São Paulo – Quando a Arábia Saudita decretou embargo à carne bovina brasileira, no final de 2012, o país do Golfo era o segundo maior comprador do produto nacional no mundo árabe, atrás apenas do Egito. Foram três anos de negociação entre os governos das duas nações e entidades brasileiras interessadas em retomar as exportações para lá. O embargo foi suspenso em novembro do ano passado e, agora, com a volta dos negócios, o volume embarcado já se aproxima da quantidade vendida antes da restrição.
É interessante notar que a suspensão do embargo fez com que novas empresas brasileiras se interessassem em exportar carne bovina ao país árabe. Dos quatro frigoríficos com os quais a reportagem da ANBA conversou, três começaram a vender para lá apenas este ano. De acordo com os dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), atualmente, há 78 plantas habilitadas no País para exportar à Arábia Saudita.
“Foi feito um esforço muito grande pelos vários entes [envolvidos]. Foi um esforço conjunto da embaixada, Câmara Árabe, Federação Muçulmana, Abiec, Ministério das Relações Exteriores, Ministério da Agricultura. Foi um conjunto de esforços pela importância do mercado saudita e por sua influência na região. Tanto que, depois da suspensão, mercados como Catar, Kuwait e Bahrein também já liberaram (as importações da carne brasileira)”, comenta Antônio Jorge Camardelli, presidente da Abiec, sobre o trabalho realizado para que os sauditas voltassem a comprar e consumir a carne brasileira. A embaixada à qual ele ser refere é a do Brasil em Riad e as entidades são a Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (Fambras) e a Câmara de Comércio Árabe Brasileira.
A nação árabe suspendeu a importação em dezembro de 2012, quando o governo brasileiro anunciou que um animal do rebanho do Paraná, morto em 2010, era portador do agente causador da encefalopatia espongiforme bovina (EEB), o mal da vaca louca, sem ter, no entanto, desenvolvido a doença. Outros países da região, como os mencionados pelo presidente da Abiec, também seguiram a decisão saudita. Hoje, após muitas discussões sobre a saúde e a segurança do rebanho brasileiro, esse assunto ficou, de uma vez, para trás. “O relacionamento voltou ao normal. As garantias que o governo brasileiro ofereceu foram suficientes. É um tópico superado”, afirma Camardelli.
O volume exportado após a retomada reafirma a declaração do presidente da Abiec. Os embarques à Arábia Saudita, reiniciados em fevereiro, somaram 11.555 toneladas até o mês de maio. No mesmo período de 2012, as vendas foram apenas um pouco maiores, de 13.928 toneladas. “Nos anos anteriores, a base era de 4 mil toneladas mensais. Já retomamos esse processo e a visão que se tem é que vá aumentar esse volume comparativo aos anos anteriores”, destaca o executivo.
Para o presidente da Abiec, a segurança do abate halal feito no Brasil também contribuiu muito para a suspensão do embargo. A certificação halal assegura que um alimento ou produto está de acordo com as leis islâmicas. “Outro ponto importante que nos ajudou na retomada foi a legitimidade do processo halal, a garantia de um processo 100% halal. Isso é extremamente significativo”, ressalta.
De volta às exportações
O embargo saudita foi suspenso no dia 09 de novembro de 2015, com a assinatura conjunta de um certificado sanitário internacional pela então ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil, Kátia Abreu, e pelo vice-presidente do setor de alimentos da Autoridade Saudita de Alimentos e Medicamentos (SFDA, na sigla em inglês), Salah Almaiman.
Desde então, os frigoríficos brasileiros passaram por um processo de reabilitação para o mercado saudita, que incluiu o envio de uma série de documentos para a autoridade sanitária do país árabe. Depois dessa fase, veio, finalmente, a etapa de negociações para as vendas.
Antes da restrição à carne brasileira, o Frigorífico Mondelli, do interior de São Paulo, tinha na Arábia Saudita seu principal mercado em receita. Este ano, a empresa aproveitou a realização da Gulfood, maior feira de alimentos do Oriente Médio, que ocorre em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, para ir à Arábia Saudita um pouco antes do evento e realizar reuniões com clientes antigos e novos compradores em potencial.
“Antes, trabalhávamos com três clientes, Hoje, só com um. Ele era o principal dos antigos e está sendo (o principal) também agora na volta. Ele nos fez uma proposta de exclusividade”, conta Carlos Travain, gerente de Exportações.
Segundo o executivo, aceitar o contrato de exclusividade com este cliente, uma rede de supermercados, fez com que a empresa conseguisse fixar um preço maior para a venda do alimento, mesmo que o faturamento ainda não chegue ao mesmo nível de antes da restrição. “Antes do embargo, faturávamos uma média mensal de US$ 1,5 milhão com a Arábia Saudita. Em junho, a expectativa é de ficar em US$ 800 mil”, revela Travain.
A Agroindustrial Iguatemi fechou seu primeiro negócio com a Arábia Saudita em abril. Hoje, a empresa faz embarques de 200 toneladas mensais de carne resfriada à nação árabe. “Temos cinco ou seis clientes lá. São distribuidores, supermercados e atacadistas”, diz Douglas Domingues, responsável pela área de Vendas e Exportações do frigorífico do Mato Grosso do Sul.
A empresa também foi para a Arábia Saudita na época da Gulfood. “A gente ficou uns dias em Riad e fizemos contatos lá”, explica. Segundo o executivo, o mercado do país árabe recebeu bem a volta da carne do Brasil. “Com relação à qualidade e aceitação, eles vinham há tempos querendo comprar [a carne brasileira] porque estavam limitados à Austrália e Nova Zelândia, e a Austrália tem uma capacidade limitada de fornecer (o alimento)”, aponta Domingues.
A quantidade embarcada aos sauditas representa metade do que a empresa exporta por mês no total e a expectativa é de crescer ainda mais lá e na região como um todo. A Iguatemi também vende para os Emirados, Egito, Jordânia, Catar, Kuwait e Omã. A empresa está atuando para entrar ainda nos mercados do Bahrein e da Argélia. “A gente quer chegar a fazer mil toneladas só para o Golfo. Estamos trabalhando para chegar a isso até o final do ano”, aponta.
O Frigorífico Vale do Sapucaí (Frivasa), de Minas Gerais, exportou pela primeira vez à Arábia Saudita em março, por meio de traders. “Vendemos para distribuidores e indústrias. Já vendemos para seis clientes lá”, conta Emerson Germiniani, diretor comercial da companhia. Segundo ele, até agora o Frivasa embarcou mais de 300 toneladas de carne à nação árabe.
O preço pago, no entanto, não está entre os mais altos, diz o executivo. “É um mercado que paga na média, um preço razoável”, diz. Olhando para os números da Abiec, é possível ver, de fato, que há espaço para um crescimento nos valores das exportações da carne bovina para os sauditas.
Apenas comparando os embarques feitos nos meses de fevereiro a maio, os números de 2012 mostram que o Brasil faturou US$ 66,27 milhões com a venda do alimento ao país árabe, enquanto os embarques feitos no mesmo período desse ano somaram US$ 43,78 milhões, uma diferença média de US$ 969 por tonelada. A tonelada custou, em média, US$ 4.758 entre fevereiro e maio de 2012 e US$ 3.789 em iguais meses deste ano.
O Frigorífico Sul (Frigosul) também fechou suas primeiras vendas aos sauditas em março. “Atuamos lá com distribuidores. Ainda não prospectamos supermercados e indústrias”, explica Diego Riva, diretor comercial. A empresa, também sediada em Mato Grosso do Sul, já conquistou quatro clientes no país árabe e fez envios de 200 toneladas de carne para lá. “A Arábia Saudita é um mercado novo para nós. Sabemos seu potencial”, destaca o executivo.
Riva tem uma visão diferente sobre os preços pagos no mercado saudita. “É um país que paga bem porque exige qualidade. Exige uma carne produzida sob todos os cuidados, uma qualidade de carne excelente. A Arábia Saudita está colocando a carne brasileira no lugar da australiana”, avalia.
Segundo ele, os sauditas demandam que os bovinos vendidos para lá tenham, no máximo, 30 meses de idade. “A Arábia Saudita quer o que tem de melhor e paga por isso”, diz. Para o diretor do Frigosul, a Arábia Saudita “é um mercado exigente e o Brasil tem plena condição de atender”.