Alexandre Rocha
São Paulo – Já está definido o roteiro da viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos países árabes, que ocorrerá entre os dias 3 e 10 de dezembro. As nações visitadas serão, nesta ordem: Síria, Líbano, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Líbia, segundo confirmou à ANBA o chefe do departamento do Oriente Próximo do Itamaraty, e um dos organizadores da missão, ministro Sarkis Karmirian. O ministro visitou na sexta-feira (24) a sede da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira (CCAB) e a redação da agência em São Paulo.
O cronograma foi fechado na última semana. Lula será o primeiro presidente brasileiro eleito a visitar os países árabes no exercício do mandato.
De acordo com o diplomata, foram adotados critérios diferenciados para decidir quais países fariam parte do programa, já que seria impossível visitar todos. Ao todo, 22 países da África e do Oriente Médio fazem parte da Liga Árabe.
O Líbano e a Síria são as duas nações da região com as quais o Brasil tem as relações mais tradicionais, já que a grande maioria dos imigrantes árabes que vieram para cá é originária desses dois países. “O Brasil tem relações diplomáticas tradicionais com o Líbano e a Síria há muito tempo. Existem relações estreitas com os povos destes dois países”, afirmou Karmirian.
Já a Arábia Saudita e os Emirados Árabes foram escolhidos porque são considerados os mais importantes parceiros em potencial, principalmente na área comercial. “Para a escolha desse dois países foi adotado o critério da cooperação, o foco principal será o fortalecimento da cooperação entre o Brasil e os países do Golfo Arábico”, disse Karmirian.
Arábia Saudita e Emirados são os principais mercados dos produtos brasileiros na região. Entre janeiro e setembro deste ano o Brasil exportou para Arábia Saudita US$ 447,4 milhões, sendo que as principais mercadorias vendidas foram: frango, bagaços e outros resíduos sólidos da extração do óleo de soja, minério de ferro aglomerado e seus concentrados e açúcar. Ao passo que importou US$ 679,8 milhões. Os principais itens das compras brasileiras foram petróleo, óleo diesel, querosene de aviação, enxofre e resinas “epoxidas”.
Para os Emirados, o Brasil vendeu entre janeiro e setembro US$ 364,1 milhões, sendo que os principais produtos embarcados foram: petróleo (sim, o Brasil exporta petróleo para o Oriente Médio!), açúcar, frango, pedaços de frango e óleo de soja refinado.
Já as importações ficaram em US$ 1,3 milhão, sendo que os principais itens comprados foram acumuladores elétricos, uvas secas, rolamentos, cadeados de metal e sobretudos impermeáveis de fibra sintética.
Além do intercâmbio comercial, interessa ao Brasil atrair investimentos dos países árabes. A Arábia Saudita, em especial, pode ser uma das fontes desses recursos. Tanto isso é verdade que a estatal do petróleo Saudi Aramco – uma das cinco maiores companhias do setor no mundo – protocolou recentemente carta de intenções, junto ao Ministério das Minas e Energia, manifestando interesse em investir na construção de uma nova refinaria de petróleo no país, provavelmente no Nordeste.
A empresa estaria disposta a aplicar US$ 1,4 bilhão, 70% o valor total do empreendimento, estimado e US$ 2 bilhões.
Durante a missão também deverão ser fechados acordos. Na Arábia Saudita, por exemplo, deverá ser assinado um “acordo quadro de cooperação” que servirá de base para futuros convênios pontuais.
“A proposta do Brasil já foi finalizada e submetida ao governo saudita, existem muitas chances dele ser assinado durante a visita”, declarou o Karmirian. “Tal acordo estabelece disposições gerais para futuros entendimentos e vai facilitá-los. Antes de comprar o carro é preciso construir a garagem”, completou.
A passagem pelos países árabes deve se restringir às capitais, a exceção dos Emirados, onde Lula vai passar por Abu Dhabi, a capital, e Dubai, que é o centro comercial do país.
O Egito, por sua vez, entrou na lista, segundo Karmirian, por sua importância estratégica na região. Trata-se do país mais populoso do mundo árabe (70,7 milhões de habitantes), onde exerce forte influência política.
“O Egito tem uma projeção política importante. É um país chave na região e desempenha um papel muito relevante inclusive em conflitos como os da Palestina”, afirmou o diplomata.
A passagem pela Líbia, por fim, foi uma escolha pessoal do presidente Lula, de acordo com Karmirian. “A Líbia será a última etapa, já na fase de retorno ao Brasil, e foi incluída por conta da vontade do presidente de parar em Trípoli, pois ele tem relações amigáveis com o coronel (Muammar) Kadafi (chefe de estado) e disse que gostaria de vê-lo, e a comitiva vai voltar por ali mesmo”, declarou.
Ele disse, porém, que a Líbia é um “bom parceiro” comercial do Brasil e acredita que a passagem pelo país ajudará no incremento das relações com o Norte da África. “A visita só soma”, afirmou.
Expectativas
Apesar de o roteiro já ter sido estabelecido, ainda faltam fechar a agenda de compromissos e a comitiva que vai acompanhar o presidente. Karmirian disse, porém, que isto só será feito após a viagem de Lula à África em novembro.
“Serão atividades complexas, protocolares, culturais e comerciais. Acho que ao lado dos compromissos protocolares, a maioria dos eventos terá natureza comercial, como seminários de investimentos e sobre exportações, além de exposições de produtos brasileiros”, adiantou o diplomata. Segundo ele, há “muita expectativa” em torno dos negócios que a missão poderá alavancar.
Já estão confirmados como integrantes da comitiva ministros cujas pastas têm alguma ligação com as relações entre o Brasil e os árabes, caso de Celso Amorim (Relações Exteriores), de Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) e de Dilma Rousseff (Minas e Energia).
Fatores de aproximação
Karmirian disse que dois fatores contribuem para que o Brasil consiga promover uma maior aproximação dos países árabes. Em primeiro lugar a “empatia” que existe entre os dois povos.
“Empatia essa que existe não apenas por causa de questões culturais, mas também em cima de aspectos práticos. Os brasileiros descendentes de árabes têm familiares na região. Além disso, há a importância da imigração e sua contribuição para o Brasil”, ressaltou ele.
Em segundo lugar, o diplomata acredita que a posição brasileira frente aos conflitos que ocorrem no Oriente Médio, principalmente na Palestina, faz com que o país seja respeitado pelos dois lados da disputa.
“Este é um fator que se coloca com mais nitidez, a posição do Brasil, a clareza da posição política do país em relação aos problemas do mundo árabe. Trata-se de um posicionamento equilibrado, isento em prol da autodeterminação dos povos”, declarou ele.
O representante do Itamaraty acha que com o “adensamento” das relações entre o Brasil e os países árabes haverá um “salto de qualidade” nos intercâmbios econômicos.
“Acredito em um aumento da cooperação em vários níveis, na área política, econômica, comercial, científica, tecnológica, educacional e cultural”, ressaltou o diplomata. “Existem vários segmentos e ainda há muita coisa em aberto”, completou.
Cúpula confirmada
Além da missão presidencial à região, Karmirian disse que a reunião de cúpula entre os chefes de estado da América do Sul e dos países árabes, idealizada recentemente pelo governo brasileiro, vai contribuir para o incremento dessa cooperação.
Ele confirmou que tal evento vai mesmo ocorrer no próximo ano. “Ela (a reunião de cúpula) está absolutamente certa. O presidente Lula enviou cartas para todos os chefes de estado dos países árabes e da América do Sul, 34 ao todo, se eu não engano, e todos se mostraram de acordo, gostaram da idéia. Agora estamos negociando uma data. Será uma megaoperação”, disse.
Segundo ele, trata-se de uma iniciativa pioneira. “Nunca representantes das duas regiões se encontraram assim”, afirmou.
Tanto a viagem presidencial, quanto a reunião de cúpula, fazem parte da estratégia do governo Lula de aproximar o Brasil dos demais países em desenvolvimento e abrir mercados alternativos. “O presidente tem três prioridades na área de relações internacionais: A América do Sul, a África e os países árabes”, concluiu Karmirian.
Veja abaixo os perfis dos países que serão visitados por Lula:
Arábia Saudita*
Nome oficial: Reino da Arábia Saudita
Capital: Riad
Chefe de estado: Rei Fahd bin Abdel-Aziz Al-Saud
Moeda: Riyal Saudita (SAR)
População: 21,7 milhões
Área: 2.250.000 km2
Idioma: árabe (oficial) e inglês (comercial)
PIB: US$ 186,5 bilhões
Principais indústrias: petrolífera, petroquímica, aço, cimento e alimentícia
Intercâmbio comercial com o Brasil entre janeiro e setembro de 2003:**
Exportações brasileiras: US$ 447,4 milhões
Importações: US$ 679,8 milhões
Egito*
Nome oficial: República Árabe do Egito
Capital: Cairo
Chefe de estado: presidente Hosni Mubarak
Chefe de governo: Atef Mohamed Mohamed Ebeid
Moeda: Libra Egípcia
População: 70,7 milhões
Área: 997.739 km2
Idioma: árabe (oficial) e inglês (comercial)
PIB: US$ 82,1 bilhões
Principais indústrias: petroquímica, alimentícia e têxtil
Intercâmbio comercial com o Brasil entre janeiro e setembro de 2003:**
Exportações brasileiras: US$ 322,9 milhões
Importações: US$ 28 milhões
Emirados Árabes Unidos*
Nome oficial: idem
Capital: Abu Dhabi
Chefe de estado: Shaik Zayed bin Sultan Al Nahayan
Chefe de governo: Shaikh Maktum bin Rachid Al Maktum
Moeda: Dirham (DH)
População: 3,8 milhões
Área: 83.600 km2
Idioma: árabe (oficial) e inglês (comercial)
PIB: US$ 70,2 bilhões
Principais indústrias: petrolífera, alumínio, alimentos e turismo
Intercâmbio comercial com o Brasil entre janeiro e setembro de 2003:**
Exportações brasileiras: US$ 364,1 milhões
Importações: 1,3 milhão
Líbano*
Nome oficial: República do Líbano
Capital: Beirute
Chefe de estado: presidente Emile Lahoud
Chefe de governo: Rafik Hariri
Moeda: Libra Libanesa
População: 3,6 milhões
Área: 10.452 km2
Idioma: árabe (oficial), francês e inglês (comercial)
PIB: US$ 17 bilhões
Principais indústrias: alimentícia, química e têxtil
Intercâmbio comercial com o Brasil entre janeiro e setembro de 2003:**
Exportações brasileiras: US$ 38,5 milhões
Importações: US$ 2,6 milhões
Líbia*
Nome oficial: Grande Jamahiriya Árabe Socialista Popular da Líbia
Capital: Trípoli
Chefe de estado: coronel Muammar Kadafi
Moeda: Dinar Líbio (DIR)
População: 5,6 milhões
Área: 1.760.000 Km2
Idioma: árabe (oficial) e inglês (comercial)
PIB: US$ 14,2 bilhões
Principais indústrias: petrolífera, cimento e têxtil
Intercâmbio comercial com o Brasil entre janeiro e setembro de 2003:**
Exportações brasileiras: US$ 44 milhões
Importações: US$ 26 milhões
Síria*
Nome oficial: República Árabe da Síria
Capital: Damasco
Chefe de estado: presidente Bashar Al-Assad
Chefe de governo: Muhammad Mustafá Miro
Moeda: Libra Síria (SYP)
População: 17,1 milhões
Área: 185.180 km2
Idioma: árabe (oficial) e inglês (comercial)
Principais indústrias: petrolífera, alimentícia e têxtil
Intercâmbio comercial com o Brasil entre janeiro e setembro de 2003:**
Exportações brasileiras: US$ 28 milhões
Importações: US$ 9,4 milhões
* Dados de 2002, fonte CCAB
** Fonte: Secretaria de Comércio Exterior (Secex)