. Hoje, apesar de se concentrar mais na produção dos chocolates, a empreendedora está envolvida em várias frentes de atividades, entre elas o turismo, e feliz que esses negócios mobilizem cerca de 50 pessoas. O cacau usado no chocolate vem da floresta, em meio a outras árvores, em um sistema que ela chama de agroecológico.

Dona Nena é uma empresária, mas quando fala com os interlocutores, não desfia conversa sobre faturamento ou coisas do tipo. Conta que ali usam energia solar, que fazem captação da água da chuva, relata como a maré espalha as sementes de cacau e matéria orgânica sobre a ilha em uma adubação e irrigação naturais e conta que da floresta da ilha também dá para tirar açaí, cupuaçu, pupunha, araçá e outros.
A ilha do Combu está localizada na floresta amazônica. A presença do bioma no estado do Pará motivou que Belém, a capital, fosse escolhida para ser sede da Conferência sobre Mudança do Clima das Nações Unidas (COP), que ocorre em novembro. Um dos objetivos é fazer com que os demais países conheçam a realidade da região amazônica brasileira e sua importância para o mundo.
Leia as demais matérias da série:
*A jornalista viajou a convite da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)


