Isaura Daniel, enviada especial
Mazagão (Amapá) – Quem chega no distrito de Mazagão Velho, no município amapaense de Mazagão, vai perceber, logo na entrada do vilarejo, cinco bandeiras hasteadas. A primeira é da própria cidade, a segunda do estado do Amapá e a terceira do Brasil. As outras duas são de Portugal e do Marrocos. As bandeiras foram erguidas bem em frente a um pequeno mausoléu onde está a maior prova da história centenária do local: as ossadas dos primeiros moradores.
Mazagão foi fundada a partir da transferência de uma cidade marroquina no século 18. A coroa portuguesa resolveu mandar para o Brasil os moradores da cidade, que também se chamava Mazagão, após perder o seu domínio para os mouros. O mausoléu onde estão os restos mortais dos antigos habitantes é uma réplica da primeira igreja construída no vilarejo, cujas ruínas também ficam ali, bem ao lado das cinco bandeiras guardiãs, na entrada de Mazagão Velho.
As ossadas e boa parte das ruínas da primeira igreja foram descobertas a partir de pesquisas que começaram a ser feitas há um pouco mais de dois anos pelo Laboratório de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco, com a liderança do arqueólogo Marcos Albuquerque. No começo deste ano as ossadas foram postas no mausoléu onde podem ser observadas por turistas e moradores.
Antes das pesquisas, o que havia no local onde foram encontradas as ossadas eram duas paredes erguidas. "Existia apenas duas paredes que poderiam ser qualquer coisa. A escavação arqueológica demonstrou que era uma igreja, as suas dimensões, o material e a técnica de construção, além de sepultamentos dos primeiros moradores", explica Albuquerque.
A igreja foi feita de tijolos e pedras e em todas as suas paredes, segundo as pesquisas, havia uma estrutura armada de madeira. A igreja era católica, religião praticada pelos portugueses, e os restos dos corpos foram encontrados dentro dela. Um dos esqueletos levava a Cruz de Malta. "O que denota que houve nobres na área", afirma Albuquerque. A cruz era dada pelos portugueses como condecoração a quem tinha título de nobreza.
De acordo com o pesquisador, a intenção é dar continuidade às escavações. Até porque há indícios de que ali, nos arredores da igreja, estava estabelecida a comunidade. "Falta escavar as outras unidades funcionais da vila como casas, praças, pelourinho. Temos interesse em dar continuidade a esta pesquisa pela sua importância para o entendimento de parte da história comum entre Brasil, Portugal e Marrocos", afirma Albuquerque.
O pesquisador tem, inclusive, interesse em conhecer El Jadida, no Marrocos, cidade que está hoje no lugar onde ficava a antiga Mazagão. "Para poder fazer uma comparação material com as nossas pesquisas. Acho que seria muito interessante para os dois lados." Parte da cidade de El Jadida, justamente o forte militar construído pelos portugueses no local século 16, é hoje considerada Patrimônio Cultural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Em Mazagão
A população de Mazagão Velho tem também muita vontade de ampliar os atrativos culturais do distrito para atrair turistas. Os planos do subprefeito de Mazagão Velho, Luiz Fernando Pinto, incluem, inclusive a criação de um museu para colocar objetos históricos encontrados e para o registro da história da pequena vila. As pesquisas acabaram aumentando o interesse da população pela história do seu povoado. Durante as escavações, contam os moradores, crianças e adultos cercavam os arqueólogos e seu local de trabalho para saber mais sobre novos achados.
Hoje, boa parte da população sabe contar pelo menos um pedacinho da sua história. Alguns, como o responsável pelo Departamento Cultura da Subprefeitura, Antônio José Pinto, viraram especialistas nela. Antônio costuma contar, a quem chega na cidade, as histórias que leu nos livros e ouviu dos moradores mais antigos. Quando solicitado, ele se transforma em guia para mostrar as ruínas e os vestígios dos antigos moradores.
As pesquisas arqueológicas foram realizadas pelo Laboratório de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco a pedido do governo do Amapá, que as financiou. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) autorizou e acompanhou as descobertas em Mazagão Velho.

