São Paulo – Imagine uma sociedade onde a população é consumidora de relações e as vê como mercadorias. Isso está acontecendo com o mundo contemporâneo, em que as pessoas estão cada vez mais centradas nelas mesmas, e uma linha do marketing, chamada de existencial, estuda a tendência para saber como vender melhor. Essas foram as principais ideias apresentadas nesta quarta-feira (11) pelo filósofo Luiz Felipe Pondé, em palestra feita na Câmara de Comércio Árabe Brasileira, onde ele mostrou como o marketing interpreta o homem atual.
Pondé, que é doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidade de Paris VIII, aborda esse universo nas aulas que dá em universidades e no trabalho de análise de comportamento para agências de publicidade. A pesquisa do comportamento humano é um das áreas do filósofo, que também é escritor e colunista em mídias brasileiras.
“É crescente a tendência do comportamento narcísico na sociedade contemporânea”, afirmou Pondé ao público. Ele citou as previsões que o historiador norte-americano Christopher Lasch fez, em seu livro “A Cultura do Narcisismo”, de 1979, para a sociedade do século 20. Segundo o filósofo, Lasch disse que as pessoas estariam mais preocupadas com o eu do que com o outro, e as pessoas abraçariam causas mais para se sentirem bem com elas do que para dar resultados. “As preocupações sociais são muito submetidas ao narcisismo”, afirmou.
Isso existe atualmente nas relações amorosas, diz Pondé. “Os relacionamentos tendem a ser efêmeros, as pessoas entram neles como se estivessem na bolsa (de valores). Você está com a pessoa, mas está olhando o mercado”, afirma o filósofo, complementando que elas investem nos relacionamentos se tiverem resultados, benefícios, com eles. Essa sociedade narcísica produz muita solidão e favorece o mercado, segundo o professor universitário. “Ajuda a comprar muita coisa, se você não tem ninguém, você compra”, concluiu Pondé.
Ele também afirmou que a classe C tem um convívio comunitário mais forte e que quanto mais recursos materiais estão disponíveis, mais as pessoas tendem a fazer escolhas pensando nelas. “Quanto mais opções as pessoas têm, mais escolhas individualizadas elas fazem”, afirma. Os filhos da classe C, segundo Pondé, respeitam mais os pais, falam português melhor que os pais, ganham mais que os pais, e se sentem mal com isso. Quando passam a conviver, a partir disso, com pessoas de maior renda, acham que rico não tem valor e só pensa em dinheiro.
No mundo contemporâneo, as pessoas chegam às relações como se fossem consumidoras, e também procuram nas mercadorias um valor de comportamento associada a elas. “O mercado oferece opções para você se sentir crítico, se você anda de bicicleta você tem a impressão que é uma pessoa mais avançada do que a que anda de carro, que você carrega a redenção do planeta”, afirmou ele. “A ideia de que você viaja para fazer uma experiência antropológica é o chique do chique”, diz ele, sobre outro produto de consumo carregado de significado.
Isso é uma saída para os jovens que têm a impressão que diante da sociedade de mercado atual não há muito o que fazer. “A sociedade de mercado foi produzindo riqueza e ficou difícil questioná-la. Isso causa muitas vezes, aos jovens que querem mudar o mundo, a sensação de que não há muito o que fazer”, afirma ele. O filósofo falou ainda sobre outros temas, como a felicidade, em diferentes fases da vida e segundo as escolhas de vida, como filhos e profissão, feitas. O público se divertiu com a maneira irreverente da abordagem.
A palestra foi a última do ano dentro do Ciclo de Palestras da Câmara Árabe, que trouxe em 2015, vários especialistas para falar de temas da economia, história, leis e outras áreas. A palestra de Pondé foi mediada pelo ex-diretor da entidade, Mário Rizkallah, e foi aberta pelo presidente Marcelo Sallum.


