Alexandre Rocha
São Paulo – O Egito figurou como o segundo maior comprador de carne bovina in natura brasileira em janeiro, em termos de receitas cambiais (US$ 15,1 milhões), e o primeiro em quantidades adquiridas (15,2 mil toneladas). De acordo com informações divulgadas ontem (12) pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), o Egito foi também um dos paises para os quais as vendas de carne brasileira cresceram mais de 50% na comparação com janeiro do ano passado, ao lado do Reino Unido, Rússia, Alemanha, Suécia e Irã.
No total, somados os embarques do produto in natura e industrializado, o Egito comprou em janeiro quase 16,2 mil toneladas de carne brasileira ao valor de quase US$ 15,8 milhões, um aumento de 36% nas quantidades embarcadas e de 70% nas receitas, em comparação com janeiro de 2003.
Entre os 15 maiores compradores de carne in natura em janeiro aparecem também a Arábia Saudita em 7º lugar (5,5 mil toneladas, US$ 5,6 milhões) e a Argélia em 14º (1,6 mil toneladas, US$ 1,6 milhões). A Argélia foi um mercado aberto pelo Brasil somente no segundo semestre do ano passado, após a assinatura de um acordo sanitário entre os dois países.
Segundo informações da Câmara de Comércio Árabe- Brasileira (CCAB), as exportações de carne bovina para os países que compõem a Liga Árabe geraram receitas de US$ 17,8 milhões só na primeira quinzena de janeiro, um aumento de 81,15% em comparação com os primeiros quinze dias do ano passado.
“Houve um crescimento em praticamente todos os mercados que atuamos e de mais de 50% no Egito, Reino Unido, Rússia, Alemanha, Suécia e Irã”, disse o presidente da Abiec, Marcus Vinícius Pratini de Moraes.
118 mil toneladas
No geral, os embarques de carne bovina somaram quase 118 mil toneladas em janeiro, equivalentes a US$ 142 milhões. O crescimento em relação ao mesmo mês do ano passado foi de 14,08% no volume e de 42,65% nas receitas, de acordo com a associação.
O crescimento mais expressivo do faturamento, segundo Pratini, foi gerado pelo aumento do preço médio do produto brasileiro no mercado internacional. O valor médio da tonelada líquida (os números do parágrafo acima são referentes a toneladas em equivalente carcaça) em janeiro foi de US$ 2.015,03 para a carne in natura e de US$ 2.128,10 para o produto industrializado. No primeiro mês de 2003 os preços registrados foram, respectivamente, US$ 1.548,56 e 1.890,01.
Essa valorização, de acordo com Pratini, foi causada por três fatores: Em primeiro lugar, em janeiro do ano passado, com o dólar mais valorizado frente ao real, os importadores pressionaram pela redução dos preços em dólar. “Quando o câmbio se ajusta como agora (com a moeda norte-americana mais desvalorizada) os produtores lutam por melhores preços em dólar”, afirmou o presidente da Abiec.
Em segundo lugar, Pratini disse que no ano passado o Brasil ainda estava começando a entrar em novos mercados, como os da Rússia e da Argélia, o que obrigava os exportadores a praticarem preços mais competitivos. Agora, segundo ele, com esses mercados consolidados os empresários do setor passaram a promover uma “política de preços mais compensadores”.
Por último, o executivo citou questões sanitárias. Com a ocorrência de um caso do mal da vaca louca no estado de Washington nos Estados Unidos em dezembro, e a conseqüente suspensão da importação de carne americana por vários países, houve uma diminuição da oferta do produto no mercado internacional, suprida em parte pelo Brasil, fato que também contribuiu para o aumento dos preços.
“Mas a questão cambial foi a mais importante, a sanitária é um terceiro componente e nos afeta apenas em parte, porque nós ainda não temos acesso aos grandes compradores dos EUA que são o Japão, a Coréia do Sul e Taiwan. O efeito (da vaca louca nos EUA) será sentido mais quando tivermos um aproveitamento maior (desses mercados)”, destacou Pratini.
O executivo, que foi ministro da Agricultura do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ressaltou, porém, que o episódio ocorrido nos EUA, assim como o aparecimento da gripe do frango na Ásia, serve de alerta para todos os países, inclusive o Brasil, da importância de vigilância sanitária.
Ele acrescentou, porém, que o risco do aparecimento da encefalopatia espongiforme bovina no rebanho brasileiro é remoto, pois no Brasil, segundo Pratini, o gado de corte é criado a pasto e não tem contato com rações feitas a base de proteína animal, apontadas como potenciais vetores de transmissão da doença.
Metas para 2004
A conquista desse espaço deixado pelos EUA será justamente um dos objetivos do setor para este ano. Pratini disse que serão aceleradas “em nível de governo” as negociações para abertura do mercado de carne fresca do Japão, Coréia do Sul, Taiwan e dos próprios Estados Unidos, que só compram carne industrializada do Brasil. Aliás, os EUA são os maiores compradores do produto processado do Brasil. Em janeiro as exportações para aquele país somaram 9,6 mil toneladas equivalentes a US$ 13,4 milhões.
“Acabamos de enviar uma missão para o sudeste da Ásia”, disse Pratini. Entre os dias 17 e 28 deste mês empresários do Japão e da Coréia do Sul virão ao Brasil para tratar de negócios não só no segmento de bovinos, mas também de carne suína e de frango.
Segundo o executivo, esses países impõem barreiras sanitárias à compra da carne brasileira por causa da febre aftosa. Mas ele garante que a vacinação contra a doença atinge quase 100% do rebanho na maioria dos estados. “Eles (países asiáticos) não aceitam nosso zoneamento”, disse. Pratini afirmou, porém, que tais barreiras, na verdade, são práticas protecionistas travestidas. “As doenças estão lá (na Ásia) e não aqui”, declarou.
Apesar do imbróglio, Pratini acredita na possibilidade de fechamento de um acordo com os países asiáticos ainda este ano. Já com o Estados Unidos ele acha mais difícil, por conta da aproximação das eleições presidenciais naquele país. “Não sei se eles aprovam (a carne brasileira) antes das eleições”, disse. Isso porque, em sua avaliação, em ano eleitoral os políticos ficam mais suscetíveis aos lobbies dos produtores locais.
Um fator que deverá contribuir para uma maior aceitação da carne brasileira lá fora, do ponto de vista da saúde animal, será a obrigatoriedade da implantação do rastreamento da origem do animal abatido em todos os frigoríficos a partir de 15 de março, segundo informou Pratini. O sistema de rastreamento criado pelo governo, chamado de Sisbov, permite que seja verificado todo o histórico do bovino desde seu nascimento.
Com vários mercados já consolidados – em quatro anos os destinos da carne brasileira pularam de 40 para 104 -, Pratini disse que um dos principais objetivos do setor em 2004 será continuar na busca pela melhoria dos preços. De acordo com ele, o Brasil não tem como aumentar anualmente em 30% sua oferta de carne no mercado internacional e para que o setor continue a crescer é preciso valorizar o produto. “Existem limitações para um crescimento muito grande da oferta, por isso nossa prioridade é a melhoria dos preços”, afirmou.
Para este ano, a associação prevê um crescimento de 15% nas receitas de exportação e de 10% nas quantidades embarcadas.
Rússia
Além das negociações com os países da Ásia e os EUA, os representantes do setor e o governo também tentam chegar a um acordo com a Rússia para a flexibilização do sistema de cotas de importação de carne imposto por aquele país no ano passado. De acordo com o diretor-executivo da Abiec, Antonio Jorge Camardelli, a Rússia instituiu uma cota global de importação de 420 mil toneladas, sendo boa parte dela destinada aos países europeus e alguma coisa para os EUA. O Brasil terá de disputar uma cota de 68 mil toneladas junto com “outros” países.
No mês passado uma missão chefiada pelos ministros Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento) e Roberto Rodrigues (Agricultura) aterrissou em solo russo para começar a rediscutir o sistema. Nos dias 17 e 18 deste mês haverá uma reunião do comitê empresarial Brasil-Rússia criado para tratar do assunto.
O Brasil propõe que as cotas destinadas aos países que tiveram o fornecimento de carne suspenso para a Rússia, por causa de questões sanitárias, sejam redistribuídas para a categoria “outros”. Da mesma maneira, os produtores brasileiros querem que o restante das cotas que não sejam integralmente preenchidas pelos países de direito, no prazo estabelecido, também seja destinado aos “outros”.
Por fim, o sistema de cotas foi calculado com base na média de fornecimento de cada país nos últimos anos. Ocorre que o Brasil vende carne para a Rússia há pouco tempo e a média é baixa, os produtores então querem rediscutir isso também.
Em 2001, segundo Camardelli, o Brasil exportou 2 mil toneladas líquidas para a Rússia, em 2002 foram 40 mil toneladas e, em 2003, 83 mil. Portanto, a quantidade exportada pelo país no ano passado é maior do que a cota que o Brasil terá de disputar com outros países.
Dentro do setor, no entanto, existe a avaliação de que as negociações com a Rússia serão difíceis por causa do desequilíbrio enorme que há na balança comercial entre os dois países. O Brasil exportou o equivalente a mais de US$ 1,5 bilhão para o país eslavo em 2003, ao passo que importou pouco mais de US$ 555 milhões. O saldo favorável ao Brasil é de mais de US$ 945 milhões e a carne bovina é justamente o quarto item em importância na pauta.