Alexandre Rocha
São Paulo – O governo brasileiro vai ficar de olho para ver se a Lei do Bioterrorismo norte-americana, que entrará em vigor em 12 de dezembro, não vai se transformar em mais uma barreira comercial aos produtos estrangeiros nos Estados Unidos. Foi o que garantiu o secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Mário Mugnaini Jr., em entrevista à ANBA por e-mail.
“A aplicação dessa lei resulta, de fato, da preocupação do governo norte-americano com possíveis atentados químicos ou bioquímicos, na seqüência dos atentados de 11 de setembro. Mas iremos ficar atentos à forma como tal legislação será aplica na prática, para que ela não se torne uma barreira comercial”, afirmou ele.
O “Bioterrorism Act” foi sancionado pelo presidente George W. Bush em junho do ano passado, porém sua regulamentação só foi divulgada no dia 12 deste mês. Agora os empresários brasileiros que exportam alimentos destinados ao consumo humano e medicamentos para os Estados Unidos têm somente pouco mais de um mês para se enquadrarem nas novas regras.
De acordo com informações do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, as empresas brasileiras exportadoras têm até 12 de dezembro para se registrar na Food and Drug Administration (FDA), órgão americano que fiscaliza os setores de alimentos e remédios.
Segundo o ministério, tal registro pode ser feito por meio do site da FDA na internet (www.fda.gov), por correio ou fax. Estão obrigados a se registrar o produtor, ou embalador, armazenador, ou trader que “incorpore alguma substância à mercadoria ou a embale de maneira a adulterar o alimento”. Além disso, os exportadores terão de contratar um agente representante residente nos Estados Unidos, que será o responsável pelas mercadorias.
Mugnaini acha que a necessidade de contratação de tal agente, principalmente, poderá acarretar prejuízos para as exportações brasileiras. “A nomeação do agente acarretará um custo que talvez não seja suportado por algumas empresas, principalmente as pequenas”, declarou ele. A FDA estima que os serviços de um representante devem custar cerca de US$ 700 ao ano.
De acordo com a própria FDA, 16% das empresas do mundo que vendem para os EUA deverão abandonar os negócios com o país por causa da nova lei.
O exportador também terá de avisar com antecedência à FDA sobre a chegada dos produtos. Sempre segundo o ministério, o prazo desse aviso varia de acordo com o meio de transporte. No caso de transporte marítimo, por exemplo, ele deverá chegar oito horas antes do navio.
Caso as regras não sejam seguidas o governo americano poderá reter as mercadorias até a regularização da situação e até armazená-las em “locais seguros”, e os custos de remoção e armazenagem serão cobrados do exportador.
Mugnaini disse que a Camex tem divulgado o assunto em seminários, palestras e entrevistas e no site do ministério (www.desenvolvimento.gov.br) foi colocada a regulamentação da lei e um resumo explicativo. De acordo com ele, o governo americano decidiu fazer com que a norma seja provisória abrindo espaços para sugestões. “A embaixada do Brasil em Washington está estudando conosco a lei e irá enviar eventuais sugestões”, declarou.
Apesar do receio de que a lei possa transformar-se em uma barreira comercial, o secretário-executivo da Camex disse que o Brasil não pretende aplicar nenhum tipo de retaliação.
Segundo o ministério, o Brasil exportou para os Estados Unidos US$ 12,5 bilhões entre janeiro e setembro deste ano, sendo US$ 1 bilhão em produtos alimentícios. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos venderam ao Brasil o equivalente a US$ 6,8 bilhões. Segue a entrevista concedida por Mugnaini:
ANBA – A Camex já está orientando os exportadores brasileiros sobre como agir frente a essa nova regra? De que forma isso é feito?
Mário Mugnaini Jr. – Sim, estamos divulgando por meio de participação em seminários, palestras e entrevistas à imprensa quais são as preocupações que os exportadores brasileiros devem ter. Também colocamos no nosso site a regulamentação da lei do Bioterrorismo elaborada pelo Food and Drug Administration (FDA) e um resumo explicativo. Os exportadores de alimentos e medicamentos para os Estados Unidos devem, até o dia 12 de dezembro, registrar a sua empresa no site do FDA. No preenchimento do formulário, já devem indicar um agente comercial que será responsável pelas mercadorias que entrarem no território americano. Além disso, os exportadores deverão enviar avisos prévios ao FDA prevenindo-os sobre os embarques das mercadorias.
Qual a avaliação que o governo brasileiro faz da medida? Trata-se realmente de uma precaução contra o bioterrorismo, ou é apenas mais uma barreira comercial disfarçada?
A aplicação dessa lei resulta, de fato, da preocupação do governo norte-americano com possíveis atentados químicos ou bioquímicos, na seqüência dos atentados de 11 de setembro. Mas, iremos ficar atentos à forma como tal legislação será aplicada na prática para que ela não se torne uma barreira comercial. Legalmente, os Estados Unidos podem alegar que se encontram amparados por uma cláusula da Organização Mundial do Comércio (OMC) que permite aos países adotar medidas especiais, restritivas do comércio, nos casos de ameaças de ataques, de terrorismo e de risco à saúde humana. Com isso, fica difícil caracterizarmos a norma como uma barreira comercial.
Nesta lei há a necessidade de contratação de um agente comercial nos EUA. Pode ser que intenção do governo norte-americano seja matar dois coelhos com uma paulada só? Aumenta-se a fiscalização e criam-se mais empregos internamente?
A intenção da lei com a obrigatoriedade de nomeação de um agente é ter uma pessoa disponível para, em pouco tempo, prestar esclarecimentos sobre mercadorias consideradas suspeitas.
Qual a porcentagem de exportadores brasileiros que têm representantes nos EUA?
Não dispomos dessa informação.
Já há algum tipo de avaliação do quanto isso pode prejudicar as exportações brasileiras, em termos de atrasos e prejuízos financeiros?
Não deve haver atraso nos embarques, porque as empresas só poderão embarcar alimentos e medicamentos para os EUA se já estiverem com as adaptações feitas, ou seja, com o registro no site, a nomeação do agente e o envio do aviso prévio. O esforço deve ser feito nesse momento para uma adequada compreensão das regras e das adaptações necessárias de forma a que as empresas embarquem normalmente seus produtos.
Nós, da Camex, estamos disponíveis para colaborar no esclarecimento das questões necessárias para uma rápida adaptação das empresas, de modo a não se perder o lugar já conquistado no mercado norte-americano. A nomeação do agente, no entanto, acarretará um custo que talvez não seja suportado por algumas empresas, principalmente as pequenas. Segundo o FDA, a contratação do agente deve ficar em cerca de U$ 700 por ano. Para as pequenas empresas, há a possibilidade de nomeação de apenas um agente para um consórcio de empresas exportadoras.
O governo brasileiro está tratando do assunto com autoridades norte-americanas, no sentido de tentar amenizar os efeitos dessa regulamentação?
Na regulamentação da norma, feita em 12 de outubro, o governo americano decidiu torná-la provisória, abrindo espaço para haver mais tempo para as adaptações das empresas e para os envolvidos enviarem sugestões de mudanças. A Embaixada do Brasil em Washington está estudando conosco a lei e irá enviar eventuais sugestões.
O Brasil planeja algum tipo de retaliação, colocando barreiras semelhantes aos produtos norte-americanos?
Não planejamos nenhum tipo de retaliação. Toda a entrada de mercadorias em nosso país continuará seguindo as exigências das normas atuais.