São Paulo – Embaixador da Palestina em Brasília desde 2008 e decano do Conselho de Embaixadores Árabes no Brasil, Ibrahim Alzeben acredita em uma relação promissora entre Brasil e países árabes nos próximos 20 anos, desde que o intercâmbio entre as culturas brasileira e árabes se fortaleçam a cada dia. A crença surge da experiência de quem conhece o país há mais de 30 anos e viu os laços diplomáticos, comerciais e culturais se aprofundarem desde então.
Sobre os últimos 20 anos, Alzeben afirma que o contato entre Brasil e países árabes evoluiu tanto do ponto de vista comercial, que “quase triplicou”, e chegou a US$ 32 bilhões em 2022, como no campo diplomático, com a presença crescente de embaixadores árabes em Brasília e vice-versa. “O mundo, nos últimos 20 anos, mudou muito enquanto relações internacionais. Esta mudança foi favorável para nos aproximar, países árabes com o Brasil”, afirma. Trata-se de uma análise de quem tem uma grande parte da vida dedicada ao Brasil e à América Latina.
Alzeben não nasceu na Palestina, mas na vizinha Jordânia, em 1953. Sua família buscou refúgio em Irbid, após a criação do Estado de Israel. “Terminei meus estudos na Jordânia, comecei a trabalhar porque nossa família tinha um jornal, (chamado Notícias da Semana) comecei a trabalhar como jornalista. Posteriormente tive a oportunidade de viajar para a América Latina, estudei em Cuba e iniciei a minha carreira diplomática em 1979 como adido cultural”, recorda.
Cuba foi o início de uma trajetória latino-americana que nos anos seguintes passaria por Nicarágua, Peru, Bolívia, Colômbia, Brasil e Paraguai, pois a embaixada da Palestina em Brasília é representação diplomática também do país vizinho. Em sua primeira missão brasileira, Alzeben viveu seis anos viajando pelo País.
“Naquela época não existia trabalho consular. Era trabalho, digamos, comunitário. Eu era o segundo chefe da missão e encarregado de assuntos comunitários”. Para cumprir sua missão, Alzeben viajou de carro pelo País: conheceu Manaus, São Paulo, Rio, Chuí, no Rio Grande do Sul, Mato Grosso… “todos os lugares maravilhosos do Brasil”. “Aquele acho que foi o fundamental, aquela passagem pelo Brasil entre 1989 e 1996, que inclusive facilitou ou ajudou para que eu voltasse como embaixador em 2008”, recorda o diplomata.
Pouco depois da criação da Autoridade Nacional Palestina (ANP), em 1994, Alzeben retornou à Palestina, onde trabalhou no Departamento de América Latina no Departamento de Cooperação Internacional. De lá, foi indicado embaixador na Venezuela, Colômbia e para onde sua jornada latino-americana a começou: Cuba. Foi também seu último posto antes de chegar ao Brasil.
Desde então, Alzeben se dedica sim à promoção das relações entre países árabes e Brasil, mas defende uma causa que está na origem dos pleitos palestinos, da sua carreira diplomática e até na sua própria origem: a criação do Estado Palestino.
“Enquanto não se consegue essa soberania, todo o intercâmbio fica debilitado, portanto, esperamos que o Brasil siga sua contribuição para obter esta independência. Esse apoio político é fundamental por parte do Brasil para poder chegar a um intercâmbio justo. Precisamos e agradecemos todo apoio do Brasil para pôr fim à ocupação militar israelense e, aí, neste caso, permitir que a Palestina volte a ser um país livre e soberano e possa estabelecer relações de igual a igual com todos os países e com este amigo que é o Brasil”, afirma o embaixador.
A luta por um Estado Palestino continua, e, junto dela, novos caminhos se desenham para os próximos anos. Alzeben enxerga oportunidades, mas elas dependem da troca e do conhecimento mútuo e constante.
“O mundo árabe é muito mais que petróleo e mercado e o Brasil é muito mais que carnes e alimentos. Podemos intercambiar especialmente quando abrirmos um pouco mais na parte cultural, conhecer melhor as nossas peculiaridades, nossas culturas. Felizmente, agora a comunicação ajuda para conhecer mais quem é o mundo árabe, como pensa o mundo árabe, a história do mundo árabe”, diz o diplomata ao exemplificar com o seminário “A influência do árabe na Língua Portuguesa”, realizado recentemente de forma online. “Eu acho que quando a gente se conhece mais, em todos os aspectos, temos mais possibilidades de intercâmbio e de crescimento”, diz.
Palestino, nascido na Jordânia com uma trajetória pessoal e profissional trilhada na América Latina, Alzeben acredita em um intercâmbio maior entre os países, mas mostra que o seu intercâmbio particular com o Brasil já está feito. “Gosto de todo o Brasil, não me sinto estrangeiro em nenhum lugar”.