São Paulo – O que é goma arábica? De onde vem? Para que serve? Provavelmente o leitor já deve ter se deparado com este nome na lista de ingredientes de algum alimento ou bebida industrializada. A ANBA entrevistou o encarregado de negócios do Sudão em Brasília, Mohammed Elrashed Sidahmed Mohammed, e o gerente de Segmento – Hidrocolóides e Systems da empresa de ingredientes Vogler, Daniel Zóia, para explicar sobre a goma e suas aplicações. O Sudão é o maior produtor de goma arábica do mundo.
O produto, também chamado de goma acácia, é uma resina exsudada dos troncos e galhos das árvores Acácia senegal e Acácia seyal. Mohammed disse que são chamadas lágrimas de ouro ou lágrimas de sangue das árvores, uma seiva que quando endurece, se torna a goma arábica em seu estado bruto. Uma árvore Acácia começa a produzir a goma cerca de cinco anos após ser plantada e segue produzindo por 10 anos.
Aproximadamente 60% da goma arábica do mundo é produzida no Sudão, segundo Mohammed. Ela não existe em nenhum outro lugar do mundo a não ser ali, no chamado Cinturão da Goma, região de savanas áridas que abrangem também Mauritânia, Senegal, Eritreia, Somália, Quênia e Tanzânia, e em menor quantidade, no Sul da Ásia e na Península Arábica. Os principais exportadores são, além do Sudão, Chade, Nigéria, Senegal e Etiópia.
“O Sudão produzia cerca de 80% da goma arábica no mundo, mas agora é cerca de 60%, porque há muito tráfico nas fronteiras. Os produtores sudaneses levam a goma para os países vizinhos como Nigéria, Senegal e Eritreia, para ganhar mais por ela”, contou Mohammed. Cerca de um quinto do território do Sudão é de plantação de Acácia, uma área de 520 mil quilômetros quadrados.
O diplomata declarou que todos os países produtores de goma vêm enfrentando guerra civil e instabilidade política e econômica, o que afeta tanto a produção da goma quanto o preço no mercado internacional. “Um novo governo será estruturado nos próximos meses e será apontado um novo primeiro-ministro, e com isso esperamos ter maior estabilidade no país”, disse.
As exportações da goma in natura do Sudão geralmente vão para empresas na França e Alemanha, que processam e revendem a goma arábica em pó para o mundo todo. De acordo com informações da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), a França sozinha exporta cerca de dois terços de toda a goma arábica processada. A Nexira, fabricante francesa de ingredientes naturais para a indústria de alimentos, detém cerca de 50% do mercado global de produtos de goma arábica processados.
A goma é usada principalmente na indústria de alimentos, bebidas e fármacos, entre outras aplicações. “De acordo com estudos recentes, vão usar em cosméticos naturais com bons resultados”, disse Mohammed. A goma arábica contém fibras, o que ajuda a diminuir o colesterol e a emagrecer e melhora a imunidade, segundo o diplomata.
Ano passado, o Sudão produziu cerca de 500 mil toneladas de goma arábica. Segundo o encarregado de negócios, as árvores Acácia, que produzem a goma, ajudam a preservar o bioma da região. “Se melhorarmos nossa produção vai ter mais gente plantando e assim, vai preservar e reduzir a desertificação”, disse. Cerca de 15% das exportações do Sudão são de goma. Outros produtos exportados são ouro, algodão, cítricos e alimentos, disse Mohammed.
O diplomata sugeriu um intercâmbio com o Brasil para ampliar os estudos sobre a goma arábica e como transformá-la em um produto com valor agregado. “Precisamos de mais investimentos nessa área, para promover e encorajar o comércio direto da goma para o Brasil e outros países”, disse.
Aplicações
Segundo o especialista em hidrocolóides (gomas), Daniel Zóia, na indústria há gomas extraídas de seivas de árvores, como a arábica, e também do milho (glucose de milho), de sementes (goma guar) e de algas (agar agar).
“A goma arábica é dividida em dois grupos, o tipo seyal e o senegal. “As principais aplicações da goma tipo seyal são para fonte de fibras, em produtos naturais; também é usada para secar a barrinha de cereal e evitar que ela fique melada; para secar aromas em pó, na indústria, e a quarta aplicação é para drageados, para fazer uma capa numa bala ou chocolate, como M&Ms, por exemplo (goma e corante)”, disse Zóia. A goma arábica tipo seyal, segundo o especialista, pode ser substituída por amido modificado.
Já a principal aplicação da goma exsudada da Acácia senegal é um emulsificante que serve para aromas líquidos, para aromatizar bebidas, como a Coca-Cola. O aroma, na indústria de alimentos, é o que dá sabor aos produtos. “Um aroma pode ser parte oleoso e parte aquoso, e para juntar a água com o óleo, se utiliza a goma arábica tipo senegal, para estabilizar esse aroma líquido, como um emulsificante”, disse. Todo tipo de refrigerante, bebida com sabor, sucos industrializados e bebidas de soja podem utilizar a goma arábica senegal.
Um substituto para a goma nesse caso pode ser amido modificado ou amidos especiais. “A goma e o amido são inodoros, a substituição não deve interferir no produto final, se utilizarem as dosagens corretas. E o amido vem de uma fonte renovável”, disse.
A goma mais utilizada na indústria de alimentos do Brasil, de acordo com Zóia, é de longe o amido. “A segunda é a gelatina, fonte animal, de couro de boi, principalmente; em terceiro lugar, a goma guar e a goma xantana, importadas, e depois vêm as demais”, disse.
Zóia contou que neste momento está difícil conseguir importar a goma arábica seyal. “Compramos de um player alemão, e meu fornecedor disse que segue a crise política na região, então falta produto, safra, e não tem previsão de normalizar”, disse. A Vogler, onde ele trabalha, tem um portfólio de 730 ingredientes para a indústria alimentícia.