São Paulo – O Brasil é o quarto maior produtor de tilápia e o país com mais potencial de crescimento do mundo na área. A piscicultura vem avançando exponencialmente há pouco mais de uma década, e as exportações, que começaram há cerca de cinco anos, acompanham a tendência, trazendo momento de virada para o setor.
A receita de exportações do segmento cresceu 78% em 2021 em relação a 2020, somando U$ 20,7 milhões. Em volume, o crescimento foi de 49% sobre o ano anterior, com 9,9 mil toneladas embarcadas. As vendas de filé congelado aumentaram 573% em 2021 no mesmo comparativo. Este é o segundo produto com maior valor agregado na piscicultura, atrás apenas dos filés frescos.
Os atuais compradores da tilápia brasileira são Estados Unidos (64%), Colômbia (9%), e China (8%). Chile e Canadá também compram o peixe do País, principalmente em filés frescos ou congelados. “Hoje, mais da metade do volume exportado tem como destino os Estados Unidos, mas a tendência é de diversificação dos destinos”, disse à ANBA o pesquisador da Embrapa Pesca e Aquicultura, Manoel Pedroza. Embrapa é a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
Em 2021, a produção de peixes de cultivo no Brasil foi de 841.005 toneladas, sendo 63,5% de tilápia, e o restante de outras espécies, com destaque para o tambaqui, tambacu, pintado, carpa e pirarucu, todos voltados para a alimentação, informou o presidente da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR), Francisco Medeiros. Esse volume representa um crescimento de 4,7% sobre o ano anterior. Só de tilápia, foram 534.005 toneladas, alta de 9,8% sobre 2020. Os reservatórios de hidrelétricas têm capacidade para produção de cerca de 3,5 milhões de toneladas por ano, o que tornaria o Brasil o maior potencial produtor de tilápia do mundo.
“A cadeia da tilápia e dos demais peixes de cultivo é muito nova no Brasil, tem mais ou menos 15 anos, mas está crescendo muito e tendo muito investimento privado, e as empresas estão voltadas para o mercado externo, já que a redução do poder de compra limita a expansão interna, ainda mais nesse momento de crise”, declarou Pedroza.
A exportação no ano passado foi de quase 10 mil toneladas, nem 5% da produção. O potencial para exportar é muito grande. Desde 2019, houve uma desoneração de imposto federal para a tilápia que reduziu o custo de exportação em torno de 10%. Então, as grandes empresas de proteína animal, que já exportam volumes massivos de frango, principalmente, começaram a investir no setor das fish farms, como as cooperativas Copacol e CVale, do Paraná. Dessa forma, a produção vem sendo ampliada ano a ano.
“Essas cooperativas já exportam muito frango para os países árabes, mas peixe, ainda é um volume muito pequeno”, disse Pedroza. Agora, a piscicultura está se tornando o foco das exportações para essas empresas, que inclusive já têm a logística adequada para vender ao exterior.
A Peixe BR, que representa atualmente 70% das empresas do setor no País, tem projeto setorial junto à Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) para que as empresas que querem exportar participem de feiras internacionais, rodadas de negócios e estudos setoriais. O presidente da Peixe BR, Francisco Medeiros, disse à ANBA que empresas como CVale, JBS e Copacol já estão presentes nas maiores feiras de alimentos do mundo.
“Como elas vendem aves, levam a tiracolo a tilápia. Ainda é uma presença tímida, mas a gente está lá mostrando o nosso produto”, disse ele, se referindo à Gulfood, maior feira de alimentos e bebidas do Oriente Médio e Norte da África, que ocorreu semana passada em Dubai. A Peixe BR recentemente se vinculou à Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Segundo Medeiros, os países árabes atualmente compram tilápia de países da Ásia e do Egito, por serem mais próximos. O diferencial do peixe brasileiro, para ele, é a qualidade e a segurança, além do preço competitivo. “O Brasil tem um dos melhores órgãos sanitários de controle do mundo, o que garante ao comprador um produto de qualidade e segurança para quem vai comer. O nosso preço e nossa qualidade sanitária não só para a tilápia, mas para todas as demais proteínas, são nossa principal vitrine”, disse.
Ele lembrou que o Brasil já é o mais importante fornecedor de aves para os países árabes. “As indústrias de frango como BR Foods, Copacol e Seara (JBS) estão produzindo tilápia e vão utilizar a mesma logística que utilizam para o produto de aves, seguindo a mesma rota marítima”, disse o presidente.
De acordo com o secretário-geral da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Tamer Mansour, o frango brasileiro sai principalmente do Porto de Itajaí (SC), e em menor volume pelos portos do Rio Grande (RS), Paranaguá (PR) e Santos (SP). Os navios passam pela Espanha, Holanda (Roterdã) ou Alemanha (Hamburgo), e depois há uma troca de navio, para então seguirem viagem. Os principais portos árabes que recebem o frango brasileiro são Jeddah e Dammam (Arábia Saudita), Alexandria (Egito) e Jebel Ali (Emirados Árabes Unidos). “As trocas acontecem sempre na Europa. Tem alguns navios que vão direto para Jebel Ali, mas é muito raro”, disse Mansour.
Onde estão
O primeiro produtor de tilápia do mundo é a China, seguido por Filipinas, Egito e Brasil. O Paraná é atualmente o estado brasileiro que mais produz peixes de cultivo, seguido por São Paulo, Bahia, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Pernambuco. Mais da metade das empresas exportadoras se concentram entre São Paulo e Paraná.
A Embrapa Aquicultura foi estabelecida em Palmas, em Tocantins, há dez anos. Pedrosa explicou que o estado ainda não é grande produtor, mas tem enorme potencial por ter grandes produções de soja e milho e grandes volumes de água.
Fresco ou congelado
A produção de tilápia vem crescendo em torno de 10% ao ano, informou Medeiros, da Peixe BR. Ele estima que a produção aumente entre 10% e 12% neste e nos próximos anos, principalmente pelo crescimento nas exportações, que ele prevê que devem aumentar 78% ou mais esse ano. Ele informou que, somente em janeiro, o volume de embarques subiu 175% em relação ao primeiro mês de 2021. Esta alta de volume está indo principalmente para os mesmos países compradores, mas junto à Apex-Brasil, Medeiros espera abrir novos mercados.
Cerca de 50% do que é exportado atualmente são filés frescos ou congelados. “Agora, a exportação de filé e tilápia inteira congelados está aumentando. A exportação de filé congelado aumentou 650% ano passado, fato que está modificando toda a cadeia produtiva, porque o filé de peixe congelado é uma commodity internacional e um produto com maior valor agregado, e o Brasil está aproveitando esta oportunidade”, disse o pesquisador Pedroza. O filé fresco viaja de avião, e o congelado pode ir de navio, o que reduz bastante os custos com a logística e torna o produto brasileiro mais competitivo no exterior.
A tilápia do Brasil vai tanto para supermercados e restaurantes quanto para a indústria de processados no exterior. Pedroza afirmou que a valorização do dólar trouxe mais vantagem competitiva para a exportação de peixe brasileiro, porque o produto chega ainda mais barato em mercados como os Estados Unidos, por exemplo. “Pensando no mercado árabe, certamente é bom ser o produto congelado. Possivelmente, a tilápia congelada vai seguir o mesmo caminho do frango congelado, que já é um produto muito presente nos países árabes”, disse.
Players como a JBS entraram recentemente na produção de tilápia e pretendem utilizar a marca Seara, a princípio no mercado interno e em um segundo momento, para exportação. “Estamos vivendo um momento de transformação, a tilápia está saindo da cadeia local e passa a se internacionalizar. Os grandes estão entrando agora e trazendo mudanças para o setor”, falou o pesquisador.
Mercado halal
Para adaptar a produção de tilápia para o mercado muçulmano, é necessário obter a certificação halal, para garantir a qualidade do produto. De acordo com Dib Tarras, diretor do setor Industrial da certificadora Fambras Halal, o processo de certificação para peixes criados em cativeiro se baseia em requisitos religiosos e de segurança alimentar. “Tanto a cadeia produtiva quanto a de processamento do produto devem seguir as Boas Práticas de Fabricação e implantarem o Sistema APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle) e o Sistema de Garantia Halal (HAS)”, disse Tarras à ANBA.
A ração dos peixes criados em fazendas não pode conter ingredientes provenientes de origem animal, principalmente de porco, ou de animais que não foram abatidos conforme determina a Sharia, a lei islâmica. Isso inclui seus subprodutos como a farinha de osso, sangue, entre outros. “Os peixes somente podem ser alimentados com ração que contenha farinha de peixe e vegetal”, enfatizou o diretor.
O processo de abate, ou zabiha, não se aplica a peixes ou qualquer outro animal que não possua traqueia e veia jugular. Basta seguir o que determina a legislação do País. Peixes venenosos ou contaminados com sujeira (najs) não são permitidos, e os tanques de criação devem estar longe de poços de esgoto, para evitar contaminação da água.
De acordo com Manoel Pedroza, a ração dos peixes criados no Brasil geralmente contém grãos, como milho e soja, e uma parte de proteína animal, como farinha de osso e de sangue, que pode ser bovino, de frango, ou do próprio peixe, dependendo da empresa. Tarras informou que as farinhas com partes de bovinos ou frango são praticamente inviáveis, devido à complexidade de se garantir uma rastreabilidade desses produtos. Ele disse que somente uma empresa de tilápia no Brasil possui a certificação halal até hoje.
Fider Pescados
O diretor de negócios da empresa Fider Pescados, Juliano Kubitza, contou à ANBA que a empresa faz a piscicultura em redes e que abate 800 toneladas de peixe por mês. Ano passado, foram criadas 10 mil toneladas de tilápia, e o diretor prevê que 2022 feche em 15 mil toneladas. Somente 10% do que é produzido vai para o mercado externo. “Começamos a exportar em 2020 e estamos otimistas”, disse Kubitza.
Os Estados Unidos são o principal comprador internacional da companhia e importam principalmente o filé congelado, produto de maior valor agregado da empresa. A Fider aproveita todo o peixe, suas aparas e carcaças vão para uma fábrica e são transformados em farinha e óleo, que são vendidos para a Ásia, além do mercado interno. São utilizados para a nutrição animal (ração), e a pele, na indústria de colágeno. A Fider fica em Rifaina, no interior de São Paulo, e faz parte do grupo MCassab.
O diretor disse que a empresa está contratando a certificação halal para a tilápia. “Temos um projeto de expansão das exportações e enxergamos o mercado halal com uma potência para explorar, mesmo no Brasil. É um público exigente quanto à qualidade, e para nós isso é interessante”, afirmou Kubitza, enfatizando o grau de exigência que estabelece na sua produção.
Mar e Terra
O gerente geral de Unidade da empresa Mar e Terra, Gustavo Pchirmer, disse à ANBA que a empresa já exporta tilápia para os Estados Unidos, Canadá e África do Sul, e que busca novas habilitações para outros países.
A empresa fica em Itaporã, no Mato Grosso do Sul, e produziu 250 toneladas de peixe vivo por mês em 2021. “Este ano vai para 650 toneladas de peixe vivo ao mês, em média”, disse Pchirmer. No ano passado, foram exportadas cerca de 250 toneladas por ano, segundo o gerente. “Pretendemos exportar cerca de mil toneladas esse ano”, afirmou Pchirmer.
A Mar e Terra pertence ao Grupo Pluma, que também produz frango pela empresa Bello Alimentos, e a tilápia congelada utiliza a mesma logística da proteína de aves para a exportação por navio.
O anuário da Peixe BR foi divulgado nesta terça-feira (22) e está disponível no site da associação.