Andradas – Os estados de Minas Gerais, principal produtor de café do Brasil, e São Paulo vêm se firmando com uma nova referência em terroir: a Região Vulcânica. A área tem características próprias que beneficiam a produção de cafés especiais. A principal é o solo vulcânico que, conhecido por sua alta fertilidade, enriquece a história por trás dos cafés e está ajudando a unir a agricultura familiar de 12 municípios.
Abarcando essas cidades, a Associação dos Produtores do Café da Região Vulcânica foi gestada por anos até seu lançamento oficial, durante a Semana Internacional do Café, em 2021. “É um tesouro ainda escondido, quando o pessoal descobrir toda essa riqueza aqui vai ser um dos pontos muito fortes da cafeicultura nacional. O que a gente precisa é falar mais enquanto região, sabe?”, declarou Ulisses Ferreira, diretor executivo da associação.
No entorno do vulcão
O chamado solo vulcânico ocorre porque os municípios fazem parte de uma caldeira vulcânica. O fenômeno vem das atividades de um vulcão extinto há 80 milhões de anos e que contribuiu para a formação da vegetação, predominantemente de Mata Atlântica.
Outra importante característica para a qualidade dos cafés, a altitude da região também foi influenciada pela atividade vulcânica e resultou em lavouras que variam de 700 e 1.300 metros. O relevo influencia na temperatura anual média, que está entre 17 e 20 graus Celsius e colabora para que os frutos tenham mais tempo para se desenvolver, sendo colhido mais tardiamente do que em outros locais.
Dentro do território dos cafés vulcânicos, há outras associações e cooperativas. Uma delas é a Associação dos Cafeicultores do Bairro Gabirobal (Acafeg), do município de Andradas (MG). O grupo tem 15 anos de existência, a associação tem a certificação Fair Trade desde 2010. O comércio justo deu fôlego aos produtores, em sua maioria de pequenas propriedades, e proporciona ações dentro e fora do campo. “Nós usamos a sede para fazer cursos e promover outras atividades, como aulas de ginástica e alongamento para os associados”, contou Aline Benezene Manzoli, auxiliar administrativa da Acafeg.
Manzoli é filha de um dos produtores fundadores e começou a atuar na associação ainda como voluntária. “Não estou acostumada a aparecer, em geral fico mais nos bastidores”, contou ela durante o painel do qual participou no 1º Encontro das Mulheres da Região Vulcânica, no dia 08 de março. Agindo longe dos holofotes a mineira organiza o grupo e dá força para que mais mulheres atuem ativamente na Acafeg. “Este ano vamos ter muitos cursos, inclusive de prova [de cafés] que foi demanda das mulheres, viu? Quando eu fiz, era só eu de mulher. Mas agora foram elas que pediram. E vamos lançar uma marca de café torrado em breve”, destacou ela.
A união dos agricultores conta com o apoio de instituições como a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG). “Nós estamos sempre próximos no início [da criação de uma associação], e quando vemos que já está estruturado, as pessoas vão sozinhas e nós podemos dar atenção para outro projeto. Esse é o papel da extensão rural”, pontua Maria Neuza, técnica da Emater que acompanhou a criação da Acafeg e segue apoiando a produção local.
Neuza lembra que o foco do município é na produção de café, e o perfil dos produtores é de agricultura familiar. É o caso de um dos associados mais antigos e que tem seu cafezal próximo à sede, Domingos Leone Neto, que ficou em segundo colocado no Concurso de Cafés de Andradas de 2020. “No início, muita gente disse que a gente era louco, que não ia dar certo o fair trade. Hoje, meu filho tem um Instagram do nosso café e já chegou comprador através dele”, conta o agricultor que cuida da propriedade Leone’s Coffee junto à família.
A alguns minutos de distância, e metros acima, está outra propriedade associado à Acafeg, o Sítio São José. A altitude da Serra dos Limas, onde fica o cafezal de José Carlos de Carvalho, que junto à esposa Odimar Crochiquio de Carvalho, é em torno de 1.400 metros. “Nesta safra, apesar de todos os problemas climáticos, nós produzimos cafés de excelente qualidade. O que pontuou menos, ficou com 83 pontos”, contou Carvalho. Os provadores profissionais pontuam a bebida na escala da Associação de Cafés Especiais (SCA) que vai de 0 a 100, e apenas os que ficam acima de 82 são considerados especiais.
A propriedade tem, além do Fair Trade, a Certifica Minas, programa estadual que garante que boas práticas agrícolas, ambientais e trabalhistas. Além do café verde, a família também tem sua própria marca de café torrado, a Filhos de José. O nome homenageia o pai de seu José Carlos, e faz um elo com a nova geração das filhas e genros do casal Pâmela Maria de Carvalho Cazaroto, Fernando Henrique Cazaroto, Ana Carla Carvalho e Ramon de Lima, que também cuidam da propriedade de nove alqueires e dividem trabalho e colheitas entre as três famílias.
Outra associada à Região Vulcânica é a de Juliana Lanzani Gomes. A propriedade que também fica no município de Andradas está na quarta geração de imigrantes italianos com mulheres ativas no negócio. Enquanto o avô da agricultura focava nas parreiras, a avó dela se dedicou ao cultivo de café. A propriedade também cultiva, hoje, bananas. Mas com a mesma paixão de sua ancestral, Gomes voltou a priorizar o café.
Com os grãos, a família comercializa o Café Empório Thereza, mas também vende o café cru para compradores no Brasil e exterior. Para isso, a produtora conta o apoio do marido, Paulo Roberto, das filhas, e do exportador Daniel Lima, que cuida dos contatos internacionais. “Já vendemos para alguns países como Estados Unidos, e estamos em tratativa com um comprador dos Emirados Árabes”, detalhou Gomes.
*A jornalista viajou a convite da Região Vulcânica.