Cláudia Abreu
São Paulo – Um velho tanque. Uma rã. Barulho da água. O poema japonês do século 17 ilustra bem o cenário zen do Pantanal, espalhado entre os estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A diferença é que ali são centenas de rios e lagoas. E nas águas pantaneiras existe uma infinidade de animais pulando dentro da água. São cerca de 260 tipos de peixes e 50 de répteis, segundo o WWF (Fundo Mundial para a Natureza). E não é só isso: há centenas de espécies circulando por terra e outras tantas no céu, cruzando os cerca de 140 mil quilômetros quadrados do Pantanal em território brasileiro.
Tanta biodiversidade tem atraído turistas bem particulares: os observadores de pássaros. Eles vêm principalmente da Europa e dos Estados Unidos. Trazem na bagagem binóculos, lunetas, guias de campo sobre aves e blocos de anotações. "O objetivo não é somente olhar a exuberância da paisagem do Pantanal, é entender a natureza dos animais que circulam ali, ter uma noção mais intimista de cada espécie. Digo que é um voyeurismo da natureza", explica Maurício Copetti, um amante da região e dono da pousada Refúgio da Ilha, no município de Miranda, no Mato Grosso do Sul.
Copetti foi um dos pioneiros a oferecer a atividade de observar pássaros no Pantanal. Gaúcho da região de São Borja, ele passou uma temporada na Europa, morou na Itália e em Londres. Em 1998, cansado de viver em cidades grandes, ele fez as malas e voltou ao Brasil cheio de idéias e com uma certeza: queria mudar de vida. Foi para o Pantanal, uniu forças aos seus pais que amadureciam a idéia da pousada, e juntos montaram a Refúgio da Ilha. A pousada é pequena – apenas sete quartos -, rústica, mas confortável.
"Nasceu focada num público específico: hóspedes que querem fugir do turismo convencional de massas. A idéia é oferecer aos visitantes total interação com a natureza num dos mais ricos ecossistemas do planeta", diz ele.
O negócio deu tão certo – e quase só no marketing boca-a-boca, segundo ele – que em 2003 Copetti deu mais um passo importante para difundir o Brasil como roteiro aos observadores da avifauna. Criou um programa de expedições pelo Pantanal. O roteiro é similar ao tipo de turismo que se faz na África do Sul, na Austrália e em Bornéu. "Esse, pelo menos é o retorno que os visitantes estão nos dando. Dizem que o Pantanal é melhor do que essas outras regiões que exploram a vida selvagem. Está mais intocado", afirma.
A maior parte dos turistas que participa das expedições vem da Europa. São, principalmente, holandeses, ingleses, austríacos e alemães. Mas a idéia é difundir mais a atividade. Os turistas árabes estão na agenda, mas ainda não foi feita nenhuma ação direcionada.
O programa de Copetti funciona da seguinte forma: o grupo de turistas – entre oito e 12 pessoas – pode montar a programação. Eles optam por ficarem entre nove e 12 dias observando a fauna local. Nesse período, no entanto, não ficam apenas em uma única pousada, circulam por outras fazendas da região atrás de espécies. Nas aventuras, além de ver pássaros exuberantes como arara azul, seriema e tucanos, os visitantes podem cruzar com onças, ariranhas e tamanduás.
O tempo de observação também é definido pelo visitante. Pode se ficar 15 minutos observando um único animal. "A idéia é captar como o bicho ou a ave vive, observar os movimentos que faz para se alimentar, para caçar. E isso tudo ao vivo, no ambiente do animal, não é como um zoológico", explica.
San Francisco
A iniciativa de Copetti também incentivou outras pousadas a explorar a observação de pássaros no Pantanal. É o caso da Fazenda San Francisco, de Beth Prudêncio Coelho. Fazenda de gado da família desde 1975, a San Francisco passou por algumas mudanças antes de virar um paraíso de pássaros. "Em 1983 implantamos um grande projeto de irrigação, com canais que lembravam os sistemas de irrigação do Egito. Nesta área, cultivamos principalmente arroz. Com a plantação e a irrigação, aves e animais começaram a ser visitantes freqüentes da fazenda", lembra Beth.
Em 2004, com o aumento da procura por hospedagem, Beth inaugurou a atividade de observação de pássaros na fazenda. Contratou o biólogo Alyson Vieira de Melo e começou a levantar todas as espécies que podem ser observadas na San Francisco. O último levantamento do biólogo listou 307 espécies de aves – quase metade das que existem no Pantanal, segundo dados do WWF que, em 1999, catalogou 650.
Na San Francisco, o programa também é feito de acordo com o perfil do cliente. "Acredito que cinco dias na fazenda são suficientes para observar as espécies que circulam por aqui", explica Beth. E tudo pode ser anotado. Cada hóspede da San Francisco recebe um bloco com as espécies que existem para marcar as aves que conseguiu observar durante sua estadia na fazenda. "Se viu todas pode partir para a pousada parceira: a Baía das Pedras", explica Beth.
Rita Lima e Jurgielewicz, dona da Baía das Pedras, também inaugurou a atividade de observação de pássaros há pouco tempo. A idéia surgiu depois que ela percebeu o interesse dos seus hóspedes pelo tema. Como Beth, Rita também contratou um biólogo para identificar as espécies que circulam pela fazenda. O resultado do trabalho deve ficar pronto em alguns meses. "Estamos catalogando tudo para fazer a listagem para os visitantes", explica.
Melhor época
Segundo Maurício Copetti, o melhor período para visitar o Pantanal é entre maio e outubro. Isso porque é o período da estação seca, quando os rios voltam aos seus percursos originais – após a cheia. "Nesses meses, é possível conhecer e fazer passeios pelos locais que ficam alagados entre outubro e março. No entanto, a cheia é uma estação muito exuberante", explica ele. Beth Coelho complementa: em setembro também acontece a época reprodutiva da grande maioria das aves, o que favorece a observação da avifauna.
Como chegar
Para explorar a região do Pantanal onde ficam as pousadas especializadas em observação de pássaros, o ideal é ir até Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, e, de lá, partir de avião monomotor ou de carro. Os veículos com tração nas quatro rodas, os 4 x 4, são os mais indicados. Baía das Pedras e San Francisco têm pistas de pouso. Elas distam cerca de 50 minutos de vôo de Campo Grande. Já de carro a viagem pode durar entre três e sete horas.
Na Refúgio da Ilha o acesso pode ser feito de carro ou de barco. A pista para aviões pequenos está fechada. São 225 quilômetros de Campo Grande, o trajeto pode ser feito em três horas. A Refúgio dista 20 quilômetros da San Francisco.
Serviço
Baía das Pedras
Diária: entre R$ 285 (em apto duplo) e R$ 320 (apto single)
www.baiadaspedras.com.br
Refúgio da Ilha
Diária: R$ 425 (em apto duplo)
www.refugiodailha.com.br
San Francisco
Diária: entre R$ 215 (apto coletivo) e R$ 340 (apto single)
www.fazendasanfrancisco.com.br
Os guias bilíngües não estão inclusos nos preços. A hospedagem inclui pensão completa e passeios. Os valores podem mudar, dependendo da quantidade de dias que o visitante for permanecer na pousada.
Outros sites
www.birdinginpantanal.com.br
www.pantanalwilderness.com