Isaura Daniel
isaura.daniel@anba.com.br
São Paulo – Para um grupo seleto de brasileiros, os sinais e desenhos que constam em tábulas de calcário e papiros do Egito Antigo não são apenas sinais e desenhos. Uma meia dúzia de estudiosos do país, a maioria ligada ao mundo acadêmico, entende muito bem a linguagem da época dos faraós. São pesquisadores e professores como Ciro Flamarion Santana Cardoso, Antonio Brancaglion Junior e Moacir Elias Santos que dominam e até ensinam a língua egípcia Brasil afora. O conhecimento é usado pelos especialistas, e também por seus aprendizes, para decifrar documentos originais do Egito Antigo.
A egípcia é considerada uma língua morta já que não é mais falada. O idioma é usado atualmente apenas em rituais litúrgicos da Igreja Copta, segundo Ciro. O que a igreja usa é, na verdade, o último desdobramento da língua egípcia original, chamada oficialmente de copta. Os primeiros registros do idioma egípcio são de cerca de três mil anos a.C. A linguagem desta época é chamada de egípcio arcaico ou antigo. Depois o idioma evolui para egípcio médio, tardio, demótico e então para o copta. O copta já é baseado no alfabeto grego, mas usa também caracteres egípcios.
Ciro, professor de História Antiga na Universidade Federal Fluminense (UFF), aprendeu a língua egípcia na época em que fez seu doutorado na Universidade de Paris, na França. Enquanto preparava o doutorado, ele fez aulas de egípcio na Escola do Louvre. Quando retornou ao Brasil, após doze anos na Europa, Costa Rica e México, Ciro entrou na UFF para lecionar História das Américas, área do seu mestrado e alguns anos após optou por História Antiga. Nesta época, final dos anos 80, foi criado o setor de História Antiga e Medieval dentro do Programa de Pós-Graduação em História da UFF e Ciro começou a dar aulas de egípcio para alunos de mestrado e o doutorado.
A disciplina é aberta quando há estudantes com pesquisa na área de egiptologia. No ano passado, por exemplo, foram três alunos regulares e mais sete ouvintes. O curso dura um semestre e dá uma noção básica de como funciona a o egípcio médio. Para ter domínio completo, explica Ciro, é preciso continuar pesquisando por conta. O professor acredita que o Egito Antigo desperta grande interesse nas pessoas em função da arte da época e também da crença na eternidade da civilização egípcia antiga. “As pessoas têm simpatia pela estética da civilização”, diz o professor, explicando porque as aulas de egípcio atraem tantos alunos ouvintes, que normalmente não são pesquisadores acadêmicos do tema.
Moacir Elias Santos foi um dos alunos de língua egípcia de Ciro. O paranaense, atualmente professor no curso de História do Centro Universitário Campos de Andrade (Uniandrade), de Curitiba, no Paraná, aprendeu egípcio quando fez seu mestrado em Arqueologia na Universidade Federal Fluminense, no Rio de Janeiro. Agora Santos também ensina a língua dos faraós. Ele já deu cursos na área na Uniandrade e neste ano será introduzida uma disciplina de Língua Egípcia na especialização em História Antiga e Medieval da universidade, que ficará a cargo do professor.
Há ainda outros mestres da língua egípcia no Brasil, como o pesquisador Antonio Brancaglion Junior, ligado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ufrj) e Universidade de São Paulo (USP), e a historiadora Margaret Bakos, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Porto Alegre. No total, segundo as contas dos pesquisadores, há menos de dez pessoas que dominam o egípcio antigo no Brasil. No Egito Antigo, os que sabiam ler e escrever e trabalhavam diretamente com esta área eram chamados de escribas. De acordo com Santos, não havia gramática, o aprendizado ocorria na prática.

