Dubai – “O planeta está farto de acordos climáticos não cumpridos, de metas de redução de emissão de carbono negligenciadas, do auxílio financeiro aos países pobres que não chega, de discursos eloquentes e vazios. Precisamos de atitudes concretas”, criticou o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, em suas falas na abertura da Conferência das Nações Unidas para Mudança do Clima (COP28) e na primeira sessão do segmento de Alto Nível para Chefes de Estado e Governo da COP28, em Dubai, nesta sexta-feira (01).
“Em vez de unir forças, o mundo trava guerras, alimenta divisões e aprofunda a pobreza e as desigualdades”, disse Lula. Ele indagou quantos líderes mundiais estão de fato comprometidos em salvar o planeta, sendo que somente no ano passado, o mundo gastou mais de US$ 2 trilhões em armas.
“É inaceitável que a promessa de US$ 100 bilhões por ano assumida pelos países desenvolvidos não saia do papel enquanto, só em 2021, os gastos militares chegaram a US$ 2,22 trilhões. (…) Quantia que poderia ser investida no combate à fome e no enfrentamento da mudança climática”, disse.
Lula disse que o 1% mais rico do planeta emite o mesmo volume de carbono que 66% da população mundial. O presidente ainda questionou o impacto climático de conflitos e a injustiça das guerras.
“Quantas toneladas de carbono são emitidas pelos mísseis que cruzam o céu e desabam sobre civis inocentes, sobretudo crianças e mulheres famintas? A conta da mudança climática não é a mesma para todos. E chegou primeiro para as populações mais pobres”, declarou.
Lula mencionou a trágica seca na Amazônia e as tempestades e ciclones que deixaram um rastro de destruição na região Sul do País. “2023 já é o ano mais quente dos últimos 125 mil anos. A humanidade sofre com secas, enchentes e ondas de calor cada vez mais extremas e frequentes. (…) A ciência e a realidade nos mostram que desta vez a conta chegou antes. O planeta já não espera para cobrar da próxima geração”, falou.
Vulnerabilidades
O presidente disse que “o mundo naturalizou disparidades inaceitáveis de renda, gênero e raça”, e que não é possível enfrentar as mudanças climáticas sem combater a desigualdade.
“Quem passa fome tem sua existência aprisionada na dor do presente. E torna-se incapaz de pensar no amanhã”. Para ele, a redução das vulnerabilidades socioeconômicas significa construir resiliência frente a eventos extremos. “Significa também ter condições de redirecionar esforços para a luta contra o aquecimento global”, disse.
“Os mais vulneráveis não podem ter que escolher entre combater a mudança do clima e combater a pobreza. Terão que fazer ambos. O princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, é inegociável. Ameaçá-lo vai na contramão de qualquer noção básica de justiça climática. Essa noção demanda que sejam cumpridas as obrigações de financiamento, de transferência de tecnologia”, disse Lula.
Lula comparou o momento atual com aquele em que participou da COP15 em Copenhagen, em 2009, quando foi necessário um grande esforço para chegar ao Acordo de Paris, em 2015. “Ao retornar à presidência do Brasil, constato que estamos, hoje, em situação semelhante. O não cumprimento dos compromissos assumidos corrói a credibilidade do regime”, disse.
Multilateralismo
Voltando a criticar os países do Norte Global, Lula afirmou que é preciso resgatar a crença no multilateralismo. “É inexplicável que a ONU, apesar de seus esforços, se mostre incapaz de manter a paz, simplesmente porque alguns dos seus membros lucram com a guerra. É lamentável que acordos como o Protocolo de Kyoto (1997) ou os Acordos de Paris (2015) não sejam implementados”, disse.
O mandatário brasileiro falou que os governantes não podem se eximir de suas responsabilidades e que nenhum país resolverá seus problemas sozinho. “Estamos todos obrigados a atuar juntos além de nossas fronteiras”, disse.
Fundo para perdas e danos
Além de Lula, falaram na abertura o presidente dos Emirados Árabes Unidos, Mohammed bin Zayed Al Nahyan, e o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, que parabenizou o início da COP28 por ter começado nesta quinta (30) com o anúncio de um acordo histórico de investimentos para apoiar países mais afetados pela crise climática, que somou US$ 420 milhões. A União Europeia contribuirá com US$ 246 milhões; os Emirados Árabes Unidos com US$ 100 milhões, e os Estados Unidos com US$ 17,5 milhões, entre outros países que irão colaborar. Os valores, no entanto, foram considerados tímidos.
O rei Charles, do Reino Unido, falou antes de Lula, e após o presidente do Brasil, falou a brasileira Isabel Prestes da Fonseca, liderança indígena do povo munduruku e cofundadora e diretora ambiental do Instituto Zag, dedicado ao reflorestamento.
Opep+
Nesta quinta-feira (30) foi divulgado um convite para o Brasil participar da Opep+, grupo de países produtores de petróleo. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, declarou que o convite está em análise e que a decisão final é do presidente Lula. Cogitando essa possibilidade, Silveira disse que o objetivo do Brasil será discutir a posição dos países produtores de petróleo nesta fase de transição energética no mundo. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, afirmou à imprensa que o Brasil participaria como observador.