São Paulo- São mais de 18 mil brasileiros morando no mundo árabe. Entre eles estão pilotos de avião, professores, comissários de bordo, técnicos e jogadores de futebol e engenheiros que optaram por tentar a vida fora, fazendo a trajetória inversa de milhares de imigrantes árabes no Brasil.
“É uma imigração mais profissionalizada, mais qualificada, não tem caráter permanente, é temporária, o que não deixa de ser uma imigração”, afirmou o professor e sociólogo Oswaldo Truzzi, que comparou o fenômeno atual à imigração árabe em massa ao Brasil no século 20. A maioria dos imigrantes árabes que vieram para a América do Sul era formada por sírios e libaneses, que, aos poucos, conquistaram seu espaço no comércio.
Atualmente, a maior parte desses brasileiros está no Líbano, que abriga cerca de 15 mil brasileiros descendentes de libaneses. No entanto, existem aqueles que não têm nenhuma ligação familiar com os árabes e adotaram um país do Oriente Médio ou Norte da África como uma nova pátria. É o caso da brasileira Raquel Barros, que mora com a família nos Emirados Árabes Unidos há seis anos e se tornou guia turística em Dubai.
A mudança na vida de Raquel ocorreu em 2004, quando o marido dela foi chamado para ser piloto da companhia aérea Emirates. “Quando nos mudamos não tinha muita informação sobre Dubai. Para mim, eu não ia gostar”, disse a brasileira, que se mudou com seus dois filhos pequenos para o emirado. Segundo ela, na época não havia muitos brasileiros no emirado. “O mais difícil foi chegar sem ter uma comunidade brasileira, não ter ninguém conhecido”, afirmou.
Hoje, nos Emirados, residem cerca de dois mil brasileiros, segundo dados da embaixada do Brasil em Abu Dhabi. Há dois anos, o número variava entre mil e 1,5 mil. “Com a crise em Dubai é possível que essa tendência seja em parte afetada, mas no médio prazo, essa população deve aumentar pelo gradual adensamento de nossas relações com os Emirados Árabes, especialmente na área econômica e comercial”, disse o embaixador brasileiro no país, Raul Campos e Castro.
De acordo com ele, a maior parte desses imigrantes trabalha como piloto, técnico e comissário das duas maiores companhias aéreas do país, a Emirates e a Etihad. Além deles, há os representantes de empresas brasileiras que atuam no país, como construtoras, exportadoras, bancos, entre outras. O embaixador lembrou ainda dos jogadores de futebol e dos instrutores de jiu-jítsu, que ensinam na rede escolar de Abu Dhabi.
Raquel sente que o número de brasileiros em Dubai tem crescido. Apenas na Emirates, segundo ela, são 100 pilotos brasileiros e 600 comissários. “Vira e mexe tem brasileiro na rua”, conta.
Para matar as saudades de casa, os imigrantes se reúnem no final de semana para dançar e comer churrasco. É assim, que os brasileiros que se mudaram para Líbia, no Norte da África, se divertem. Nos últimos dois anos, a companhia brasileira Odebrecht tem contribuído com a imigração qualificada para sua subsidiária em Trípoli, capital do país.
Luciana Cotta Lobo Leite, de 32 anos, mora em Trípoli há dois anos e trabalha no departamento de Recursos Humanos da companhia brasileira. “Não é fácil no início, pois são costumes e tradições muito diferentes das nossas”, disse. Para conviver em harmonia com os locais e no mundo coorporativo, Luciana conta que é importante saber dos costumes árabes e algumas palavras.
A casa dos amigos brasileiros e as praias particulares para estrangeiros são o ponto de encontro nos finais de semana. Segundo Luciana, a Odebrecht tem 200 funcionários brasileiros na Líbia, mas a falta do calor humano, da comida mineira e da liberdade de sair na rua despreocupada trazem muitas saudades do Brasil.
Crescendo e aprendendo
Marcelo Camacho, 30 anos, é jogador de futebol. Ele mora há seis anos em Riad, capital da Arábia Saudita, onde joga no time Al Shabab. “Foi muito difícil no começo, principalmente com a língua e a religião”, afirmou Camacho, que hoje já entende e fala um pouco do idioma árabe.
A Arábia Saudita é o país mais conservador do mundo árabe. As mulheres precisam andar cobertas e não podem dirigir, por exemplo. As leis islâmicas são seguidas de maneira bem rígida e o governo tem controle até sobre a internet. Mesmo assim, Camacho gosta de morar em Riad. “Cresci muito aqui, tanto como profissional quanto pessoa. Comecei a dar importância para pequenas coisas”, disse.
De acordo com ele, em Riad seus conhecidos brasileiros somam umas 30 pessoas. Além de jogadores também há muitos profissionais da área de informática e petróleo. Os encontros entre brasileiros são freqüentes e as festas têm direito até a feijão preto, trazido pelos próprios brasileiros.
Os jogadores de futebol estão presentes também no Kuwait, bem como executivos e representantes de grandes empresas. Segundo dados da embaixada do Brasil no país, a comunidade brasileira varia entre 150 e 250 pessoas.
A maioria dos imigrantes brasileiros visita o Brasil pelo menos uma vez por ano. A saudade da família, o verde da natureza e o calor humano não são esquecidos na vida em outro país. “Eu pretendo voltar para o Brasil porque sinto que a minha casa é lá”, disse Raquel Barros, que ainda deve ficar em Dubai por mais seis anos.