Cláudia Abreu claudia.marques@anba.com.br
São Paulo – A praça da Sé, marco zero da cidade de São Paulo, virou objeto de estudo de três artistas visuais italianas. Vera Uberti, Valetina Vetturi e Kátia Meneghini iniciaram, no mês de outubro, um projeto artístico na cidade. A pesquisa foi dividida em duas partes, a primeira foi concluída em dezembro – a segunda, em meados de 2008. Para realizar os trabalhos, as artistas se instalaram na praça do Patriarca, também na região central, no edifício Lutétia, residência para artistas mantida pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). O resultado da primeira etapa do trabalho será apresentado no início do ano que vem, na Fondazione Michelangelo Pistoletto, na Itália.
Segundo Vera Uberti, a idéia de realizar o trabalho nasceu de uma colaboração entre artistas brasileiros e italianos interessados em participar das discussões sociais e ambientais das grandes metrópoles, colocando a arte no mesmo patamar da política, sociologia, antropologia e pedagogia, por exemplo. "Na primeira fase, realizamos ações que nos ajudassem a entrar em contato com a complexa realidade da praça da Sé, para que pudéssemos conhecê-la mais profundamente", diz.
Entre ações de aproximação criadas pelo grupo, Vera cita a Semear, na qual as artistas levaram flores para a praça e pediram aos passantes e moradores de rua, que vivem na região, para ajudar no plantio. Quem plantou também foi convidado a cuidar das plantinhas, regando-as diariamente, por exemplo.
Outra ação realizada pelo grupo foi a Guia-turístico. "Pedimos para um dos habitantes da praça nos guiar, mostrando os pontos que, segundo ele, eram mais interessantes", conta Vera. O resultado foi um vídeo com orientações turísticas totalmente realizado pelos habitantes da praça. De acordo com Vera, a reação das pessoas surpreendeu. "O público reagiu com curiosidade e disponibilidade em participar, interagindo com as nossas propostas", afirma. "Acreditamos que as ações levam a reflexões sobre os problemas sociais e ambientais da cidade. Tais reflexões não são imediatas, mas ficam na cabeça de todos aqueles que participaram ativa ou passivamente de cada uma delas", completa.
O último ato do grupo, chamado de Os ambulantes, aconteceu na semana passada. Munidas de um pequeno carreto carregado de livros de arte, as três artistas circularam pelo centro da cidade oferecendo às pessoas a possibilidade de folhearem os livros e discutir arte em meio ao caos da metrópole. A biblioteca ambulante era acompanhada de uma pequena cafeteria, que oferecia aos passantes, gratuitamente, um cafezinho. "Enquanto tomávamos o café conversávamos sobre nomes importantes para arte como o artista alemão Joseph Beuys, o teórico de arte italiano Giulio Carlo Argan, Marcel Duchamp, entre outros. Essa ação acabou sendo aquela que assumiu a integração final entre todas as outras", explica Vera.
Na segunda e última etapa do projeto, o grupo pretende ter a participação mais ativa de outros setores da sociedade, como a administração pública, por exemplo. Entre as ações proposta para 2008 está a criação de uma estação de rádio na praça da Sé, a Marcozero. O sistema será o mesmo dos outros atos, o grupo convida os passantes para participarem, interagirem.
Com exceção de Vera Uberti, que é brasileira radicada no Brasil, Kátia e Valetina não conheciam o Brasil antes de começarem o projeto. A experiência artística também foi a primeira fora da realidade européia. "Foram dois os aspectos que nos chamaram mais atenção em São Paulo: a disparidade e profunda divisão existente entre as várias classes sociais, e ao mesmo tempo, a grande solidariedade que existe entre as pessoas", diz Kátia. Valetina completa: "entramos em contato com uma realidade muito diferente daquela que estávamos habituadas e, talvez, a experiência mais preciosa que levaremos para casa é a possibilidade de colocar em discussão os nossos pontos de vista".
A volta de Cherry
O artista plástico libanês Ali Cherri, que esteve no Brasil no início do ano para editar o vídeo Slippage – e também se hospedou no Lutétia –, conforme a ANBA noticiou em março, retornou ao país no final de novembro. Foi convidado pela FAAP para apresentar o resultado do seu trabalho. Cherri trouxe o vídeo para a 39ª Anual de Arte da FAAP, evento que encerra a temporada de 2007 dos artistas internacionais na FAAP. A mostra de arte fica em cartaz até janeiro.
Slippage tem como tema de fundo a guerra no Líbano, iniciada em julho de 2006. O vídeo tem poucas falas e foi filmado dentro da casa do artista. Formado em Design Gráfico, Cherri ficou mundialmente conhecido por seu premiado trabalho "Un cercle autour du soleil", que em português quer dizer "Uma volta em torno do sol". O vídeo também trata da guerra no Líbano.