São Paulo – A escassez de referências femininas no mundo dos negócios fez surgir o projeto do documentário The Girls on The Road, com o intuito de contar histórias e trazer modelos femininos de sucesso para incentivar outras mulheres a empreender. A proposta das brasileiras Fernanda Moura e Taciana Mello foi viajar os cinco continentes em pouco mais de um ano, passando por 24 países, sendo três árabes, e entrevistando cerca de 300 mulheres empreendedoras e mais de 20 organizações de fomento ao empreendedorismo.
“Nosso foco foram empresas com cerca de quatro a cinco anos de existência, fundadas por mulheres de todas as idades, de diferentes indústrias e faturamentos diversos”, contaram. Elas enfatizaram a importância de mostrar mulheres começando a crescer em seus negócios, para expor a viabilidade. Além desses critérios, existiu também a barreira do idioma, que permitiu que elas entrevistassem apenas pessoas que falassem inglês, espanhol ou português.
A dupla percebeu que as mulheres no mundo empresarial enfrentam praticamente os mesmos problemas em todo o mundo, em maior ou menor grau. “Ainda há muito machismo nesses espaços, mas não é impeditivo para as mulheres conquistarem seu lugar”, disseram. Elas reafirmaram a importância de mais de 50% da população ser incentivada a empreender como uma solução para alavancar a economia mundial.
O que mais chamou a atenção de Moura e Mello em países árabes foi perceber a vontade das empreendedoras de servir à sua comunidade e de focar os produtos e serviços para o mundo árabe, no idioma árabe, não só por patriotismo e senso de comunidade, mas também por ser um mercado em ascensão com uma grande demanda. Elas visitaram a Jordânia, o Líbano e a Palestina, e contaram algumas das histórias que mais marcaram sua passagem por lá.
As fundadoras do projeto disseram que conversar com as mulheres de Gaza foi importante para quebrar preconceitos e estereótipos porque “quando você pensa em Faixa de Gaza, o que vem é terrorismo, guerra, miséria”. “Sem dúvida, elas sabem que isso existe e é uma realidade que elas enfrentam, mas elas não ficam pensando nisso nem se deixam consumir por isso.” O que a dupla encontrou foram mulheres extremamente de bem com a vida, bem formadas, engenheiras e empresárias, com foco empreendedor e sempre pensando em maneiras de melhorar não só a própria vida, mas a vida da comunidade em que vivem.
Por haver restrições de trânsito no território, a região acaba atraindo a atenção de grandes empresas que querem ajudar e dar oportunidades aos empreendedores locais. Com isso, as empreendedoras de Gaza dizem que acabam tendo talvez mais oportunidades que se estivessem em outros lugares. Elas já foram convidadas a fazer cursos, intercâmbios e também a apresentar suas empresas nos Estados Unidos e na Europa.
Por uma questão de agenda, Fernanda e Taciana não conseguiram permissão a tempo para entrar na Faixa de Gaza, então abriram a única exceção do projeto para entrevistar seis empreendedoras da região por Skype. “Nós achamos importante escutar essas mulheres, e fez sentido fazer as entrevistas online por haver essa restrição.”
Nour El-Khoudary era apenas uma mãe de primeira viagem que foi morar nos Estados Unidos com o marido e lançou um blog para dividir suas experiências. Vendo o sucesso da página, ela descobriu que havia uma demanda por conteúdos femininos em árabe. Foi aí que ela fundou o MomyHelper, um portal de consultoria e bem-estar que hoje conta com 40 consultores.
Para as fundadoras, uma das histórias mais importantes do projeto foi a de Amani Tair, uma jovem engenheira árabe muçulmana que elas conheceram em Jerusalém. Amani criou um equipamento para crianças deficientes visuais aprenderem árabe em braile. Ela afirmou que os impeditivos das mulheres no mercado de trabalho não são religiosos, mas culturais. Hoje ela administra sua plataforma digital educativa, Wazza, entre outros projetos.
Na Jordânia, elas viram um ambiente empreendedor em crescimento. A população de lá ainda tem o sonho de trabalhar para o governo, mas como não há cargos para todos, o governo começou a incentivar pequenas e médias empresas. Lá, elas conversaram com Eman Hylooz, fundadora do site Abjjad, uma rede social para amantes da leitura, entre outras empreendedoras.
No Líbano, Fernanda e Taciana encontraram empresas focadas no mundo árabe, mas com um viés ocidental. Mais liberal e diverso, o povo libanês tem perfil de empreendedor. Todo mundo quer ter seu próprio negócio. A libanesa Priscilla Elora fundou o Myki, um site de segurança da informação que está se expandindo para vários países.
História
Fernanda Moura e Taciana Mello moravam havia quatro anos nos Estados Unidos quando, em julho de 2016, iniciaram o projeto The Girls on The Road. A ideia do projeto veio da observação sobre a escassez de mulheres fundadoras de empresas no Vale do Silício. “Tudo começou de uma curiosidade que acabou virando uma paixão pelo tema”, disse Fernanda. À medida que as paulistanas pesquisavam, diversos estudos apontavam que uma das principais razões para existir essa disparidade entre homens e mulheres é a falta de modelos e referências femininas no empreendedorismo. “Ainda hoje, existe a ideia de que o empreendedorismo é algo masculino”, completou Taciana.
Fernanda é advogada e administradora, e Taciana, formada em Comunicação e Marketing. Com o histórico de negócios, foi natural que o projeto fosse voltado para esse foco. “Nosso objetivo é contar essas histórias para impactar, para que as mulheres se sintam confiantes para dar o primeiro passo”, disse Taciana.
A dupla estava em Ruanda no momento da entrevista. Esse é o último país visitado. Depois, vão para Portugal, para começar a editar o documentário entre Lisboa e São Paulo, onde também pretendem buscar patrocínio para o projeto, até então financiado por elas. O lançamento do filme está previsto para abril de 2018.
Para saber mais, acesse o site do projeto: www.thegirlsontheroad.com