Isaura Daniel
São Paulo – O diplomata Paulo Dyrceu Pinheiro está se preparando para assumir a embaixada do Brasil em Doha, no Catar. Pinheiro deve ir para o país árabe no final do mês de março, depois que sua indicação for aprovada pelo plenário do Senado Federal e assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O embaixador está disposto a trabalhar para que cresçam as parcerias comerciais entre os dois países. Uma das áreas que ele acredita que possa ser explorada pelas empresas nacionais é a de petróleo e gás.
O Produto Interno Bruto (PIB) do Catar cresce expressivamente impulsionado pelos investimentos no setor de energia. Sérgio Caldas Mercador Abi-Sad, que está atualmente à frente da embaixada do Brasil em Doha, vai ser chefe do escritório do Brasil em Taipé, capital de Taiwan. Pinheiro já foi embaixador em Luanda, na Angola, Islamabad, no Paquistão, na Cidade de Cingapura, e em São Tomé, em São Tomé e Príncipe. Veja abaixo os principais trechos da entrevista que o diplomata concedeu à ANBA, durante visita à Câmara de Comércio Árabe Brasileira:
ANBA – Quando o senhor assume a embaixada do Brasil em Doha?
Paulo Dyrceu Pinheiro – Por ora eu fui apenas aprovado pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. Ainda não fui aprovado pelo Plenário do Senado. Acredito que isso vá ocorrer só em março. Eu sou embaixador indicado (pelo ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim) e o Presidente da República só assinará a minha nomeação e a minha remoção depois dessa aprovação no Plenário do Senado. Vou para a embaixada assim que o presidente da República assinar a minha remoção, que deve ser mais para o final de março. Eu estou muito motivado com essa nova missão. Eu já estive em quatro embaixadas. O Catar será a quinta.
Qual é a sua trajetória na diplomacia brasileira?
Eu comecei em 1962. São 43 anos de carreira diplomática. Incluindo os dois anos de Instituto Rio Branco, são 45 anos. Neste tempo eu servi em vários postos em diferentes regiões da América Latina e Ásia, incluindo Paquistão. Fui embaixador nos anos 90 no Paquistão. Mas primeiro fui embaixador em Angola, de 1986 a 1988. Depois estive um período em Santiago do Chile, como cônsul-geral, mas foi curto, foram dois anos. Depois fui para o Paquistão, quando tive oportunidade de conhecer os países árabes do Golfo. Fiz contatos muito interessantes naquela região, mas não em Doha. Naquela época Doha ainda não tinha a projeção que está ganhando hoje. O Brasil tinha embaixada cumulativa com Abu Dhabi, nosso embaixador em Abu Dhabi era também embaixador credenciado para Doha. Fiquei cinco anos no Paquistão, de 1991 a 1996.
E depois do Paquistão?
Depois disso eu passei dois anos em Brasília e fui então, em 1998, para Cingapura, onde fiquei também quase cinco anos. E de Cingapura eu fui para São Tomé e Príncipe, de onde estou saindo agora. São Tomé e Príncipe é um país de língua portuguesa. Fui para lá em 2003, no primeiro ano do governo Lula. O presidente Lula visitou São Tomé duas vezes num espaço relativamente curto. Foi o primeiro país africano no qual ele pisou.
A ida para o Catar foi um pedido seu?
Foi um convite do ministro Celso Amorim.
Que importância tem o Catar para o Brasil?
O estado do Catar ganhou uma projeção especial nos últimos 10 anos, com um dos sistemas de governo mais progressistas de toda a região, de todo o mundo árabe, e está se tornando uma espécie de modelo de modernidade. O Catar está ganhando uma projeção econômica e financeira que não tinha há duas décadas. Há duas décadas o país era apenas um pequeno exportador de petróleo. Dentro da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) era um sócio menor, bem menor. Mas o Catar deve se tornar, até 2010, o maior exportador de gás do mundo, com reservas que constituem as terceiras reservas não associadas a petróleo do planeta. Em termos de petróleo, o Catar deverá manter, até por força da Opep, uma produção, de, no máximo, um milhão de barris por dia. E com algum gás associado. As empresas do estado catariano fizeram acordos de fornecimento com grandes empresas multinacionais norte-americanas, britânicas, francesas. As grandes multinacionais de petróleo estão presentes ali e são detentoras de direitos de exploração em associação com o estado catariano, o que tornará o Catar o primeiro fornecedor de gás dos Estados Unidos, a partir de 2010 ou 2012, e depois de boa parte da Europa. Esses contratos dependem ainda do desenvolvimento das jazidas, o que está em andamento. A receita do Catar com produtos energéticos deverá duplicar.
Há possibilidade de o Brasil comprar gás do Catar?
Eu devo encontrar (antes de viajar a Doha) o pessoal do desenvolvimento de negócios internacionais da Petrobras para ver quais são as idéias, quais os projetos nesta área.
O Catar pode ser uma alternativa caso haja problemas de fornecimento de gás boliviano?
Há uma possibilidade de que a Bolívia passe a não ser um parceiro do qual nós possamos depender. Mas há uma série de outras atividades para explorar no Catar, como o setor de equipamentos de petróleo. Estamos construindo plataformas gigantescas e de boa qualidade, com um grau de inovação tecnológica muito atraente. Isso eu creio deve ser um dos trabalhos, a exploração de oportunidades de associação de empresas brasileiras na área de equipamentos de petróleo.
A área de petróleo e gás é o grande setor que será explorado?
Eu pretendo explorar todas as possibilidades. As receitas do estado do Catar deverão praticamente duplicar até 2015 ou 2016 e o país já tem uma renda per capita superior a US$ 30 mil. É um mercado pequeno, mas pode ser um importante centro de distribuição. Eles têm ambição de se tornar o que Cingapura é na Ásia, no extremo Oriente, uma base distribuição para a China. E Doha, juntamente com Dubai, pode ter essa vocação, pode atrair empresas brasileiras interessadas em se estabelecer naquela região.
Que outras áreas podem ser exploradas?
Também há oportunidade para as empreiteiras brasileiras. Os investimentos que se faz em construção naqueles países batem recordes a cada ano. No Catar, eles criaram um grande centro esportivo que vai sediar os Jogos Asiáticos agora neste ano de 2006 e que está sendo considerado um dos mais importantes, se não o mais importante, complexo esportivo do mundo.
A embaixada será bastante focada em negócios?
Principalmente, mas sem descuidar de outras possibilidades, de intercâmbio cultural, de turismo.
Há algum plano nestas áreas?
O que existe são as decisões e orientações que emanaram da Cúpula de Países Árabes e Sul-Americanos. Um dos frutos da cúpula foi o acordo de livre comércio entre o Mercosul e o Conselho de Cooperação do Golfo (GCC) (que está em negociação). Mas isso tudo é muito recente. A gente fala de relações prioritárias com o mundo árabe desde a primeira crise do petróleo, mas só agora é que realmente elas estão ganhando corpo, uma certa organização. A própria Câmara de Comércio Árabe Brasileira cresceu imensamente nestes anos desde 1973. Então eu não posso dizer que tenha planos ou projetos específicos para o atar porque nós vamos ter que ver o conjunto. Ali no Golfo Pérsico há os Emirados, Omã, que é um país promissor, não tem petróleo, mas é muito atraente, o próprio Kuwait que é um parceiro mais antigo. Teremos que ver o conjunto.