São Paulo – É a primeira exposição da artista brasileira Leda Catunda em um país árabe. Nem por isso é apenas um recorte temático ou datado do trabalho dessa que é um dos símbolos da arte contemporânea brasileira. Na mostra que promove desde 26 de setembro até 8 de fevereiro em sua sede, a Fundação de Arte de Sharjah, dos Emirados Árabes Unidos, proporciona ao público fazer um passeio completo pelas criações da artista, da década de 1980 até ontem.
Por isso a exposição tem como nome “Leda Catunda: I like to like what others are liking” ou, em português “Leda Catunda: Eu gosto de gostar do que os outros estão gostando”. O nome é quase um retrato da porta que a brasileira abriu em suas composições artísticas para o que está pronto, para o que é do gosto dos outros, o que acabou se caracterizando como uma das marcas do seu trabalho.

O que Leda faz, no entanto, não é apenas uma junção de imagens e materiais já finalizados, mas uma criação que navega entre pintura, escultura, instalação e obra em papel e que costuma ser denominada pintura objeto. E o que é colocado ali como pronto, adicionado ao que vem da mente, do pincel e das mãos de Leda, em contornos que a própria artista dá, se torna um recado sutil e brilhante.
“Na sociedade em que estamos, do consumo, se procura alcançar todos os gostos para vender mais”, explica a artista. A obra de Leda, no entanto, está longe de ser uma crítica feroz a esse universo. Ela enxerga o que há de individual dentro da engrenagem do consumo, em que não dá para ter tudo, mas dá para ter algo. “Eu acho que nesse fenômeno do capitalismo, o modo como nós nos adaptamos é muito afetivo, porque você tem que economizar o seu dinheiro senão acaba, mas a camiseta do seu time você vai ter, aquela viagem você vai fazer”, diz.

A artista enxerga uma dramaticidade na escolha do consumo na sociedade atual, em que comprar, em aquisições além do básico, é realmente uma eleição do que se gosta e a realização do desejo. “Numa sociedade muito massificada, você acaba procurando uma identidade específica”, diz, lembrando que isso se dá também na escolha de como viver ou em que acreditar. “Escolhendo você inventa, se arrisca e tenta encontrar caminhos mais individualizados ainda que dentro dessa massificação”, afirma.
E se isso permeia e sustenta a obra de Leda Catunda, também está dito nas mais de 60 obras que a artista apresenta nos Emirados Árabes Unidos. Para estarem reunidas nas galerias 4 e 5 da fundação árabe, as peças foram buscadas em várias partes do mundo. Algumas são da própria artista, outras de museus e outras de colecionadores particulares, vindas de endereços em Seul, na Coreia; Detroit e Cleveland, nos Estados Unidos, e Caxias do Sul, no Brasil, entre outros. A disposição de fazer todo esse arranjo para montar a exposição, assim como o interesse em apresentar a obra como um todo, surpreenderam a própria artista.

Leda Catunda conta que sua história com os Emirados surgiu há cerca de oito anos, a partir de um encontro com a atual diretora e presidente da Fundação de Arte de Sharjah, Hoor Al Qasimi, curadora da exposição da brasileira e a pessoa mais influente nas artes no mundo em 2024, segundo ranking da ArtReview. Colecionadora e dona de obra de Leda, Hoor visitou o ateliê da artista no Brasil e propôs a exposição retrospectiva. “O que foi muito surpreendente para mim”, diz Leda, se mostrando feliz com o colorido que o conjunto gerou. A artista afirma que achou muito significativa a seleção das obras por Hoor Al Qasimi. A mostra tem também assistência curatorial de Meera Madhu.
A brasileira acompanhou o processo de desenvolvimento da exposição à distância nos seis meses que antecederam a abertura e viajou para o país árabe para acompanhar a montagem e os primeiros dias da mostra. Na viagem, Leda teve a oportunidade de falar para o público, junto com Hoor, e de dar aulas, inclusive um workshop para crianças. “Não tinha uma criança que fosse do mesmo lugar. Por esse motivo, todas falavam inglês. Isso foi a coisa que eu achei mais forte nos Emirados. É um lugar de muita energia, as pessoas vão para lá para construir uma vida”, disse Leda para a ANBA.
Também chamou a atenção da artista a limpeza e a modernidade das cidades nos Emirados, a quantidade de mulheres trabalhando na Fundação de Arte de Sharjah e a disposição local para o novo e para entender cada vez mais a arte contemporânea. Leda Catunda já expos ao redor do mundo, em países como China, Japão, Noruega, Estados Unidos, mas tem em Sharjah a sua maior apresentação monográfica fora do Brasil.
Encontro com os Emirados
Agora que estreou no mundo árabe e que viu ali interesse recente pela arte contemporânea, ela também quer fazer da região o seu terreno artístico. “Não há planos concretos, mas eu tive lá um encontro com curadores africanos, com gente também da Austrália, e senti que eram encontros que eu não teria no Brasil. Eu acredito que fiz essa entrada com o pé direito e estou bem aberta”, afirma sobre futuros trabalhos.

Leda diz que não estava preparada para o mundo árabe, mas que foi surpresa muito positiva. “É muito diferente do Brasil e de todos os lugares em que já estive e fiquei muito contente por isso, por entender que há agora um novo espaço”, diz, ressaltando ainda a resposta calorosa que recebeu do público local. “Para mim, a experiência de ter passado por um público que não me conhece e que me acolheu de braços abertos – tem cartazes na rua com o meu nome – é uma coisa muito bacana, que maravilhoso”, diz.
Expoente da época, Catunda teve papel vital na reformulação da arte brasileira na década de 1980, com trabalhos que aproximavam pintura e escultura, seguindo por pinturas mais suaves nos anos 1990 e levando nos últimos anos intensidade barroca às criações. Leda entrou na Faculdade de Artes Plásticas na década de 1980 e começou então a expor em mostras individuais e coletivas. A artista também tem doutorado em Artes, experiência em ensino acadêmico e uma série de premiações por seu trabalho.
Serviço:
Exposição – Leda Catunda: I like to like what others are liking
De 26 de setembro de 2025 até 8 de fevereiro de 2026
Na Fundação de Arte de Sharjah – Galerias 4 e 5
Praça Al Mureijah – Sharjah – Emirados Árabes Unidos
Mais informações e ingressos aqui


