Omar Nasser, da Fiep*
Cianorte e Curitiba – Quando a família do descendente de libaneses Chebli Mitre Nabhan abriu a Cheina, em Cianorte (Norte do Paraná), e começou a produzir confecções, nos idos da década de 1970, não imaginava que a cidade se tornaria o que é hoje: um grande centro nacional atacadista de moda, com 1.022 fábricas na sede e microrregião, além de 450 lojas de pronta-entrega. Diariamente, cerca de quinze ônibus e 30 vans lotadas chegam ao município, trazendo centenas de lojistas do país inteiro ávidos por novidades e bons preços.
A tradição do comércio começou com os pais de Chebli, Mitre e Sada Nabhan, que deixaram Zahle, na Região do Vale do Bekaa, Líbano, em meados da década de 1940. No Norte do Paraná, trilharam o mesmo caminho de boa parte dos imigrantes de origem sírio-libanesa que chegaram ao Brasil: primeiro, a atividade de mascate. O capital acumulado na venda ambulante foi empregado, então, na abertura da primeira loja.
A veia comercial estendeu-se aos filhos. A crise gerada pela grande geada de 1975, que arruinou os cafezais do Norte do Paraná, trouxe repercussões importantes para outros setores da economia, entre eles o comércio. Chebli percebeu que era a hora de mudar de ramo. Nasceu, então, a idéia de montar uma pequena fábrica de confecções. O começo foi difícil. "Tínhamos que formar a nossa mão-de-obra", conta o empresário.
Quando lembra da primeira exposição de moda feita em Cianorte, há quinze anos, o coordenador regional da Federação das Indústrias do Paraná, Wilson Becker, agrônomo de direito e empresário de fato, dá risada. Ela aconteceu embaixo de uma lona de circo, num dia de muita chuva. Dizem que chuva em dia de casamento é sinal de sorte para os noivos. Pois a água que caiu do céu naquele dia já anunciava o futuro promissor da cidade.
No início eram sete máquinas. A empresa cresceu e Chebli viu na exportação de jeans uma boa oportunidade de negócio. Contudo, o Plano Real, em 1994, promoveu uma sobrevalorização da moeda brasileira, o que trouxe sérios problemas para os exportadores. Foi o momento de mudar, novamente, de ramo. O empresário abriu a Lavenorte, lavanderia industrial que atende às empresas da região, gerando mil empregos diretos e 500 indiretos. "É a lavagem que dá a cara da roupa", explica Chebli.
Arranjo produtivo
Não se sabe muito bem porque Cianorte se transformou num pólo de produção de moda. O fato é que, na esteira do pioneirismo de Nabhan – seu filho está à frente da Pura Mania, indústria de Londrina que produz e vende moda jovem para todo o país – a cidade e os municípios vizinhos formaram, com o passar dos anos, um importante Arranjo Produtivo Local (APL), denominação dada aos grupamentos geograficamente delimitados de indústrias dedicadas a uma mesma atividade.
No Paraná, além do APL de Cianorte, existem os de bonés em Apucarana, esquadrias de madeira em União da Vitória, papel e celulose em Guarapuava, torneiras em Loanda e móveis em Arapongas.
Garantia de renda
A consolidação do pólo mudou o cotidiano dos moradores. A antiga Rua Paraíba mudou de nome. Virou a Avenida da Moda, sede de dezenas de shoppings atacadistas. O progresso, contudo, não se restringiu a Cianorte; estendeu-se aos municípios vizinhos, ampliando as oportunidades de emprego e renda a um número cada vez maior de pessoas. Em Terra Boa, Jussara, Icaraíma e outros municípios da região multiplicam-se as facções, empresas terceirizadas que realizam determinada etapa do acabamento da roupa.
Ex-funcionário de uma indústria de refrigerantes prestes a falir, Valdecir Castilho Oliveira é um exemplo das oportunidades que surgem. Ele não esperou a empresa fechar as portas para começar um negócio próprio. Juntou-se à mulher e à irmã e montou uma facção nos fundos de casa. Das cinco máquinas, os três conseguem uma renda mensal que chega a 9 salários mínimos. "Não falta serviço", diz Oliveira. O dinheiro, além de sustentar a família, permite sonhar em crescer. Os tijolos já estão empilhados no terreno. O objetivo é ampliar o puxado e comprar novo equipamento para dar conta do aumento da produção.
Três máquinas no fundo da garagem, o refeitório dos (poucos) funcionários improvisado na cozinha, o atendimento aos clientes e o estoque na sala de casa. Foi desta maneira que, há 15 anos, o médico veterinário Ossimar Polizel Custódio começou a carreira de empresário. Hoje, sua indústria, a Via Loran, é uma das maiores no ramo de confecções em Cianorte, produzindo 54 mil peças de jeans por mês em 2,1 mil metros quadrados de área construída, onde trabalham 210 funcionários.
Das atividades da Via Loran dependem, ainda, 150 pessoas que trabalham com facção e 25 representantes autônomos. A empresa, que vende para o Sul, Sudeste e Norte do País, quer introduzir o seu produto no mercado nordestino e exterior. Para fazer frente a estes novos desafios, há vagas a serem preenchidas na linha de produção, avisa o empresário. Boa notícia numa conjuntura na qual o que mais se procura é emprego.
*Federação das Indústrias do Estado do Paraná