Sharm El Sheikh – O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva falou por telefone com o presidente do Egito, Abdel Fattah El-Sisi, e convidou a autoridade egípcia a visitar o Brasil, contou o embaixador do Brasil no Egito, Antonio Patriota (foto acima), em entrevista à ANBA no último dia da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, a COP27, sediada no balneário de Sharm El Sheikh, na Península do Sinai, no Mar Vermelho.
Patriota contou que El-Sisi aceitou o convite, mas ainda não se sabe se ele irá para a posse de Lula, em 1º de janeiro de 2023, ou em algum outro momento. Os presidentes devem estreitar as relações bilaterais entre os dois países em diversos setores, disse Patriota. Na conversa, o presidente egípcio também propôs um voo direto entre Cairo e São Paulo, pela companhia aérea EgyptAir, em um futuro próximo. Patriota disse ainda que não há concorrência para a COP30 no Brasil. Lula propôs a realização da conferência de 2025 em algum estado da região amazônica.
“O presidente eleito ficou muito agradecido com o convite especial do país anfitrião para participar da conferência – não foi uma visita bilateral, foi para o evento – e nessa condição foi dada uma atenção diferenciada. O presidente eleito telefonou para o presidente El-Sisi para agradecer e para convidá-lo a visitar o Brasil, reconhecendo a importância do Egito como maior parceiro comercial na África, e um dos maiores entre os árabes”, disse o embaixador.
O Egito tem acordo de livre comércio com o Mercosul e pode ser um futuro parceiro em diversas outras áreas, segundo Patriota. “A ideia é transformar esse relacionamento em uma parceria estratégica. Há muito que nos aproxima. […] Historicamente, temos cooperado e nos consultado de maneira muito eficaz no sistema multilateral e isso em si já gera uma confiança, um conhecimento recíproco, que merece ser consolidado em uma moldura de cooperação mais estreita, com visitas de alto nível regulares”, declarou o embaixador.
Há um grande panorama de possibilidades de cooperação entre o Brasil e o Egito no setor agrícola, afirmou Patriota. “Foi assinado esse ano um acordo entre a Embrapa e a agência de pesquisa egípcia em agricultura. O Egito é grande importador de alimentos e está entre os países mais afetados pela guerra na Ucrânia, por ser grande comprador de trigo”, disse o embaixador.
Brasil na COP27
Patriota afirmou que o Brasil esteve bem representado com uma das maiores delegações, governamentais e não governamentais, na COP27. Para ele, os pavilhões do governo, da sociedade civil e do Consórcio Amazônia Legal mostraram “as diferentes dimensões do que o Brasil representa, da sua interface com o tema que se transformou em prioridade para a comunidade internacional e onde há uma demanda muito grande pela voz do Brasil, e essa voz se fez ouvir”, disse.
“Não posso deixar de mencionar a presença do presidente eleito, que teve muito impacto com um discurso que fala do compromisso do Brasil com uma agenda que nos afeta, mas que também somos exemplo de uma matriz energética que está entre as mais limpas e avança em direção à sustentabilidade a passos largos”, disse o embaixador, que falou também sobre o desafio em relação à floresta amazônica e sobre o anúncio de o Brasil ser sede da COP30, em 2025. “A decisão ainda aguarda uma formalização, mas me informam que no momento não há concorrência, então estamos muito bem posicionados para atrairmos os olhos do mundo para tudo aquilo que representamos de positivo”, disse.
Patriota falou sobre a aliança das florestas tropicais envolvendo Brasil, Indonésia e Congo, e do desejo de estreitar a coordenação com os países vizinhos amazônicos. “No âmbito da Organização do Tratado de Cooperação Amazônico (OTCA), eles se reúnem, se coordenam mas nunca assumiram assim um papel de maior liderança, com envolvimento em uma cúpula com todos os presidentes, isso está em pauta também, é um prenúncio de uma nova consciência subregional, regional daquilo que precisa ser feito para garantir a sustentabilidade, o progresso social dentro de uma nova consciência daquilo que temos a oferecer, também, que não é pouca coisa”, declarou o embaixador.
Negociações
Patriota esteve nesta sexta-feira (18) com o embaixador Paulino Franco de Carvalho Neto, secretário de Assuntos Multilaterais Políticos do Itamaraty e encarregado das negociações. “Ele acha que avança lentamente. É um ganho o tema de perdas e danos estar na agenda e haver uma consciência maior do mundo desenvolvido de que terão que contribuir para aliviar o grande sofrimento que a mudança climática está ocasionando em países que contribuem pouquíssimo para o aquecimento global, essa que é a injustiça. E o Egito, como país anfitrião, colocou no centro do debate a questão da justiça climática, que merece ser acompanhada com muita atenção pelo Brasil, inclusive com olhar generoso em direção à África, às pequenas ilhas, e os desafios que eles enfrentam”, disse o diplomata.
Segundo ele, a questão do financiamento de perdas e danos está dificultando as negociações. “Há uma incongruência, porque embora os acordos internacionais reconheçam responsabilidades comuns, porém diferenciadas e maiores de quem poluiu mais historicamente, e existam compromissos de desembolsar cifras em recursos que assistam os menos desenvolvidos, há uma resistência tremenda em traduzir isso em prática, e acho que todo mundo – setor privado, acadêmico, sociedade civil, inclusive do mundo desenvolvido – tem obrigação de pressionar para que essa resistência seja superada, porque não é favor, é cumprimento de obrigação e de compromisso, então exigir que se cumpra o prometido é o mínimo. Daqui para a frente não dá para ficarmos na defensiva nesse tipo de debate”, disse.
Antonio Patriota está em seu terceiro ano à frente da Embaixada do Brasil no Cairo. Ele disse que geralmente esse é o tempo que ele fica em cada posto.