São Paulo – O “Relatório de Comércio e Desenvolvimento 2016” divulgado nesta quarta-feira (21) pela Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad, na sigla em inglês) indica que a economia global terá um baixo crescimento neste ano, de aproximadamente 2,3%, e que o comércio internacional deverá avançar cerca de 1,5%. A instituição vê um esforço dos países ricos para impulsionar o crescimento econômico, sobretudo por meio de concessão de crédito, porém alertou que é preciso promover o aumento dos salários. O documento sugere mudanças estruturais na economia para retomar o crescimento e afirma que a industrialização é uma forma de alcançar um avanço sustentado.
Ao apresentar o documento em São Paulo, um dos pesquisadores do estudo, o professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Antonio Carlos Macedo Silva, disse que a Unctad acredita que o desenvolvimento da indústria, sobretudo a de transformação, pode ser a principal ferramenta para o crescimento das economias e do comércio internacional. “É essa indústria que gera reação em cadeia na economia. Ela tem uma produtividade média mais elevada do que outros setores, como a agricultura, por exemplo. O ideal seria deslocar as pessoas de setores de baixa produtividade, como o de serviços em geral, para setores de maior produtividade”, disse.
O documento da Unctad, intitulado “Transformação estrutural para o crescimento inclusivo e sustentado”, também alerta que o modelo de crescimento por meio do incentivo à exportação está se esgotando. A Unctad questiona também se integrar a cadeia de fornecimentos global a qualquer custo é a saída para o crescimento das economias.
Segundo Silva, fazer parte da cadeia de fornecimento global é positivo se um país exporta um bem e é capaz de manter o valor gerado por este negócio. Se o país apenas produz um bem e o exporta sem que parte dos lucros fiquem dentro de suas fronteiras, ele não se beneficia. Há uma tendência maior de que os países que fornecem bens de alto valor agregado se beneficiem em integrar essa cadeia de fornecimento do que aqueles que exportam commodities ou produtos de baixo valor.
“Integrar as cadeias globais pode ou não dar certo, pois às vezes você acaba fazendo concessões e produzindo bens baratos, de baixo valor”, disse Silva. Algumas das políticas que a Unctad sugere para a expansão industrial são incentivo a setores específicos sem, contudo, que se escolha “campeões” a qualquer custo, coerência nas políticas econômicas e burocracia eficiente e conectada com o setor privado.
O documento alerta ainda para outro desafio da economia: o lucro das empresas tem crescido, porém os investimentos estão em queda. Por dois motivos, na avaliação da Unctad: o crescimento está desacelerando, o que impacta os investimentos, e porque as empresas têm cada vez mais foco no lucro rápido e recolhimento de dividendos.
O desafio é maior para países em desenvolvimento. A Unctad reconhece que eles absorveram parte dos impactos da crise de 2008, porém medidas adotadas nos mercados desenvolvidos são um risco aos emergentes. Entre elas, a Unctad cita o crédito barato, que faz com que os ricos em alguns momentos façam grandes investimentos nos emergentes e depois retirem os recursos investidos. Entre as consequências desse movimento estão o elevado endividamento de empresas em países em desenvolvimento e oscilação cambial.
“A forma como os países desenvolvidos têm promovido o crescimento não tem dado certo. Eles estão crescendo via política monetária e crédito barato, em lugar de aumento de rendas e salários. Isso causa reflexos como inundações e retiradas de recursos dos países em desenvolvimento”, afirmou Silva. Houve um grande fluxo de capitais nestes países entre 2009 e 2013 e saída de recursos desde 2014.
Outro desafio para a economia mundial está em ampliar a renda das famílias. Nos últimos 30 anos sua capacidade de consumir caiu acentuadamente. Uma das formas de impulsionar a elevação de salários está na industrialização e na adoção de políticas de salário mínimo entre os países que ainda não a implementaram.


