São Paulo – Se a comida em si é uma das formas mais fortes de manter a conexão de imigrantes e refugiados com seus países de origem, para a família Zinou esse foi só o primeiro passo para transpor suas raízes ao novo país. Vindos de Aleppo, na Síria, em 2014, os pais e os três filhos fugiam da guerra e encontraram em Campinas, São Paulo, um espaço para criar seu primeiro restaurante. Para homenagear a cidade de origem, a família criou o Castelo de Aleppo e aprendeu a servir comida caseira em um espaço aconchegante.
Mas a família queria mais do que trazer apenas a alimentação árabe para a cidade que os acolheu. “Foi um sucesso, mas o Castelo é um restaurante mais simples, é por quilo. Sempre quisemos fazer uma coisa mais especial, para fazer o povo conhecer a cultura. Somos de Aleppo, uma das cidades mais antigas do mundo, muito rica de cultura. Infelizmente, a mídia mostra muitas coisas ruins sobre a nossa cultura. Queríamos um espaço especial, onde o povo pudesse aprender mais. Veio a ideia do Palácio do Sultão”, conta Ayla Zinou, uma das filhas do casal sírio.
A ideia foi criar não apenas um restaurante, mas um centro cultural sírio. Lá, eles oferecem comida, realizam eventos, vendem itens de decoração de sua cultura, e mantém, ainda, uma casa de chás. “Temos dez chás diferentes, importados da Síria e da Turquia. Temos também um café especial que preparamos na máquina de areia, uma coisa bem especial da nossa região da Síria, do Líbano e da Jordânia. O mundo árabe não uma coisa só, temos muitas diferenças. Então, encontramos essa casa, que combina um pouquinho com a nossa cultura”, relatou a jovem.
A construção do Palácio
Mas a casa não veio exatamente pronta. Ao ver que ela era muito antiga, os três jovens sírios pensaram em não a utilizar para o empreendimento. “Mas meu pai, que é engenheiro, e minha mãe, que entende de decoração, insistiram em renovar essa casa. Meus pais conseguiram fazer o impossível! Espero que chegue o momento que eles vão fazer o que sonhavam, ser felizes reconstruindo o que perderam”, explicou.
A maior parte dos itens de decoração do Palácio do Sultão são importados da Turquia, Síria, Líbano e outras regiões do Oriente Médio. Cada detalhe foi pensado para transportar o visitante à Síria. Há, por exemplo, um espaço onde pode-se degustar o café da maneira tradicional árabe, sentado no chão, de pés descalços e cercado de tapetes. A casa também tem máquinas de chá importadas e até mesmo os temperos das refeições vêm do Oriente Médio.
A alimentação não era o ramo de nenhum membro da família antes da guerra empurrá-los a um novo país. Ayla é médica dermatologista, sua irmã é economista e seu irmão era estudante na Síria e no Brasil ingressou no curso de Engenharia Elétrica na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Seu pai é engenheiro civil, tinha uma fábrica de elevadores, a mãe é economista, e tinha escritório de turismo.
Uma vida completamente diferente da que eles vivem hoje, exceto, novamente, pela cultura que carregam. “Nunca havíamos trabalhado com restaurante, mas minha mãe cozinha muito bem. Na Síria temos costume de uma vez por semana convidar amigos, fazer uma mesa grande, e ela sempre preparou comida para essas festas em casa”, contou Ayla.
De quarentena, mas com delivery
Ainda assim, a ideia é que a especialidade da casa não se limite apenas à alimentação. “Abrimos em novembro. Nossa ideia é fazer ao menos dois jantares árabes completos ao mês, com algum show de dança e música, ou até com algum filme árabe. Eventos culturais para compartilhar a cultura de lá. Infelizmente, não tivemos tempo de organizar tudo isso”.
Durante o período de quarentena, a família colocou foco nas entregas ou retiradas de pratos no local. “Nosso trabalho na quarentena está difícil porque abrimos recentemente, então o pessoal não teve tempo para conhecer muito bem ainda. Mas estamos tentando fazer delivery para receber pelo menos o básico até poder trabalhar do jeito que planejávamos. Estamos com medo, especialmente eu porque sou médica, e estou vendo o que está acontecendo. Espero que isso termine rápido, estamos rezando para nada acontecer e conseguir continuar realizando nosso sonho”, relata ela, que conseguiu revalidar seu diploma no Brasil um ano e meio depois de sua chegada.
Apesar das dificuldades do momento atual, os sírios, que antes planejavam se mudar para os Estados Unidos, acreditam que tiveram sorte ao modificar a rota. “Queremos muito agradecer ao povo brasileiro pelo apoio. Tem pessoas que ajudaram muito na época que chegamos aqui. Não imaginamos que conseguiríamos alguma coisa, mas havia pessoas dia após dia conosco. Chegamos aqui e a ideia era ficar seis meses. Já faz seis anos que estamos aqui, eu já sou brasileira agora. O Brasil ofereceu até a nacionalidade para mim. Meus irmãos e meus pais estão no processo aguardando também. Tenho vários amigos em diversos lugares, ninguém está sentindo que está em casa como a gente está sentindo. O Brasil é realmente um país de amor”, concluiu a Ayla.
O Palácio do Sultão está atendendo pedidos através de aplicativos, como o Ifood, e do WhatsApp nos números (19) 98284-1314 e (19) 98444-5617.