São Paulo – Os imigrantes árabes que vivem no Brasil e seus descendentes marcaram a vida e a trajetória de vários brasileiros. Uma série de histórias pessoais e profissionais com essas influências foram apresentadas nesta quinta-feira (25), Dia da Comunidade Árabe, em evento virtual promovido pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira e a Casa Árabe.
Muitos não sabem, mas aquele que é conhecido como o melhor jogador de basquete que o Brasil já teve, Oscar Schmidt (foto acima), jogou no time do Esporte Clube Sírio, fundado pela comunidade síria em São Paulo. No clube, ele ganhou o título de campeão mundial e foi projetado nacionalmente e internacionalmente. Em vídeo gravado, Schmidt falou sobre isso e disse que o Sírio foi o melhor time de clube no qual já jogou. “Meus grandes amigos saíram de lá”, afirmou. “Tenho uma saudade danada daquele tempo”, completou.
Nas artes, o músico Cláudio Kairouz por vezes é tido como alguém de ascendência árabe. E ele trata logo de revelar que a sua ligação se dá por outra esfera. “Sou brasileiro de sangue com muito orgulho, mas libanês de coração”, disse em participação ao vivo no webinar. Ele, que tocava piano erudito, se deparou com a música árabe na adolescência e nunca mais a largou, foi morar no Líbano e hoje é conhecido como um dos grandes músicos de ritmos árabes no Brasil.
No jornal Folha de S.Paulo, no blog Orientalíssimo, está outro brasileiro que abraçou a cultura árabe, apesar de não ter laços de sangue com a região. Diogo Bercito escreve sobre temas do Oriente Médio no blog. Além de ter sido correspondente da Folha em Jerusalém, ter morado em Beirute e no Cairo, ele também faz uma dissertação de doutorado sobre a história dos árabes no Brasil. “Eu não tenho origem árabe e é um prazer poder contar um pouco sobre essa história, poder participar um pouco dessa história”, disse em depoimento gravado.
O acadêmico João Baptista Vargens de Medeiros ganhou o Prêmio Unesco-Sharjah de Cultura Árabe, promovido pela Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura e pelo governo de Sharjah, dos Emirados. Mas sua ligação com os árabes começou bem antes, quando ele estudou árabe na Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ufrj) e depois morou na Síria para estudar mais o árabe e no Marrocos para lecionar português e cultura brasileira. Ele contou que os motivos para estudar árabe foram dois: a influência da leitura de contos ambientados nos países árabes e a sua identificação com a causa Palestina.
Quem também contou sua história com os árabes foi Alessandra Frisso, diretora do instituto H2R Pesquisas Avançadas. Casada com um descendente de sírios, ela contou como se sentiu acolhida pela família do marido e pela comunidade árabe do Brasil, e como se sentiu em casa quando foi a países árabes como o Egito e a Tunísia. “Isso mudou muito o jeito como hoje eu entendo a família, o jeito que eu entendo os árabes”, disse. Alessandra se tornou presidente do Comitê de Mulheres da Câmara Árabe, o WAHI – Mulheres que Inspiram, que trabalha pela aproximação de mulheres árabes e brasileiras, principalmente na esfera de negócios.
A gerente de Marketing da Câmara Árabe, Karina Cassapula, deu seu depoimento de apaixonada pela cultura árabe. Sem ascendência na região, Karina contou que essa aproximação se deu quando trabalhou na instituição pela primeira vez em 2008 – ela foi contratada pela Câmara Árabe pela segunda vez em 2019 – e começou a viajar pelos países árabes, para nações como Egito, com sua cultura milenar, e Emirados Árabes Unidos, com toda a sua modernidade. “Quando a gente gosta muito, a gente tem essa paixão, isso transparece”, relatou.
Os depoimentos das pessoas que tiveram suas trajetórias marcadas por árabes, imigrantes ou mesmo pela cultura da região foram moderados pelo secretário-geral da Câmara Árabe, Tamer Mansour, ele mesmo um imigrante egípcio que se mudou para o Brasil ainda na juventude. “Quando pensamos nessa parte do evento, queríamos entender até onde foi a influência dos árabes no Brasil”, disse ele. A ideia foi mostrar que a presença árabe no País vai muito além dos seus imigrantes.
Os árabes pelo Brasil
Mas o evento sobre a imigração árabe também trouxe histórias de quem faz parte dessa comunidade como descendente e tem papel relevante no desenvolvimento do Brasil ou da sua área de atuação. Um depoimento do ex-presidente Michel Temer, filho de libaneses, foi um dos apresentados. Ele descreveu sua trajetória como um exemplo de como o Brasil pode ser acolhedor com os imigrantes. A apresentadora de televisão do Grupo Bandeirantes, Renata Maron, também falou em vídeo gravado sobre seu orgulho de integrar a comunidade e como seu mundo foi ressignificado ao viajar a um país árabe.
A jornalista Marina Sarruf, apresentadora do evento, deu um depoimento. Ela é coordenadora de comunicação da Câmara Árabe, mas foi uma das primeiras repórteres da Agência de Notícias Brasil Árabe (ANBA) e fez coberturas em vários países árabes, inclusive no Iraque. “Tenho muito orgulho de ter trabalhado na ANBA por sete anos”, disse. O médico Alvaro Sarkis, professor de Urologia da Universidade de São Paulo (USP), falou em vídeo sobre as suas origens árabes e citou a contribuição da colônia para a criação de instituições que levam bem-estar aos brasileiros, como o Lar Sírio, voltado a crianças, a Mão Branca, para idosos, e hospitais como o HCor e o Sírio-Libanês.
Dia 25 de Março
O evento foi aberto com a apresentação ao público de uma breve história da imigração árabe ao Brasil e do tamanho da comunidade árabe no Brasil, de 11,6 milhões de pessoas. Uma pesquisa encomendada pela Câmara Árabe e realizada pelo Ibope Inteligência e pela H2R Pesquisas Avançadas chegou a esse número, divulgado pela primeira vez no ano passado. Em um vídeo curto, Márcia Cavallari, CEO do IBOPE Inteligência, explicou como o levantamento foi realizado.
O presidente da Câmara Árabe, Rubens Hannun, explicou que o Dia da Comunidade Árabe no Brasil teve que, pelo segundo ano consecutivo, ser vivido de forma virtual por causa da pandemia. “Estamos cuidando do distanciamento”, falou ele. Mesmo assim, cerca de 3,6 mil pessoas acompanharam o evento. Hannun disse que o webinar era para todos, árabes, descendentes e também para os demais, que convivem com essa comunidade no Brasil.
O especialista em estudos do Oriente Médio, Mundo Árabe e Muçulmano, Salem Nasser, apresentou aos participantes o contexto do Dia da Comunidade Árabe, celebrado em 25 de março, que é também nome de uma rua de comércio na capital paulista que recebeu muitos comerciantes árabes assim que eles se mudaram ao Brasil. Ele contou que antes de os árabes se instalarem, essa já era uma rua que centralizava o comércio na cidade de São Paulo. “Em algum momento os árabes tomaram conta dessa rua”, relatou Nasser. O Dia da Comunidade Árabe foi criado por um projeto do Senador Romeu Tuma.
Solidariedade
No evento, a imigração também foi abordada sob outras temáticas, como a solidariedade que uniu árabes e brasileiros nestes tempos de pandemia de covid-19. A Câmara Árabe, que reuniu a colônia para ajudar hospitais e instituições com equipamentos de proteção durante a pandemia e que também o fez para enviar ajuda humanitária ao Líbano no ano passado, lançou uma nova campanha, dessa vez para angariar cestas básicas e distribuir aos brasileiros que passam por dificuldades. Saiba mais detalhes em outra reportagem.
Memória
Os participantes também foram chamados a colaborar com o Projeto de Digitalização da Memória da Imigração Árabe no Brasil. A iniciativa é levada adiante pela Câmara Árabe em parceria com a Universidade Saint Esprit de Kaslik (Usek), do Líbano, com o objetivo de documentar e digitalizar a história dessa imigração ao Brasil. A coordenadora do projeto, Heloisa Abreu Dib Julien, contou sobre o andamento do trabalho e pediu que as pessoas enviem materiais que tiverem. Para mais informações, entre em contato pelo e-mail projetousek@ccab.org.br.
O evento online sobre o Dia da Comunidade Árabe teve apoio da TV Cultura e do Grupo Bandeirantes de Comunicação, o que foi agradecido pela Câmara Árabe.
Leia mais sobre o evento:
Câmara Árabe lança nova campanha de solidariedade
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