São Paulo – Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e dos Estados Unidos, George W. Bush, assumiram hoje (09) à tarde, durante reunião realizada em São Paulo, o compromisso político de tentar destravar as negociações da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), que tem como objetivo criar um acordo comercial global. Elas estão praticamente paralisadas desde julho do ano passado.
“Nosso desafio é fazer do comércio uma opção de desenvolvimento, então é preciso acabar com as desigualdades no comércio mundial, com as assimetrias existentes. Minha convicção é que estamos mais próximos do que nunca do final da rodada Doha”, disse Lula à imprensa no hotel Hilton, na zona sul da capital paulista. “Se nós trabalharmos juntos na OMC, o resto do mundo também poderá trabalhar junto, por isso nossa discussão é vital”, acrescentou Bush.
Os dois se comprometeram a pressionar os negociadores de cada país a chegar a um denominador comum no menor prazo possível. “Vamos trancar nossos ministros em uma sala até chegarmos a um acordo”, brincou o presidente norte-americano. “Penso que estamos andando com muita solidez para chegar ao ponto ‘G’, para fazer o acordo. Se o Brasil e os Estados Unidos chegarem a um ponto de equilíbrio poderemos fazer nossa oferta para os outros”, destacou Lula.
Os dois presidentes concordaram que a vontade política dos dois países poderá influenciar os demais. “Além de convencer os países ricos, teremos que convencer os países pobres”, afirmou Lula. “Mas estamos aceitando este desafio, neste momento o sucesso da rodada não é uma questão econômica, é um problema político. Ou seja, se vamos ter competência para construir um futuro melhor para os milhões que dependem deste acordo”, acrescentou.
Lula lembrou que os principais entraves para a conclusão da rodada é a resistência da União Européia em abrir seu mercado agrícola, dos Estados Unidos em reduzir os subsídios que o governo concede aos seus produtores rurais e dos países em desenvolvimento em dar maior abertura em seus mercados de serviços e produtos industriais. “Nenhum país quer fazer a primeira oferta nova, porque quando você põe a carta na mesa não pode recolher. Mas nós queremos e vamos por as cartas na mesa e ver se dá acordo”, afirmou o presidente brasileiro.
Ambos também concordaram que a liberalização do comércio mundial é uma das melhores maneiras de promover o desenvolvimento nos países mais pobres. “O maior projeto que pode haver contra a pobreza é o comércio. Vai dar muito trabalho, mas concessões são necessárias para que todos ganhem na negociação”, declarou Bush.
Projetos
Além de um comércio internacional mais justo, Lula acrescentou que o Brasil e os Estados Unidos devem criar projetos conjuntos destinados a criar oportunidades de desenvolvimento em países mais pobres. “Os Estados Unidos e o Brasil podem juntos construir alguns projetos, para que os países mais pobres não vejam nos mais ricos apenas exploradores”, disse.
Neste sentido, Bush destacou a importância de uma parceria com o Brasil. “O presidente Lula é uma pessoa muito respeitada no exterior, ele fala com clareza e as pessoas o ouvem. Nós temos grandes preocupações com a África, conversamos sobre projetos conjuntos, sobre uma joint-venture entre o Brasil e os Estados Unidos nestes assuntos”, disse.
Nesta seara o que há de mais concreto é o memorando de entendimentos que os dois governos assinaram esta manhã sobre cooperação no setor de biocombustíveis. “Uma maneira de promover o desenvolvimento em outros países é incentivar as indústrias de etanol e biodiesel”, afirmou o presidente norte-americano. Os dois países pretendem levar adiante pesquisas conjuntas e promover o setor em outras nações das Américas. “Temos orgulho de ter contribuído na decisão dos Estados Unidos de incorporar os biocombustíveis em sua matriz energética”, afirmou Lula.
As tarifas impostas pelos Estados Unidos à importação do etanol brasileiro, no entanto, não vão cair no curto prazo. Bush declarou que esta decisão cabe ao Congresso de seu país, e a lei que atualmente obriga à cobrança só vai expirar em 2009. “Se eu tivesse capacidade de persuasão para fazer o presidente Bush acabar com as tarifas, ele já teria concedido tantas outras coisas que eu nem posso falar aqui”, brincou Lula. Os exportadores brasileiros pagam, no mercado norte-americano, uma taxa de 2,5% mais US$ 0,54 por galão (que equivale a 3,785 litros).
Para ele, este também será um processo de negociação longo. “Não acho que um país vai abrir mão de sua proteção comercial só porque outro está pedindo, é um processo que vai amadurecer”, declarou. Lula disse a Bush ainda que todos os governos da América do Sul são resultado de eleições livres e que todos estão empenhados no desenvolvimento da região. Ambos voltam a se encontrar no final do mês nos EUA.
Os dois presidentes mostraram descontração durante o tempo que falaram com a imprensa. Antes, eles participaram de um almoço junto com os ministros Celso Amorim (Relações Exteriores), Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), Silas Rondeau (Minas e Energia), o governador de São Paulo, José Serra, o secretário de Imprensa da Presidência, André Singer, e o assessor de assuntos internacionais do presidente, Marco Aurélio Garcia.
Serra disse que as conversas foram positivas no sentido de promover a criação de um mercado mundial de etanol, mas lamentou a manutenção das tarifas. O estado de São Paulo é o maior produtor de álcool do Brasil.
Do lado americano estavam presentes a Secretária de Estado Condoleezza Rice, o chefe de gabinete de Bush, Joshua Bolten, a representante comercial dos EUA, Susan Schwab, o secretário de Imprensa, Tony Snow, e outros assessores.
Eles almoçaram salada de legumes com molho de açafrão e camarões rosa, seguida de filé ao molho de pimenta, ratatuie de champignon e tortilhas de batata crocante. De sobremesa, daquoise de coco, mousse de maracujá e manga. Para beber, foram servidos vinhos brasileiros da marca Salton.
Bush, que chegou ontem ao Brasil, foi embora hoje no início da noite para o Uruguai.

