São Paulo – A 36ª Bienal de São Paulo fica em cartaz até janeiro de 2026 com 125 artistas expondo, dos quais 17 árabes. Todos os trabalhos buscam propor ou responder desafios de um tema comum: a humanidade. Dividida em seis capítulos que exploram a terra, a resistência, as migrações, a ruptura com os sistemas tradicionais e a memória, entre outros temas, a Bienal propõe uma viagem em torno do que constrói ou desconstrói a humanidade. A inspiração para a reflexão parte do poema “Da calma e do silêncio”, de Conceição Evaristo.

Os marroquinos Chaibia Talal (1929-2004), Farid Belkhaia (1934-2014) e Mohamed Melehi (1936-2020), que têm obras na exposição, são representantes de um movimento classificado como pós-colonial ou decolonial do país do Norte da África. Sua arte abstrata questionava valores e ideias preconcebidas e influenciadas pela arte dos colonizadores europeus nos países africanos.
Chaibia Talal, em especial, teve seu trabalho questionado pelo fato de ser mulher. Foi casada com um homem mais velho aos 13 anos, teve um filho em seguida e, aos 15, ficou viúva. Passou a pintar aos 25 anos, mas só aos 37 anos suas pinturas ganharam reconhecimento para além do Marrocos, com o apoio de Melehi e Belkhaia, apoiadores do seu trabalho e das suas técnicas. Seus quadros exploram imagens de crianças e mulheres, mas não de uma forma convencional: Talal trafegava, assim como seus contemporâneos das artes também expostos na Bienal, na abstração.
Da mesma época que estes artistas, a também marroquina Malika Azguenay assina alguns trabalhos expostos na Bienal. Um deles, a pintura “Le paradis sous les pas des mères” (“O paraíso nos passos das mães”, em tradução livre do francês) ilustra a rampa de acesso ao primeiro andar do prédio. Ali, a reinterpretação de elementos da natureza, uma marca do seu trabalho, ganha vida em amplas dimensões. Em outro espaço do pavilhão, nove quadros replicam o conceito artístico da sua obra. O mesmo verso “O paraíso nos passos das mães” volta a aparecer, desta vez escrito em árabe.

Outro árabe com obra na Bienal, Hamedine Kane nasceu em Nouakchott, na Mauritânia, e vive entre Paris, na França, Bruxelas, na Bélgica, e Dacar, no Senegal. É a cidade senegalesa uma das inspirações para a “Le Ressources: Acte-#2” (“Recursos: Ato -#2”). Sobre uma espécie de píer foram colocados livros, cordas, pedaços de madeira, uma quantidade de materiais que faz referência a objetos encontrados no mar tanto na costa senegalesa, como na costa brasileira, em dois extremos do Oceano Atlântico Sul. A instalação é resultado de uma investigação que aborda a exploração e a poluição marítima e que teve seu primeiro ato justamente no Senegal. Esta etapa do trabalho foi conduzida em São Paulo e em Salvador, em parceria com seu colaborador Boris Raux.
O Sudão também está na Bienal, com os quadros de Kamala Ibrahim Ishag. Embora “dialoguem”, seus quadros se distribuem por dois espaços separados do pavilhão. O misticismo de rituais africanos, a condição da mulher na sociedade e os espaços comunitários, muitas vezes associados ao feminino, são os temas centrais dos projetos exibidos na Bienal, como a tela “Faces” (“Faces”, na tradução do inglês), em que os rostos de pessoas são distorcidos em uma técnica que lembra o surrealismo.

Na instalação “La valise oublièe” (“A mala esquecida”), o franco-argelino Kader Attia leva o visitante da Bienal a uma sala escura onde estão três malas de viagem preenchidas com cacos de espelho que refletem a luz sobre elas. Cada uma dessas malas conta, para o artista, uma história pessoal. Em um outro ambiente, os espectadores assistem a um vídeo que mostra documentos, fotos de família, memórias que recuperam a guerra da Argélia (1954-1962) em uma mistura de história pessoal e do seu país.
A presença árabe na Bienal de São Paulo se manifesta, ainda, em outras instalações, pinturas e composições: nos têxteis do franco-argelino Hamid Zénati (1944-2022) e de Amina Agueznay e na videoinstalação da palestina Noor Abed, entre outros. A Bienal tem conceito curatorial de Bonaventure Soh Bejeng Ndikung, ao lado dos curadores Anna Roberta Goetz, Thiago de Paula Souza e da marroquina Alya Sebti, além curadora at large (que realiza um trabalho pontual) Keyna Eleison e da consultora de comunicação Henriette Gallus. Outros endereços, além do prédio no Parque Ibirapuera, compõem a programação da Bienal de São Paulo, que tem entrada gratuita.
Mais informações e programação estão disponíveis aqui.
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