São Paulo – No lugar da autossuficiência na produção de alimentos, autoridades brasileiras e árabes propuseram repensar produções locais para torná-las mais eficientes. O debate se deu no painel “Segurança Alimentar: Uma parceria estratégica entre Brasil e o mundo árabe?”, nesta quarta-feira (21) dentro da programação do Fórum Econômico Brasil & Países Árabes.
Mediado por Omar Ben Yedder, diretor geral da IC Publications, a discussão teve a presença de Alexandre Ghisleni, diretor do Departamento de Promoção do Agronegócio do Ministério de Relações Exteriores do Brasil. “Temos que rever a autossuficiência não como um objetivo a ser alcançado. Chega a ser um inconveniente para garantir a segurança alimentar”, declarou Ghisleni.
Segundo o brasileiro, se a União Europeia tentasse ser autossuficiente em soja, por exemplo, seria preciso dedicar 137 mil quilômetros quadrados para a plantação, além dos recursos como água. “O comércio internacional se torna uma solução para garantir fontes estáveis de suprimento para o comércio de alimentos. Isso quer dizer que nenhum país do mundo pode abdicar de complementar a produção nacional com bens importados para garantir quantidade suficiente de alimentos para sua população”, concluiu Ghisleni.
A cientista-chefe designada da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, Dra. Ismahane Elouafi (foto acima), acredita que repensar como os investimentos em segurança alimentar estão sendo aplicados é o caminho para produções locais mais inteligentes. “Será que estamos desperdiçando os recursos? Achávamos que estava tudo bem, mas o sistema está falido, ineficiente. O encontro que teremos nas Nações Unidas em 2021 vai ser sobre como transformar o sistema alimentar tornando-o mais eficiente”, declarou.
Para Elouafi, é preciso analisar o perfil da região antes de decidir o que produzir nela. “O que precisamos fazer vai depender muito da região. Precisamos ter o ecossistema correto com a cultura correta. Ter trigo em uma região como a Península Arábica é um desperdício de recurso. Há outras culturas que funcionam bem melhor aqui. E é aí que vamos trazer a diversidade de espécies e na escolha da cultura considerar o uso de água também”, frisou ela, que é também diretora geral do Centro para Agricultura Biossalina dos Emirados (ICBA, da sigla em inglês). Elouafi destacou, ainda, que cooperações comerciais e científicas entre os países são estratégicas, citando a parceria firmada recentemente entre o ICBA e a Embrapa.
Para Jacyr Costa Filho, membro do Comitê Executivo do Grupo Tereos e presidente do Conselho Superior de Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), produções nacionais em itens como o açúcar colaboraram para manter a segurança alimentar durante a pandemia. “O sistema portuário e logístico brasileiro funcionou muito bem e estamos conseguindo bater um recorde histórico de exportação de açúcar, item que faz parte da cultura árabe. Vemos que podemos ampliar esse relacionamento estabelecendo parcerias entre Brasil e países consumidores para complementar a produção local”, afirmou Filho.
Já Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), lembrou o longo relacionamento estabelecido com árabes no comércio da carne de frango brasileiro com certificação halal. “As tendências que vemos para o futuro é de um consumidor que sai da pandemia exigindo mais confiança, e tendo mais confiança em marcas, seja as marcas das empresas ou da certificação halal”, afirmou Santin. que espera ver crescer os investimentos árabes no Brasil.
O saudita Hani Salem Sonbol, CEO da International Islamic Trade Finance Corporation (ITFC), que atua investindo em cadeias produtivas ao redor do mundo, lembra como a covid-19 veio impor a necessidade de garantir o fluxo alimentar mundial. “Agricultura desde o início foi nossa prioridade. Fazemos programas para apoiar os produtores em diferentes países membros. Somos chamados de banco do algodão da África. Temos feito grandes intervenções apoiando esta e outras culturas”, Sonbol.
Já na atração de investimentos, Khalid Ahmed Mohammed AlMarzooqi, diretor de Atividades Comerciais da Khalifa Industrial Zone (Kizad) lembrou que o mundo tem se voltado mais para os árabes e a África. “O bloco árabe vai crescer 3,3% no setor alimentício até 2023”, explicou ele, pontuando que a mudança é reflexo do crescimento populacional e do turismo na região. “Importamos mais do que produzimos, de fato. É por isso que quando pensamos em segurança alimentar, não pensamos em apenas um modelo, mas sim em abastecimento, e também em produções locais”, frisou ele.
O Fórum Econômico Brasil & Países Árabes é promovido pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira com a parceria com a União das Câmaras Árabes e Liga Árabe. O evento começou na segunda-feira (19) e termina nesta quinta-feira (22). Acompanhe a cobertura completa do fórum no site da ANBA.