São Paulo – À primeira vista parece mais uma cena comum da vida executiva na cidade de São Paulo. Um escritório em um complexo empresarial, com uma vista agradável da capital paulista, e um estrangeiro sentado em sua cadeira, atrás da escrivaninha, comandando as operações de uma multinacional no Brasil. A peculiaridade se revela, porém, ao observar melhor o executivo que ali trabalha ou o ambiente. Ele tem olhos escuros e sobrancelhas grandes, típica de quem nasceu no Oriente, e na parede há um diploma em árabe. Tarek Farahat é presidente da Procter & Gamble do Brasil e é de origem egípcia. A junção das duas coisas – executivos árabes e multinacionais – não costuma ser muito comum no Brasil.
Mas Farahat, com 45 anos, não se sente em cena rara. Sente-se em casa no Brasil e na sua sala na Procter & Gamble. Estar em um país estrangeiro faz parte da rotina dele, aliás, desde os 20 e poucos anos. O egípcio entrou na companhia norte-americana pela Arábia Saudita, com 24 anos, e desde lá vive em terras alheias. Já passou pela Suíça, França e Alemanha, sempre na Procter & Gamble e na área de marketing. Em 1999, desembarcou pela primeira vez para trabalhar na unidade brasileira da empresa, e saiu em 2002, para ir à Venezuela. Voltou em 2006 como presidente da Procter & Gamble do Brasil.
O que o trouxe até aqui? – pergunta a reportagem da ANBA, e Farahat não hesita. Afirma que foi a sua flexibilidade. “Quando você mostra flexibilidade, a empresa abre oportunidades para você”, diz o egípcio, explicando que o conceito engloba desde a possibilidade de morar em lugares diferentes até a agilidade de se adaptar a outras culturas e aprender idiomas. Ele diz ainda que mostrou à empresa, em sua carreira, que é capaz de fazer mudanças e o Brasil oferece, atualmente, possibilidade de crescimento para a Procter & Gamble. “O Brasil está em um momento muito bom e precisamos acompanhar”, diz.
Entre uma pergunta e outra, porém, Farahat vai revelando ainda as suas outras facetas de executivo, que o ajudaram a chegar a um posto muito cobiçado pelos freqüentadores de MBAs mundo afora. “Não acerto nada na primeira vez. Se vamos vender R$ 1 milhão, pergunto por que não R$ 2 milhões. Se for R$ 2 milhões, quero saber por que não R$ 3 milhões”, conta. Ele admite que herdou “um pouquinho” da aptidão dos árabes para negociar. Os árabes, porém, são conhecidos, lembra Farahat, pela sua atuação no comércio, na compra e na venda, e não em economia de produção. Já o egípcio, na Procter & Gamble, cuida tanto da fabricação, quanto da venda e outras áreas, como Recursos Humanos.
Farahat fala ainda que gosta de desafiar e que isso faz parte do seu jeito de comandar. Mas revela o que é a linha mestra da sua atuação: a opção, sempre, pelo correto. “Se há algo que vai dar muito resultado, mas não é mais correto, eu não faço. Faço sempre a coisa certa. Isso me deixar dormir tranqüilo todas as noites”, afirma, lembrando ainda que isso inclui fazer tudo muito bem feito, sempre. “Quero fazer a coisa 100% ou então nem faço”, afirma. Ele não relaciona a sua opção pela retidão com a religião, mas o fato é que ele é um homem muçulmano. Não freqüenta mesquitas, mas reza cinco vezes ao dia, como pede o Alcorão. “Religião, para mim, é algo entre mim e Deus, e me ajuda a viver melhor”, diz.
Em São Paulo
Farahat afirma que gosta muito da capital paulista. “Nos primeiros seis meses, quando cheguei, eu não gostei muito. Mas agora gosto muito de São Paulo. O trânsito, jantares, cinema, shopping, as chuvas. São Paulo vicia”, afirma. O egípcio trouxe com ele a família, que tem a mesma apreciação pela cidade. Por isso, Farahat não pensou duas vezes quando foi convidado para assumir a presidência da Procter & Gamble no Brasil. Ele diz que, mesmo que se mude algum dia para outro país, quer manter uma residência em São Paulo. Na capital paulista, Farahat é também diretor da Câmara de Comércio Árabe Brasileira.
O egípcio, que é nascido no Cairo, também fala bem do Brasil e dos brasileiros. Ele afirma que os brasileiros sabem viver a vida, desfrutar de cada momento. “Quando é final de semana, eles vão para a praia, quando tem jogo, vão ver o futebol, quando é hora de trabalhar, eles trabalham bem”, descreve. Como executivo de uma empresa de bens de consumo, Farahat não consegue deixar de observar outras características. “O sentimento de beleza é alto no Brasil, mesmo entre os homens. A freqüência do banho, da escovação de dentes é uma das mais altas do mundo. Também o número de dentistas. O Brasil é o país que mais tem pets no mundo, o segundo que mais consome produtos de cabelo”, afirma.
Quando questionado se o Brasil o mudou de alguma maneira, ele diz que sim, que o país o transformou em uma pessoa menos preconceituosa. Antes de chegar ao país, o que Farahat havia ouvido sobre estas terras era basicamente a respeito de futebol. Ele, aliás, admite que chorou quando Brasil saiu da Copa do Mundo em 1982 após perder uma partida para a Itália. No entanto, encontrou no país, segundo ele, uma população muito aberta, que aceita as pessoas de todo o mundo. “O Brasil tem uma cultura muito convidativa. Há no país pessoas de todo o mundo e todos são brasileiros”, afirma.
Outra coisa que chama muito sua atenção no país – e que ele leva muito em conta nas suas atividades de presidente de uma multinacional – é a força de consumo que há no Brasil. “Há empresas aqui que faturam bilhões e que não exportam nada”, admira-se. Ele ressalta o crescimento da Classe C, que dobrou de tamanho nos últimos dez anos no pais. Aliás, se ele for visto em um supermercado, observando uma senhorinha colocar as fraldas do seu bebê no carrinho, não estranhe. Farahat, como bom marketeiro, tem esse costume desde o começo da carrreira: sair à rua para ver o consumo acontecer.
“Os negócios não acontecem no escritório”, afirma. Farahat afirma que o que atraiu para a Procter & Gamble foi a história da empresa no desenvolvimento de marcas, uma área da qual é fã até hoje. O egípcio fez a sua carreira dentro da empresa. Filho de um advogado e vindo de boas escolas, Farahat cursou Administração de Empresas na Universidade Americana do Cairo. Chegou a trabalhar na Johnson & Johnson, mas ficou na companhia menos de um ano e logo entrou na Procter & Gamble, onde está até hoje.

